O que o Brasil pode esperar
Política

O que o Brasil pode esperar


Promessas para o Brasil

Brasília diz ter captado os seguintes recados
do presidente eleito dos EUA: é hora de superar
o protecionismo com parceria na questão dos
biocombustíveis e reafirmar a liderança
regional do Brasil


Otávio Cabral

Fotos Paul Schutzer/Time Life Pictures/Getty Images e Blake Sell/Reuters

LIÇÕES DA HISTÓRIA
Eisenhower é recebido em festa nas ruas do Rio em 1960, na era JK, e Clinton tenta fazer embaixadas em 1997, no governo FHC: historicamente, a relação entre presidentes do Brasil e dos EUA é cercada de boas intenções e promessas que nunca avançaram

A eleição de Barack Obama foi celebrada no Brasil como prenúncio de mudanças para melhor nas já saudáveis relações políticas e econômicas entre os dois países. O presidente Lula, que nunca escondeu sua simpatia pelo candidato democrata, foi convencido de que a vitória de Obama, ao contrário do que alguns setores do próprio governo acreditam, embute bons prognósticos de benefícios comerciais ao país. A expectativa favorável se consolidou depois de encontros ocorridos ao longo da campanha entre diplomatas brasileiros e assessores de Obama. O candidato democrata disse que, se eleito, teria dois projetos imediatos de interesse direto do Brasil. O primeiro, no campo político, é reaproximar os Estados Unidos de países da América Latina, como Venezuela e Bolívia. O Brasil seria o interlocutor escolhido dos americanos para essa tarefa. O segundo, no campo econômico, é diminuir a dependência de seu país do petróleo, incentivando o uso e a produção do etanol. O Brasil seria o principal parceiro na empreitada e se livraria das barreiras protecionistas americanas.

Como em qualquer eleição no mundo, promessas de campanha nada mais são do que isso, mas o governo brasileiro gostou e, ao que tudo indica, acreditou no que ouviu. Na quarta-feira, logo depois de confirmada a vitória do candidato democrata, o presidente Lula enviou uma carta a Barack Obama parabenizando-o pelo resultado. "Sua vitória representa um momento de superação histórica para os Estados Unidos, que provam mais uma vez a capacidade transformadora de sua democracia e de sua sociedade." Se não houver nenhuma mudança de agenda, Lula será um dos primeiros chefes de estado do mundo a se encontrar com Obama. O presidente brasileiro estará nesta semana em Washington, onde participará de uma reunião convocada para discutir novas formas de controle do sistema financeiro internacional. Seus assessores agendaram uma conversa com Obama, que deve acontecer, a princípio, em um dos intervalos da reunião. Apesar de programada para ser uma conversa rápida, Lula pretende levar a Obama uma antiga reivindicação: a ampliação do Conselho de Segurança da ONU, com uma cadeira de membro permanente para o Brasil. "O Brasil é o principal líder regional e ampliou sua influência para países emergentes como Índia e África do Sul, além dos pobres da África. É natural que queira ter um protagonismo maior em relação aos Estados Unidos e aos organismos internacionais", avalia um diplomata próximo do presidente.

A aproximação do governo brasileiro com Barack Obama se intensificou logo depois da indicação do Partido Democrata. O embaixador do Brasil em Washington, Antonio Patriota, e o ministro de Assuntos Estratégicos, Roberto Mangabeira Unger, receberam a missão de construir pontes com o candidato. Dias depois do fim das primárias, houve um encontro entre diplomatas brasileiros e Barack Obama. Na conversa, que não passou de uma apresentação sobre as principais propostas de um eventual governo democrata, Obama, em tom de brincadeira, passou a mão no braço, mostrando sua pele negra, e disse que era um pouco brasileiro. Durante a campanha, conselheiros de política externa do democrata mantiveram vários contatos com a embaixada brasileira. O ministro Roberto Mangabeira Unger, que foi professor de Obama na Universidade Harvard, encarnou o papel de intermediário entre o governo e o candidato democrata. Unger conhece muitos de seus assessores, entre eles alguns que trabalharam com ele nos Estados Unidos. "O Brasil tem uma grande oportunidade de aumentar sua parceria comercial com os Estados Unidos no governo Obama", avalia Marcílio Marques Moreira, ex-ministro da Fazenda e ex-embaixador do Brasil em Washington. "A ideologia democrata é protecionista. Mas, na prática, isso muda, tanto que o democrata Bill Clinton foi menos protecionista do que o republicano George W. Bush."

Apesar do entusiasmo que a eleição de Barack Obama naturalmente despertou, a história mostra que os presidentes americanos, sejam eles democratas ou republicanos, costumam sempre acenar com boas intenções ao Brasil. Em 1960, o republicano Dwight Eisenhower encontrou-se com Juscelino Kubitschek, prometeu ajuda financeira e avalizou o reatamento do Brasil com o FMI. Nada aconteceu. O democrata Bill Clinton, entre outras promessas, se comprometeu a inserir o Brasil no mundo globalizado por meio de um pacto de cooperação econômica e militar com os Estados Unidos e a Inglaterra. De novo, nada aconteceu. Desta vez, contudo, o Palácio do Planalto e o Itamaraty acham que o cenário é diferente. O Brasil é uma democracia estável com a economia sólida, que, apesar da crise, deve continuar crescendo e atraindo investimentos. Avalia o diplomata Roberto Abdenur, ex-embaixador do Brasil em Washington: "O Brasil não será a prioridade do governo Obama, que terá de cuidar da crise econômica e das duas guerras em que os Estados Unidos estão envolvidos. Mas, com a importância econômica e política que o Brasil tem, será cortejado como parceiro".




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