Governo atira à vontade no próprio pé, oposição não reage; crise na
Casa Civil tira mais força de "liberais"
NOMEAR PARA a Casa Civil um ministro que tenha de explicar a origem
rápida e recentíssima de milhões, faturados numa atividade tão
inefável como a de consultoria, não parece uma ideia politicamente
prudente, para dizer o menos e para se ater apenas ao aspecto
operacional do assunto, "realpolitik", digamos.
Isto feito, nomeado assim esse ministro, é uma ideia de jerico não
prever a eventualidade quase certa de que vazaria pela mídia o
formidável faturamento das consultorias privadas do deputado federal,
coordenador de campanha da futura presidente e seu provável premiê.
Que o governo não se preparou para o vazamento ficou evidente na falta
de explicações rápidas e organizadas (para nem dizer críveis) para a
querela decorrente do "barata avoa" dos documentos da atividade
empresarial do ministro.
Pior ainda, o governo logo de cara meteu os pés pelas mãos e chutou
para o público (deputados, a princípio) uma explicação constrangedora
("ex-ministro econômico vale muito no mercado"). A tal nota já
resultou em pedidos adicionais de desculpas e na decapitação de um
assessor da Casa Civil.
A patacoada explicativa, de resto, chamou a atenção para dinheiros
outros da empresa, até então desconhecidos do público, como observou
ontem Janio de Freitas nesta Folha. A empresa do ministro não apenas
dispunha de R$ 7,5 milhões para gastar em imóveis como tem outras
aplicações.
Isto posto, o governo tendo ideias de jerico e sendo inepto na
administração da crise, apenas uma oposição catatônica, narcoléptica,
zumbi ou com muita culpa no cartório não se daria ao trabalho de pelo
menos cobrar explicações rápidas, organizadas e críveis para o
faturamento expressivo da empresa do deputado federal, coordenador de
campanha da presidente da República e seu premiê. Mas nada.
A oposição não sabe nem em que partido está ou estará, dadas as
notícias e os rumores sobre desmonte, criação e fusão dos partidos que
nominalmente não são governistas. A oposição não sabe o que dizer da
política do governo nem da política que fará para conquistar o
governo, e muito menos que política faria num governo seu. Pior ainda,
a oposição parece nem ao menos ter trocado uns telefonemas para saber
o que dizer de modo organizado sobre uma crise deste governo.
As dissensões ocorrem apenas no interior da gelatina da coalizão
partidária que envolve o Planalto, como se vê nas disputas sobre o
código de leis florestais, que nada têm a ver com partidos. Do lado de
fora da cuia de gelatina governista, a oposição é líquida e escorre
pelo ralo.
Interessante é que o ministro da Casa Civil, Antonio Palocci, é a
maior diferença no governo de Dilma Rousseff. É "oposição" quase
solitária às ideias mais comuns no ministério. Palocci é no governo a
figura mais próxima dos "liberais" no mercado e no tucanato restante.
O ministro diverge largamente da política econômica de Dilma Rousseff
e Guido Mantega.
Acaba-se na situação em que a oposição "de fato" (ou de nome, tucanos
e agregados) não se mexe para fritar um seu "próximo" (Palocci) e,
assim, facilita a vida do governo Dilma. Ao não fazê-lo (ao não fazer
ataque nenhum, em suma), a oposição contribui para a paralisia da
crítica política prática no país.