Em entrevista ao GLOBO, o professor titular de Filosofia e Ética da Unicamp, Roberto Romano classificou o blog da Petrobras de uma ação de "terrorismo de Estado" e acusou o presidente da estatal, José Sergio Gabrielli, de tentar garantir um "passaporte para a impunidade", intimidando a imprensa e o Congresso Nacional. Romano afirmou que os jornalistas não são "maquinetas de reprodução dos interesses conflitantes" da sociedade. Leia abaixo:
Qual sua opinião sobre a polêmica em torno do blog da Petrobras?
ROBERTO ROMANO: Não existe polêmica. O que existe é uma ação da direção da Petrobras no sentido de intimidar a imprensa, jornalistas e tudo o mais.
O senhor vê algum problema na criação do blog para a divulgação de perguntas e respostas dadas aos jornalistas antes da publicação das reportagens?
ROMANO: As empresas públicas e privadas têm um serviço de comunicação para divulgar o que a empresa pensa, faz e o que vai fazer, as suas justificativas. É um direito legítimo. É preciso sempre perguntar por que determinado tipo de veículo foi criado. Quando você tem uma página na internet para divulgar a empresa, tudo bem. Mas, nesse caso específico, o que está ocorrendo é um instrumento de ataque, ao mesmo tempo, à imprensa e ao Poder Legislativo. Vai muito além de uma perspectiva de comunicação pública. Nesse sentido, é absolutamente antiético, ilegal e insuportável que uma empresa mantida pelo dinheiro público utilize um instrumento para pressionar o Poder Legislativo e a imprensa.
A empresa também está divulgando os dados antes que a imprensa publique as reportagens. Em sua opinião, por que a Petrobras está fazendo isso?
ROMANO: Chama-se terrorismo de Estado. Não tem outro nome. Estão usando o poder e o dinheiro que lhes é entregue para se impor ao país. Temos aí a Petrobras operando como um Estado dentro do Estado. Isso é o mais grave no meu entender. É como se o presidente da Petrobras fosse um presidente de um Estado dentro do país e que, portanto, tem o direito de intimidar a opinião pública, os meios de comunicação, o Congresso Nacional, sobretudo o Congresso Nacional, tendo em vista o seu passaporte para a impunidade.
Com segurança das informações a serem publicadas e avisando ao leitor, o jornal pode deixar para ouvir a empresa depois de publicar a reportagem, para que não tenha seu material vazado na internet? O que se pode fazer para garantir o direito autoral da reportagem?
ROMANO: O jornal deve publicar a matéria e deixar que eles façam o serviço deles sem dar ampliação ao blog deles. É uma questão muito simples de preservação do autorrespeito profissional de vocês. Vocês devem procurar ouvi-los, colocar na reportagem aquilo que a consciência de vocês recomenda. E eles que se virem com a campanha suja que estão fazendo. Se os jornalistas entram nessa linha da polêmica, legitimam o lado deles. Não existe paridade entre jornalistas, que têm responsabilidade pública, e uma propaganda intimidatória.
O jornalista tem de publicar todas as informações prestadas pela fonte?
ROMANO: De jeito nenhum. A profissão de jornalista é eminentemente intelectual. Uma das funções do intelectual é criticar os dados, sintetizar os dados e interpretar os dados para o leitor. O jornalista não é obrigado a dar a íntegra de uma entrevista. A função do jornalista não é de xerox, vocês não são porta-vozes mecânicos dos interesses vários que se digladiam na sociedade civil e no Estado. O jornalista dá uma interpretação a mais próxima possível do espírito da coisa. Jornalista não é uma maquineta de reproduzir os interesses conflitantes. E, neste caso, bota interesse conflitante nisso.