Sábado, 19 de Abril de 2013.
Com o velho tormento da inflação a espreita, voltam à cena os suspeitos de sempre. Já se amaldiçoou o chuchu pela elevação dos preços, mas naquele tempo de forte "controle social da mídia", era arriscado contestar esta tese. Hoje é o tomate o culpado, mas pode-se falar mais livremente sobre o fato – comum na agricultura – dos preços de frutos e legumes oscilarem pela sazonalidade ou mera escassez e terem efeito limitado sobre os índices gerais de preço. Podem ser apontadas, assim, outras razões mais fortes de suspeição: frouxo controle dos gastos públicos, rápida expansão do crédito, exacerbação do consumo, pouco investimento e um sistema produtivo pouco competitivo, com baixa produtividade e custos elevados de produção.
Outro fator importante, que afeta produtividade e custos, é a precariedade das infraestruturas em geral. No passado, muitos economistas se referiam aos gargalos nas infraestruturas como fatores estruturais da inflação, em contraposição aos fatores conjunturais de pressão sobre os preços. Pois bem, eis que continuamos às voltas com este problema crônico, agravado pelos baixos níveis de investimento público. Busca-se, assim, a participação privada, por meio de concessões ou parcerias, para investir na modernização e ampliação da oferta de infraestruturas vitais para o crescimento, como as de logística, transporte, energia, comunicações e saneamento.
Olhando para um passado distante, quando a maior parte dos serviços públicos era prestada por concessionárias privadas, um grande obstáculo à continuidade das concessões foi a inflação crônica. O aviltamento das tarifas inviabilizava os investimentos necessários à expansão dos serviços. No modelo de concessão vigente, a remuneração se dava exclusivamente pela tarifa do serviço e os riscos eram da concessionária. Num quadro de desinteresse pela continuidade de grande parte das concessões, a Emenda Constitucional nº 1/69 assegurou a justa remuneração do capital pelas tarifas, impondo o controle dos custos, investimentos e lucros das concessionárias restritos, porém, à remuneração do capital. Tratava-se de conceito de caráter estático e aplicado aos investimentos existentes, não considerando a tarifa como fonte de recursos para a expansão dos serviços e deixando a concessionária de correr riscos.
A esta altura, no entanto, a prestação dos serviços públicos já se tornava uma atividade predominantemente estatal, com a criação de uma miríade de empresas estatais, nos três níveis de governo, o que impôs um longo interregno na tradição das concessões. Uma sucessão de eventos como a crise fiscal, colapso do sistema de garantias, dificuldade de créditos de longo prazo e ameaças de hiperinflação, tornaram crucial a questão de como financiar os investimentos nas infraestruturas. A perda de funcionalidade do Estado e o fim do financiamento inflacionário consolidaram, a partir do Plano Real, as bases sólidas de uma reforma institucional (responsabilidade fiscal, superávit fiscal e metas de inflação), acompanhada de programa de privatizações e concessões de longo prazo.
A Constituição de 1988 deixou de contemplar a justa remuneração do capital e a Lei 8.987/95 optou por fixar a tarifa pelo preço. Assim, o serviço público é concedido por conta e risco da concessionária. O poder concedente deixa de controlar custos, para ter o foco em resultados. A tarifa, portanto é fixada pelo preço do serviço definido na licitação e o licitante, após elaborar seu "Project Finance", oferece a sua proposta, sendo que não há limitação no lucro, mas também não há garantia. Os reajustes são assegurados contratualmente por índices pré-estabelecidos.
Em tempos de ameaça de inflação, no entanto, o ambiente de confiança pode ficar conturbado e afastar potenciais investidores privados, em razão de incertezas e riscos que não são inerentes à própria concessão. Quem garantirá que os reajustes das tarifas permitirão o cumprimento dos compromissos de investimento? Apontar frutos ou legumes como vilões dará mais confiança aos investidores?
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Josef Barat – Economista, consultor de entidades públicas e privadas, é Coordenador do Núcleo de Estudos Urbanos da Associação Comercial de São Paulo.