Política
Rever sistema de metas Celso Ming
O Estado de S.Paulo - 13/09/2010
A última ata do Copom reconheceu que a política monetária ganhou eficiência. Não precisa mais de doses maciças de juros para obter o efeito desejado; pode trabalhar com mais sutileza.
Em dez anos de funcionamento, o sistema de metas é sucesso. Nos últimos cinco anos, por exemplo, a inflação ficou dentro da meta e isso diz muita coisa. O Banco Central está conseguindo ancorar as expectativas dos "fazedores dos preços", o que sugere que o sistema está aí para ficar. Mas precisa de ajustes. Uma coisa era o contra-ataque à inflação de 9% há dez anos; e outra, quando a inflação está abaixo da metade disso. Há problemas a corrigir.
O primeiro deles é o de que trabalha com metas altas demais. Poucos países do mundo admitem uma inflação de até 6,5% ao ano (4,5% de centro de meta mais 2 pontos de estouro). Os bancos centrais dos países avançados calibram sua política para uma inflação de 2%.
No Brasil, a meta está submetida à camisa de força do ano-calendário, período em que podem concentrar-se turbulências. É por isso, também, que admite a zona de escape de dois pontos porcentuais ao ano, tanto para cima como para baixo. No entanto, se o período em que a meta a ser atingida fosse mais esticado, os formadores de preços e agentes de mercado poderiam trabalhar mais a longo prazo, o que aumentaria a previsibilidade do sistema. Dá para imaginar, por exemplo, os bons efeitos que produziria a decisão de que o Banco Central terá quatro anos para ajustar a política monetária de modo a atingir a meta de inflação de 3% em 12 meses.
Outra mudança a introduzir é a própria medida de inflação. O conceito flat de custo de vida já não serve para definir o nível adequado dos juros num regime que começa a pedir pente-fino. No início deste ano, por exemplo, o Banco Central aumentou os juros em consequência da disparada da inflação, que foi produzida por um choque de oferta de alimentos provocado por excesso de chuvas. Não faz sentido aumentar os juros para combater uma alta de preços que nada tem a ver com o volume de dinheiro na economia. Isso significa que o Banco Central deveria trabalhar mais com o conceito de núcleo de inflação (core inflation), medição que ainda precisa melhorar no Brasil.
A terceira alteração tem características de reforma e já tem sido comentada. Por isso, basta mencioná-la. Trata-se da necessidade de rever a remuneração da caderneta de poupança, da Letra Financeira do Tesouro (LFT) e a atuação do BNDES, que tiram força da política monetária e são barreiras à queda dos juros no Brasil.
É preciso rever a composição do Copom. Hoje, com igualdade de votos, dele fazem parte todos os diretores do Banco Central, inclusive os de Administração e de Liquidações, cujas especialidades são o gerenciamento da máquina ou de massas falidas e não a definição do nível adequado de moeda da economia.
Quinto ponto: é necessário melhorar a comunicação. Nessa faixa, o Banco Central opera em três níveis. O primeiro são os canais institucionais: o relatório trimestral de inflação, os comunicados emitidos após a reunião do Copom e as atas do encontro; o segundo nível são entrevistas e reuniões informais; e o terceiro, entrevistas do presidente do Banco Central à imprensa.
Este não parece um mix apropriado, seja porque pode se tornar obsoleto (caso dos relatórios de inflação e das atas), seja porque cria ruídos como os provocados pelas reuniões com o chamado Grupo de Fátima. Em julho, por exemplo, o Copom teve de reduzir a dose dos juros, na contramão do que indicavam os textos oficiais. O presidente do Banco Central argumentou depois que, em entrevistas na TV, havia sinalizado a mudança. Ora, entrevistas na TV não podem ter o peso de um comunicado formal. A ideia aqui é de que todos os membros do Copom manifestem o que pensam, ainda que divirjam da maioria, que essas posições sejam registradas no site do Banco Central e seus votos sejam abertos.
Mas é preciso pontuar: nenhum aperfeiçoamento do sistema de metas funcionará se não forem preservadas a autoridade, a autonomia e a confiança na direção do Banco Central.
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