Política
ROBERTO DAMATTA - Quem foi que disse?
O Globo Achei pungente algumas reações estrangeiras à observação de cunho racista do presidente Lula sobre a causa da crise. Quando se diz que Lula não queria ser racista, mas apenas lembrar que a responsabilidade da convulsão cabia mesmo a uma maioria branca, loura e de olhos azuis, os louros de olhos azuis, que assim assimilaram a observação, revelam como o humano é mesmo arbitrário, contextual e dependente de muita coisa, como diz a nossa vã sabedoria. Mas os panos quentes são sempre colocados em função de quem falou.
Quem foi que disse? Se um professor de sociologia diz numa aula que "os crioulos e os mulatos pernósticos são os causadores do atraso do Brasil", ele toma um processo e pode ser interditado social e politicamente.
Expresso pelas pessoas comuns, o racismo é um crime. Mas se uma alta autoridade do mais alto escalão salienta o aspecto físico como sendo o elemento responsável por nada mais nada menos que a crise que envolve o mundo nada ocorre. Pelo contrário, alguns aceitam a pecha (ou trolha) e, com gosto penitencial, assumem o ônus da produção de uma boa desculpa, dizendo que o presidente-operário não tinha a intenção de ser racista e que, neste caso específico, o racismo (ou que passa por ele) seria justificado.
Não faço nenhum cavalo de batalha.
Afinal, como afirmou o presidente dos Estados Unidos, Lula é o homem.
Ele é o líder mais popular do mundo. Ademais, Lula saiu na foto não só ao lado da rainha da Inglaterra, realizando o sonho de toda a nossa elite política que continua se pensando e repensando como — vejam vocês — nobre, mas do lado esquerdo da soberana, posição apropriada para um Lula que, naquele momento, esquecia sua acusação de direita aos "brancos de olhos azuis" e, orgulhosamente sentado à sinistra ao lado de uma mulher de sangue azul, mudava de posição.
Sei que a ocasião faz o ladrão. Mas sei também que os ladrões fazem ocasiões. Como conciliar princípios com circunstâncias? Como calibrar a visão de longe que revela grandes monumentos e formidáveis iniquidades, como a escravidão e o racismo, com a visão de perto que nos torna mais (ou menos) humanos e nos dissolve num oceano de pequenos gestos sem sentido? A saída pelo humor é a mais tranquila. Na sua ambiguidade, o riso permite abrir (e fechar) com todos os lados.
Voltemos ao quem disse. A declaração de um presidente faz desabar a bolsa de valores.
Uma conversa entre pai e filho desmancha um casório. Um ditador com total apoio do seu povo pode liquidar uma etnia, acusandoa de ser impura ou iníqua, como ocorreu com os ciganos e os judeus na velha e civilizadíssima Alemanha. Na América Ibérica, bispos e padres liquidaram milhões de índios em nome da catequese e do cristianismo. Hoje, eles correm o risco de serem calados por teimarem em permanecer na "Idade da Pedra" e terem muita terra.
Por que os negros, que, muitas vezes, eram maioria, revoltaram-se tão pouco? Perguntou-me, um dia, um intrigado aluno americano, branco como um cigarro, louro como a Marilyn Monroe e com olhos mais azuis do que um céu de primavera. Porque, respondi sem hesitar, tratava-se de uma indiscutível visão de mundo.
Como toda visão de mundo, seu trabalho era o de legitimar-se a si mesma, como dizia o velho Durkheim. Os negros eram inferiores porque eram escravos e eram escravos porque eram inferiores. Isso não era dito somente por pessoas simples e do povo, mas todo mundo: padres, juristas, comerciantes ricos, sábios da mais alta estirpe e aristocratas de sangue azul. Enfim, toda a torcida do Flamengo era favorável ao sistema que estava instituído e produzia efeitos e efetividades. Tinha um lado intelectual e um lado emocional e prático.
Era uma instituição abrangente, totalizada que permeava todas as dimensões da vida e da morte, como diria o grande Mauss. Nesse sistema, a inferioridade do negro era indiscutível.
Aliás, discutir sua possível igualdade era algo novo e revolucionário.
Quem poderia defendê-los em tal sistema e contexto?
Agora, pergunto eu, entre o curioso e o assustado: quem vai defender os branquelas louros de olhos azuis contra o cara, contra o maior líder mundial? Aí deve entrar em cena não o presidente dos Estados Unidos, mas Gordon Brown, primeiro-ministro britânico que cumprindo o mais perfeito papel de leva e traz, tão nosso conhecido, candongou Lula a Obama tornando pública toda uma filosofia de governo: "Quando eu era sindicalista, eu culpava o governo; quando era da oposição, culpava o governo; quando virei governo, culpei a Europa e os EUA." Ou seja, Lula é mesmo o cara. O sujeito que pode falar tudo, fazer tudo, dizer que não sabia e, melhor ainda, culpar os outros. Trata-se do curinga, essa carta básica de um mundo em plena liquidez (como diz Bauman) ou em plena liquidação? Vocês, que são safos, decidam.
ROBERTO DaMATTA é antropólogo
loading...
-
Brancos De Olhos Azuis
a frase do presidente Lula da Silva "a culpa da crise é de gente branca com olhos azuis" é comentada por JMF (1) com um "li e reli: se isto não é uma forma de racismo, o que é?". Cá para mim Lula acertou em cheio nos olhos da colunista judaico-Sionista...
-
A Falta De Informação Danuza Leão
FOLHA DE S. PAULO E claro que Obama não soube do mensalão, das vezes que Lula se esconde e finge que não é com ele, das viagens OK, NINGUÉM É perfeito. Mas por um momento Obama nos pareceu a pessoa mais perfeita do mundo; aquele presidente que...
-
Celso Ming Cara Legal
Para o ex-pau de arara e ex-líder sindical Luiz Inácio Lula da Silva, a reunião de cúpula do Grupo dos 20 (G-20) foi uma consagração. Saiu na foto ao lado da rainha e ouviu do homem mais poderoso do planeta, Barack Obama, coisas como "eu adoro...
-
O Dolo De Lula(giulio Sanmartini)
Para o presidente Lula, que não perde sua oportunidade de aparecer a qualquer custo, essa reunião do G 20 foi um prato cheio. Ele sentou ao lado da rainha Elizabeth II, foi sacaneado por Barack Obama achando que estava sendo paparicado e, quando pode...
-
Reinaldo Azevedo Quem Disse Que Ele NÃo Chegou LÁ?...
A Teoria da Bravata, uma criação genuína do nosso Apedeuta, ganhou o mundo. Vocês se lembram. Poucos meses depois da posse, no primeiro mandato, Lula foi questionado sobre, sejamos genéricos, o fato de dar continuidade ao governo de seu antecessor,...
Política