Na instigante série True Blood, os vampiros
saem do armário – e têm de enfrentar o preconceito
Isabela Boscov
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UM CASO DE MISCIGENAÇÃO Bill, o vampiro, seduz a garçonete Sookie: um relacionamento que enerva a pequena cidade de Bon Temps por transpor barreiras, digamos, raciais |
Um produto desenvolvido pelos japoneses desencadeou uma revolução de costumes: graças ao TruBlood, um sangue sintético que imita quase à perfeição o original humano, os vampiros que assim o desejam podem viver como seres sociais, sem mais se alimentar na jugular de inocentes. Milhares deles, então, saíram do armário – ou do caixão. Junto com eles, emergiu uma subcultura que agora quer ter direito à propriedade, ao voto, ao casamento. E, como seria de esperar, uma onda de resistência se formou também. Grupos religiosos invocam o fogo do inferno contra a abominação de seres que não são mortos nem vivos; e a gente do interior ouve com desconfiança os rumores sobre pessoas depravadas que se entregam ao sexo perigoso com vampiros (as mordidas são imprescindíveis durante a transa), ou sobre as redes para o tráfico de "V" – o sangue dos vampiros, que, em seres humanos, tem o efeito de uma droga ultrapotente. Gente provinciana como, por exemplo, a de Bon Temps, na Louisiana, um desses redutos sulistas em que a valentia dos soldados confederados na Guerra Civil dos anos 1860 ainda é comemorada. Bon Temps, assim, entra em polvorosa com a chegada de seu primeiro vampiro. Não estivesse ele morto há um século e meio, William Compton (Stephen Moyer) seria um herói local, já que lutou pelo Sul durante a Secessão. Mas, quando ele aparece para reclamar a casa da família e se encanta com a garçonete Sookie Stack-house (uma adorável Anna Paquin), "Vampire Bill" logo se torna suspeito de uma série de assassinatos que estão abalando Bon Temps. Esse entrecho ao mesmo tempo fantasioso e crivado de comentário social é o ponto de partida de uma série instigante – True Blood, que estreia neste dia 18, às 22 horas, no canal HBO.
Depois de se dedicar a uma família californiana de agentes funerários em A Sete Palmos, o criador e roteirista Alan Ball passa aqui para o gótico – e o cômico, o romântico, o dramático e o policial: um dos trunfos de True Blood é não se ater a convenções de gênero, fundindo-os todos de maneira quase sempre fluida. Como na série anterior e no roteiro de Beleza Americana, porém, Ball tem um ponto firmemente em vista. Em oposição à imagem de mobilidade social ilimitada da sociedade americana, ele argumenta que as regras para a aceitação são restritas: ter a cor, a orientação sexual, a origem, a profissão ou a crença "errada" joga o indivíduo à margem. Donde todos estão de certa forma à margem, e lutando para se incluir em um círculo ideal que nunca se abrirá de fato. Sookie, que tem o dom incômodo da telepatia, sempre foi considerada diferente – mas, ao se envolver com Bill, percebe que a sua exclusão é muito mais extensa do que imaginava. Os pensamentos que ela ouve (e que às vezes são manifestados alto e bom som) sobre si própria e sobre os vampiros são de um preconceito mesquinho e chocante. Muito mais, ainda, por nada terem de original. São todas aquelas velhas frases que já foram ditas, e não raro continuam a sê-lo, sobre os negros, os judeus, os homossexuais e todos os outros que em algum momento sejam alvo de desfavor. Em True Blood, os vampiros são só mais uma dessas classes – e certamente não a última.
Como são os vampiros de True Blood Durante o dia, dormem em caixões ou enterrados no chão: a luz solar faz com que derretam lenta e dolorosamente. A outra coisa que pode destruí-los é a tradicional estaca no coração. Vale até perna de mesa São alérgicos à prata. Uma simples correntinha do metal é capaz de imobilizá-los. Mas são imunes a crucifixos e água benta. Acham o alho apenas irritante Seu reflexo pode, sim, ser visto em espelhos. Mas só podem entrar na casa de um ser humano se convidados Quanto mais velhos ficam, mais fortes se tornam. E, quanto mais vivem (maneira de dizer, claro) apenas entre si, mais distantes se tornam dos humanos Graças às propriedades de seu sangue, regeneram-se até de ferimentos gravíssimos. Se ingerido por humanos, ele age como uma fortíssima droga lisérgica e afrodisíaca |