Política
Vinicius Torres Freire Polícia para o golpe no Senado
FOLHA DE S. PAULO
Um Poder era manipulado pelo conluio de burocratas com senadores; MP e PF têm de entrar a fundo no caso
ESTÁ CLARO agora que senadores, não se sabe quantos muitos, eram pelo menos cúmplices e beneficiários da malversação dos recursos postos à disposição do Senado. Os benefícios eram pecuniários ou indiretos, na forma de serviços ou de empregos para parentes e clientelas. Eram também benefícios políticos, na forma de sustentação de um esquema de favores e financiamento de agregados, na manutenção do pessoal de "escritórios" políticos ou similares.
Mais importante, eram benefícios políticos num sentido maior e mais grave: um grupo de burocratas que servia de esquadrão de apoio à cúpula dos senadores, àqueles que mandam na casa faz 15 anos. Por meio de favores e, aparentemente, chantagens desse grupo de burocratas, a cúpula do Senado manipulava recursos financeiros e administrativos a fim de manter seu poder na Casa, sobre a bancada parlamentar e, assim, sobre parte da República.Isso é tanto um caso vulgar de polícia, como, difícil de qualificar, um golpe institucional crônico, digamos. Além de privatizar bens públicos para benefício diretamente pessoal, o conluio de senadores de cúpula com a burocracia eternizada no comando administrativo do Senado servia à manipulação institucional.
No caso, manipulação de uma bancada que aprova emendas constitucionais, leis, CPIs, endividamento de entes federativos etc.
Mandantes, cúmplices, omissos ou com telhado de vidro, os senadores por ora pretendem limitar os danos do escândalo. Derrubam apenas, a muito custo, burocratas da bandalha. Não há, talvez nem possa haver, dada a amplitude do escândalo, investigação no sentido de cortar cabeças no Senado. Não há, pois, outro meio de fazer uma limpa na casa que não seja chamar a polícia, medida que conta com o apoio dos senadores Cristovam Buarque (PDT) e Álvaro Dias (PSDB), pelo menos. O Ministério Público, mas também a Polícia Federal, tem de agir de modo muito mais enérgico. Sem investigação independente, os senadores vão privatizar também a Justiça.
O Ministério Público do Distrito Federal instaurou inquérito para investigar a bandalha dos atos secretos do Senado, assunto que será conduzido pela procuradora Anna Carolina Resende Maia, que já investiga o uso irregular de passagens aéreas por parlamentares. O procurador do Ministério Público no TCU, Marinus Marsico, investiga também os atos secretos. A procuradora da República Eliana Pires Rocha investiga as exorbitâncias das despesas médicas do Senado. Mas ainda é pouco, muito pouco.
É preciso instaurar inquéritos para investigar toda a cadeia de comando que criou benefícios tanto para burocratas como para senadores. É preciso investigar a denúncia de chantagem feita pelo senador Arthur Virgílio (PSDB). É preciso investigar ainda a possível compra de votos e lealdades, paga com os favores da direção do Senado. Não se trata de mera malversação episódica de fundos ou de desvios administrativos. Trata-se de um caso de privatização de recursos públicos com o objetivo de manipular ações de um Poder da República. Como observou Janio de Freitas, nesta Folha, trata-se talvez de um caso ainda mais grave que o do mensalão.
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