Política
VINICIUS TORRES FREIRE Síndrome do pânico e do Japão
FOLHA DE SÃO PAULO - 16/03/11
DA CONFUSÃO infernal de ontem nos mercados financeiros pode-se dizer não muito mais que se tratou apenas de uma confusão infernal.
O risco de uma nuvem de pestilência radioativa se espalhar pelo Japão e arredores detonou o pânico habitual em reação a eventos "cisne negro" (raros e imprevisíveis).
Suscitou também as habituais perguntas, falações e especulações sobre o "impacto do desastre japonês" sobre a economia mundial.
Também como de costume, ninguém parece saber nada, ou não parece possível descobrir quem o sabe. Há grande divergência de opiniões entre gente supostamente esperta e entendida em Japão e economia.
Na dúvida, a resposta dos mercados financeiros, os primeiros a atirar, é: venda ativos de maior risco, venda ações (que estão caras), fuja para ativos seguros, especule com o que ficar barato entre a multidão de cadáveres e destroços. E assim foi.
Foram comprados títulos dos Tesouros americano e alemão, francos suíços, venderam-se moedas "especulativas" etc. "Business as usual" em dias de estouro de manada.
O pânico maior aconteceu na Bolsa de Tóquio, onde o índice de ações mais importante caiu quase 18% em dois dias. Pânico também ocorreu no Banco do Japão (o banco central deles), que, em dois dias, despejou na economia o equivalente a US$ 245 bilhões (R$ 408 bilhões). As autoridades econômicas japonesas, assim, começam a anunciar, na prática, que vão bancar a reconstrução com impressão de dinheiro.
Mas a gente viu outras coisas tão óbvias mas instrutivas acontecendo por outras praças do mercado.
O risco de catástrofe nuclear derrubou os preços de petróleo, milho, soja, trigo, canola etc. A gente quase pode ouvir um desses relatos de 30 segundos em TV e rádio nos quais se diz que o "temor de nova recessão global derrubou os preços" disso ou daquilo. Mas ninguém está prevendo recessão alguma no mundo, pelo menos enquanto se escrevia esta coluna. Mesmo para o Japão, os prognósticos vão de queda do PIB de 6% a queda nenhuma.
Ou seja, qualquer coisa.
O que ficou evidente foram bandos de especuladores saindo de fininho e de grossinho de mercados inflados de commodities e de recursos naturais. A procura mundial de comida não vai cair por causa do desastre japonês. A de petróleo, tampouco. Aliás, a confusão ainda é bárbara no Oriente Médio, com a atuação dos sauditas como polícia regional das ditaduras petrolíferas a aumentar o temor de desordem adicional. Ainda há risco sério é de redução da oferta de petróleo.
Os preços caíram porque estavam bem inflados por especulação.
Não se trata de menosprezar o desastre. Difícil é ouvir uma avaliação ampla e serena sobre o assunto, que envolve temas como o papel do Japão como fornecedor de insumos industriais de ponta, o risco de o tumulto tocar num ponto sensível e oculto do mercado financeiro mundial, a resposta da política econômica japonesa daqui em diante etc.
Mais difícil ainda é avaliar o tamanho do estrago radioativo e a resposta dos japoneses ao desastre. Vão se desanimar ou se animar para a reconstrução? A confiança vai fazer grande diferença para o futuro da economia. O que farão de sua insegurança em energia? O petróleo, todo importado, é instável; a nuclear, pode ser risco demais.
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