O crescimento industrial em 2011 foi fraco, marcado pela expansão
pífia da indústria de transformação, apenas 0,2%. Mesmo este
resultado, todavia, não revela a real extensão da questão: seguindo-se
a um crescimento robusto no primeiro trimestre do ano passado, a
produção manufatureira caiu nos três trimestres seguintes, apesar do
desempenho mais favorável no fim de 2011.
Em que pese a ligação entre produção industrial e o Produto Interno
Bruto (PIB) ter perdido força nos últimos anos, tal resultado parece
ter reforçado a noção que o Banco Central (BC) teria "acertado o
cenário" ao apostar suas fichas na crise internacional, que teria
efeito de natureza semelhante, embora em escala menor, ao da crise de
2008-09. A redução da produção teria resultado da fraqueza da demanda
externa, afetando mais a indústria, por ser este um setor mais exposto
ao comércio internacional, em particular exportações.
No entanto, uma investigação mais detalhada revela que os dados não
apoiam a conclusão acima. A começar porque, ao contrário do observado
em 2008-09, a queda da produção não aparenta ter resultado
primordialmente do desempenho das exportações industriais. Àquela
época os segmentos industriais com maior exposição ao mercado externo
lideraram a redução da produção, fenômeno que não encontra paralelo na
situação atual, uma indicação que a natureza da estagnação é distinta
da observada no passado.
Projeções do BC já indicam que queda da inflação pode acabar,
provavelmente, no terceiro trimestre
Ainda que esta observação já indique uma diferença potencialmente
relevante entre o desempenho industrial corrente e passado, com
consequências que exploraremos à frente, é necessário dar um passo
adiante na análise do problema, o que requer um pouco mais de
estrutura, a saber, um modelo que permita decompor os impactos sobre a
produção local advindos da demanda doméstica, aqui aproximada pelo
comportamento das vendas varejistas, e da demanda externa, medida
pelas quantidades exportadas de produtos industrializados.
O gráfico mostra os resultados de nossa estimação (omitindo, para fins
de clareza de exposição, outras variáveis utilizadas no modelo)
revelando que, em contraste com o que se observou durante a fase mais
aguda da crise internacional, não foi a fraqueza das exportações de
industrializados que trouxe o crescimento manufatureiro para baixo,
mas sim, principalmente, a demanda interna (no caso, as vendas
varejistas).
Isto dito, resta ainda saber o que restringiu o crescimento das vendas
no varejo e, mais importante, suas implicações. A evidência disponível
aponta para a elevação das taxas de juros em conjunto com as medidas
de restrição ao crédito como os suspeitos mais prováveis. De fato, a
desaceleração mais intensa ocorreu nos setores mais sensíveis à taxa
de juros e às condições de crédito, em particular no segmento
automotivo, uma indicação forte da característica do processo.
Todavia, se isto é verdade (e eu creio que é), quais seriam as
decorrências de tal fato?
Considerando que os juros caíram para suas mínimas históricas e que as
restrições ao crédito foram afrouxadas no fim de 2011, conclui-se que
a demanda doméstica deverá, provavelmente já ao fim deste trimestre,
começar a crescer de forma mais vigorosa, fenômeno que deve se
fortalecer a partir do segundo trimestre deste ano, a valerem as
defasagens habituais entre alterações da política monetária e a
resposta da demanda (cerca de dois trimestres).
Como os efeitos contrários dos ventos internacionais são mais fracos
do que presumido pelo BC, a aceleração da demanda doméstica deve se
traduzir, a exemplo de 2009, em expansão mais vigorosa da indústria.
Porém, em contraste com o ocorrido àquela época, a economia brasileira
não dispõe da mesma folga de recursos para expandir a produção sem
incorrer em pressões inflacionárias.
Não é demais lembrar que a indústria em 2009 partiu de uma situação em
que o nível de utilização de capacidade instalada caíra abaixo de 79%,
contra um pico de quase 84% no terceiro trimestre de 2008, correndo
hoje pouco acima de 81%. Já o desemprego subira para algo mais de 8%
em seguida à crise, uma elevação da ordem de 1 ponto percentual. Agora
observamos o desemprego (na série livre de influências sazonais) na
casa de 5,5%, o mais baixo desde que a série se iniciou em 2002.
Não por acaso, portanto, as próprias projeções do BC já indicam que a
queda da inflação medida em 12 meses tem data marcada para acabar,
provavelmente no terceiro trimestre de 2012. A partir daí a inflação
deve retomar a trajetória ascendente, sem convergência à meta,
colocando em xeque a estratégia atual de política monetária.