O GLOBO
PANORAMA ECONÔMICO
O ministro Guido Mantega estava ontem numa situação curiosa: criticado aqui no mercado pelo IOF do capital estrangeiro e elogiado pelo “Financial Times” pelo mesmo motivo. “O IOF não é para impedir a entrada de capital na bolsa, mas evitar uma bolha; não é para barrar entrada de capital, mas evitar exageros, não desestimula investimento de longo prazo”, me disse Mantega
Mas o imposto de 2% sobre operações financeiras na entrada de capital para bolsas e aplicações em títulos públicos divide até o próprio governo.
O ministro do Desenvolvimento, Miguel Jorge, criticou a medida em entrevista ao “Estadão”.
— Estranhei muito a declaração do ministro porque ele participou comigo de uma reunião na véspera com empresários de todos os setores.
A decisão foi elogiada por todos e ele não disse nada — afirmou Mantega.
Há vários tipos de críticas à medida. Uma é que é inócua, não vai impedir a queda do real, outra é que ela provocaria distorções como por exemplo desviar recursos que viriam para aplicação na Bovespa para as ADRs de empresas brasileiras em Nova York. Mantega disse que ontem mesmo iria se reunir com Edemir Pinto, da BM&F Bovespa, para avaliar se há necessidade de alguma correção, mas avisou que nem pensa em voltar atrás: — Uma decisão como essa não pode ser conversada antes, a não ser entre a Fazenda, Receita, Banco Central. Depois, podem ser feitos ajustes, mas o IOF vai continuar.
Sobre o risco de desvio de recursos daqui para bolsas no exterior, ele também não acredita: — Nem todas as ações brasileiras têm ADRs, os IPOs (lançamentos de ações) não devem ser afetados. A tributação afeta quem tinha interesse de aplicação de curto prazo, mas no longo prazo um custo como esse se dilui.
Mas a questão é que a medida não segurou a queda do dólar, ele caiu num dia, para subir no dia seguinte. O aumento do IOF seria inócuo para evitar a valorização da moeda brasileira porque na verdade é um movimento global de apreciação de moedas principalmente de países exportadores de commodities.
Mantega disse que a tributação não foi feita para evitar a entrada de capital: — Queremos evitar os excessos, atenuar os exageros.
Não queremos que se crie uma bolha na Bolsa brasileira.
O IOF não vai impedir a valorização, tanto que a bolsa voltou a subir, mas acho que países-alvo, como Brasil, Austrália, outros produtores de commodities, precisam tomar decisões para atenuar o excesso de atratividade de seus mercados. Existe neste momento excesso de liquidez mundial e falta de ativos atrativos.
O Brasil depois da crise ficou ainda mais atrativo.
O jornal “Financial Times” elogiou a medida e disse que o governo brasileiro foi sábio ao tentar evitar uma bolha especulativa “antes que seja tarde demais.” O jornal mostrou que está entrando muito mais dinheiro para a bolsa do que para investimentos diretos e disse que esse é um ingrediente clássico para a formação de bolhas. O “FT” também defendeu a taxação do capital na entrada, e não na saída, e afirmou que o status do país como futura potência exportadora de petróleo só tende a agravar o problema.
Mantega explicou que o IOF não foi feito para aumentar a arrecadação, não é um controle do câmbio, e nem mesmo abandono do regime de câmbio flutuante: — É uma medida regulatória e não tem o objetivo de arrecadação. Em outros momentos, como no ano passado, foi colocado e tirado.
Não vai impedir a valorização do real e ninguém está pensando em abandonar o câmbio flutuante. Esse é apenas um pequeno obstáculo ao ingresso para evitar bolhas e excessos. Há um desequilíbrio cambial no mundo, por isso, acho que outros países vão pensar em maneiras para evitar distorções em seus mercados.
Ele tinha falado no dia anterior que o governo está pensando em outras medidas, e eu quis saber quais seriam. Mantega disse que estão sendo estudadas formas para reduzir o custo financeiro do setor exportador, ou para aumentar a competitividade.
Propostas inclusive que vêm sendo sugeridas no grupo de setores empresariais que se reúne com o governo e que se chamava Grupo de Acompanhamento da Crise, e que agora trocou de nome.
Mesmo assim, o debate vai continuar. O IOF criado pelo governo provoca dois tipos de críticas: o de ser inócuo e não atingir o objetivo que o exportador quer, que é deter a queda do dólar; e o de ser nocivo por derrubar a Bolsa.
Mantega estava ontem diante de outra situação curiosa.
O procurador-geral da Fazenda Nacional, Luis Inácio Lucena Adams, foi indicado advogado-geral da União: — Perco um excelente procurador e ganho um advogadogeral. Como 70% das questões que chegam à AGU são tributárias e fazendárias acho que só temos a ganhar.
Adams foi, junto com sua equipe, responsável pela maior vitória da Fazenda este ano e maior derrota dos exportadores.
A PGFN defendeu que o governo nada devia aos exportadores de crédito-prêmio de IPI. Era uma conta que podia superar R$ 200 bilhões se o governo tivesse que pagar os atrasados desde 1990 de uma isenção de imposto que a Constituição havia derrubado.
Apesar da divisão da base aliada e dos sinais ambíguos de algumas alas do governo, a PGFN foi firme na defesa da questão e o Supremo decidiu que o benefício ao exportador se extinguiu mesmo em 1990.
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COM ALVARO GRIBEL