Com toda razão, a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária
(Embrapa) segue sendo festejada por sua participação decisiva no
grande salto do agronegócio no Brasil. Mas, nesse ramo, não basta
competir. E ficar parado é condenar-se à insignificância.
Há cinco anos, sementes com tecnologia da Embrapa respondiam por 50%
da produção de soja do Brasil; hoje, não passam de 10% - estima a
consultoria Céleres. Esse encolhimento não se deve apenas à
insuficiência de recursos para pesquisa, mas também a graves equívocos
estratégicos do passado.
Durante bom tempo, contaminada por preconceitos ideológicos, a
administração da Embrapa se recusou a avançar no desenvolvimento de
técnicas de modificação genética. Temia pela produção de aberrações
vegetais e de prejuízos para a saúde e para o meio ambiente. Bastou
isso para que a pesquisa nacional do setor se ananicasse. Abriu-se
espaço enorme, hoje dificilmente recuperável, para sementes
transgênicas de grandes multinacionais, como Monsanto, Syngenta e
Bayer CropScience.
A regulamentação para liberação das culturas transgênicas no Brasil
ocorreu em 2005. Desde então, a CTNbio, organismo encarregado de
aprovar sementes geneticamente modificadas no País, liberou 32
variedades, duas produzidas pela Embrapa. Nenhuma delas está no
mercado.
O encolhimento do orçamento é em grande parte consequência desse
desvio original corrigido tarde demais. Empresas privadas destinam US$
2 bilhões por ano para pesquisas em biotecnologia, a Embrapa conta só
com US$ 200 milhões.
Ou seja, a empresa sobrevive estrangulada por insuficiência de
recursos. Uma saída seria abrir seu capital, para que reforçasse seu
patrimônio sem perder sua condição de empresa pública. Desde 2008, o
senador Delcídio Amaral (PT-MS) tenta aprovar no Congresso o aumento
do seu capital nos moldes de Petrobrás e Banco do Brasil, ambas
empresas de economia mista e ações negociadas em bolsa. Mas essa
resposta enfrenta nova fonte de preconceitos: é percebida por certos
meios como privatização disfarçada -- como se a privatização fosse o
diabo. Seu presidente, Pedro Arraes, por exemplo, deixou clara há
alguns dias sua posição ao Valor Econômico. Quer uma Embrapa
puro-sangue, com 100% de capital estatal, e o Legislativo fora dessa
discussão.
Se for para esse lado, a Embrapa corre o risco de deixar de ser
empresa de ponta e se recolherá a pequenos nichos. Há quem pondere,
como Flávio Finardi, presidente da CTNBio, que o foco principal da
Embrapa não é lucrar, mas fornecer ao pequeno produtor meios de
trabalhar com baixos custos. Mas o próprio Finardi não vê objeção para
esse processo ser financiado com capitais obtidos no mercado: "Não
teria nada de privatização nisso".
No entanto, fica nítida a necessidade de se rever o papel da Embrapa.
Ou muda ou será rebaixada para a terceira divisão. O sócio-diretor da
consultoria Céleres, Anderson Galvão, adverte: "Existe uma crise de
identidade a ser resolvida, a Embrapa perdeu o bonde".