Todos os dias autoridades políticas e econômicas do mundo advertem que
a geografia econômica global passa por radical processo de metamorfose
e que os emergentes de hoje estarão entre as potências hegemônicas
dentro de mais alguns anos.
O fenômeno subjacente é a enorme redivisão do trabalho no mundo.
Bilhões de pessoas, antes marginalizadas do mercado de consumo, obtêm
emprego e renda, à proporção de mais de 40 milhões por ano, apenas na
Ásia.
Mas esse não é fenômeno circunscrito só ao continente asiático, depois
que a China e os tigres que a cercam (Índia, Coreia do Sul, Vietnã,
Indonésia, Taiwan, etc.) assumiram a corrida para o desenvolvimento
econômico. O governo brasileiro se vangloria de que, em pouco mais de
dez anos, nada menos que 30 milhões de brasileiros ascenderam de
estrato social.
Definir o que é classe média é tarefa tão complicada quanto definir
nível de pobreza. Mas, do mero ponto de vista do mercado de consumo,
entende-se que fazem parte das camadas médias pessoas que gastam entre
US$ 10 e US$ 100 por dia.
Sob esse critério, o Instituto Brookings, de Washington, avalia que
nada menos que 2 bilhões de pessoas (29% da população mundial)
constituem hoje as classes médias. E a Organização para Cooperação e
Desenvolvimento Econômico (OCDE) prevê que, por volta de 2030, as
camadas da classe média atingirão 4,9 bilhões ou entre 65% e 80% da
população global. A maior parte dessa gente viverá em países hoje
considerados emergentes.
Já não dá para dizer, como ainda se repetia nos anos 90, que o atual
sistema econômico e político global seja excludente. Ao contrário,
para o bem e para o mal, mostra-se essencialmente includente.
Pessoas mais bem nutridas, com mais saúde, mais informadas e
politicamente mais integradas constituem grande avanço histórico que,
no entanto, cobrará seu preço. O primeiro deles é a transferência dos
empregos dos países ricos para os emergentes. Independentemente dessa
realocação, é preciso perguntar se haverá, onde quer que seja, postos
de trabalho para tanta gente.
Em segundo lugar, é necessário prever o impacto do brutal aumento de
consumo mundial sobre suprimentos de alimentos, água doce,
matérias-primas e energia. A referência para essa população são os
atuais padrões de consumo das classes médias americanas, cujo símbolo
é a existência de um carro em cada garagem. São crescentes as dúvidas
sobre se o Planeta aguenta essa sobrecarga.
As classes médias não vivem somente da mão para a boca. Demandam cada
vez mais serviços públicos de qualidade: educação, saúde, segurança,
previdência, comunicações e transporte. E, com esses serviços, aumenta
também a demanda por proteção social, como seguro-desemprego e
auxílio-doença. A carga tributária, assim, crescerá em todo o mundo.
Do ponto de vista político, o fortalecimento das classes médias tende
a favorecer a consolidação dos regimes democráticos – mas desde que
suas aspirações não sejam frustradas. A História está farta de
exemplos de como as classes médias descontentes podem também ser
manipuladas por ditadores e regimes populistas. E esse é o maior
risco. Se os Estados não derem conta da nova demanda, os regimes
políticos abertos podem dançar.
Enfim, a geografia humana está mudando e essas mudanças impõem
desafios às gerações que estão vindo aí.
CONFIRA
O gráfico mostra a evolução, em 12 meses, do IGP-M – um dos principais
critérios de reajuste dos aluguéis e dos contratos financeiros.
Vai pra ata ou não vai? Agora é a própria presidente recém-empossada
da Petrobrás, Graça Foster, que defende o reajuste imediato dos preços
dos combustíveis. O Banco Central vem repetindo nas atas do Copom e
nos relatórios trimestrais que, para efeito de avaliar o comportamento
da inflação futura, conta com reajuste zero da gasolina, do óleo
diesel e do gás de botijão. E, agora, dá para repetir essa aposta?