Celso Ming A tesoura do governo
Política

Celso Ming A tesoura do governo


O governo Dilma afinal divulgou como e onde vai passar a tesoura de R$
50,1 bilhões nas despesas do Orçamento da União. Já é uma situação bem
melhor do que a anterior, que não desceu a esse varejo. A ligeira
redução dos juros futuros verificada nesta segunda-feira mostrou que o
mercado está disposto a acreditar.

Apesar disso, depois de tudo o que aconteceu no ano passado, a maior
explicitação dos cortes não elimina as dúvidas. O ministro da Fazenda,
Guido Mantega, iniciou, ao lado da ministra do Planejamento, Miriam
Belchior, a explicação do que seria feito, com uma lista de
reconhecimentos a que anteriormente não se dera ao trabalho.

Reconheceu, por exemplo, que em 2010 "houve uma aceleração excessiva
da economia". Não chegou a dizer que isso se deveu às despesas também
excessivas das contas públicas, mas nem foi preciso, porque ele ali
estava para apontar os cortes que agora julga necessários.

Declarou também que esses cortes estão sendo feitos para trazer o
crescimento econômico "a níveis sustentáveis", com o que fica
reconhecido que não estavam, embora há meses Mantega repetisse o
contrário. "A trajetória fiscal agora está correta", continuou ele, e
esse é outro reconhecimento de que o rumo anterior não estava correto.

Finalmente, Mantega anunciou "a volta ao superávit primário cheio" e
esse é o recibo oficial de que a obtenção do superávit primário
(parcela da arrecadação destinada ao pagamento da dívida) à custa de
mandracarias contábeis, como as de 2010, trouxe problemas.

No entanto, os cortes anunciados ainda estão permeados de incertezas.
A primeira delas é o nível do crescimento econômico projetado para
2011. O governo já não trabalha mais com um avanço do PIB de 5,5%, mas
de 5,0%. E essa é a principal razão pela qual foi preciso rever para
baixo as receitas do setor público. Mas terá sido isso suficiente?

O Banco Central, por exemplo, trabalha com um crescimento econômico de
4,5% e, com base nele, fez os cálculos de preços, evolução da inflação
e juros. Enquanto isso, o mercado, tal como aferido pela Pesquisa
Focus, passou a projetar um crescimento do PIB em 2011 ainda mais
baixo, de 4,3%. E um PIB mais magro exigirá novos cortes. A ministra
Miriam lembrou a esta Coluna que estão previstas revisões de
programação orçamentária a cada dois meses, a primeira delas deve
ocorrer em 20 de março.

Outro ponto de incertezas é a atuação do BNDES. Informações anteriores
dão conta de que o banco receberá entre R$ 30 bilhões e R$ 50 bilhões
do Tesouro. Não está claro se essa quantia corresponderá a aumento da
dívida pública ou a recursos orçamentários. Apenas na semana que vem
será divulgado o detalhamento dessa operação. Mas a ministra avisa que
o BNDES cobrará juros mais altos.

A Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) não especifica a porcentagem
do PIB que definirá o tamanho do superávit primário. Diz apenas que
será de R$ 81,8 bilhões. O problema é que, diante das projeções
diferentes do PIB, fica difícil conferir o que será o "superávit
cheio" garantido por Mantega.

A sociedade civil ainda não tem razões para acreditar inteiramente na
disposição do governo de levar a sério a volta à austeridade fiscal.
Mas, também como reconheceu a ministra Miriam Belchior, nesse campo
não adiantam muito os argumentos. É preciso mostrar ação.

CONFIRA

As cotações das commodities continuam cavalgando, como mostra a curva
do Índice CRB (veja gráfico acima), um dos mais respeitados.

Cortes de fraudes. Se o governo garantiu que em 2011 conseguirá cortar
R$ 3 bilhões em fraudes no seguro-desemprego, que tinha um orçamento
de apenas R$ 30 bilhões (que agora cairá para R$ 27,1 bilhões), por
que não consegue cortar bem mais do que os R$ 2 bilhões nos benefícios
da Previdência Social, cujo orçamento já revisado é de R$ 276 bilhões?
Não há mais fraudes na Previdência?




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