A diretoria da Petrobrás, a maior empresa do Brasil e a mais importante das companhias controladas pelo governo, deve à opinião pública uma explicação clara e detalhada sobre suas dificuldades de caixa e sobre os motivos que a levaram a tomar um empréstimo de R$ 2,02 bilhões da Caixa Econômica Federal. O empréstimo é pequeno, em comparação com o lucro líquido contabilizado no terceiro trimestre, R$ 10,85 bilhões, e com o ganho acumulado até setembro, R$ 26,56 bilhões. Mas também esse contraste justifica a surpresa demonstrada não só por políticos da oposição, mas também por analistas do mercado financeiro e do setor de energia. Por que uma empresa com resultados tão bons, com reputação de competência tecnológica e planos tão ambiciosos de crescimento precisa recorrer, de um momento para outro, a uma instituição especializada em crédito imobiliário e em financiamentos de obras de interesse social, como projetos de saneamento e de transporte?
O espanto foi justificado, também, pelo fato de a Petrobrás ser uma empresa com ações cotadas no exterior e com acesso fácil, pelo menos até agora, ao mercado financeiro internacional. Em condições normais, não precisaria, portanto, concorrer com empresas nacionais - e, mais que isso, com empresas muito menores - na busca de empréstimos concedidos no mercado interno, especialmente de recursos destinados ao capital de giro, hoje muito escasso e muito caro para a maior parte das companhias.
Antes de recorrer à Caixa, no entanto, a Petrobrás já havia atingido, com um financiamento de R$ 751 milhões, seu limite de crédito no Banco do Brasil (BB). Esse fato não havia chamado a atenção. Só ganhou publicidade mais tarde, quando o empréstimo de R$ 2,02 bilhões já estava acertado.
O Conselho Monetário Nacional (CMN) interveio duas vezes para facilitar a movimentação da Petrobrás no mercado financeiro interno. Na primeira, em 30 de outubro, autorizou a estatal a obter créditos ou garantias no valor de até R$ 8 bilhões. Na segunda, excluiu a empresa dos limites impostos ao setor financeiro público para empréstimos a empresas estatais.
Tanto da Petrobrás quanto do governo partiram explicações consideradas pouco satisfatórias por analistas do mercado. Segundo o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, a empresa teve de recolher grande volume de impostos e teve dificuldades momentâneas de capital de giro. Por isso precisou buscar financiamento. Foi, resumidamente, a explicação oferecida também pela estatal.
A ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, negou a existência de qualquer problema sério. A Petrobrás, segundo ela, agiu como qualquer outra empresa em busca de capital de giro para pagar impostos. Escolheu a Caixa como poderia ter escolhido qualquer banco, acrescentou. Todo banco, segundo ela, sonha em emprestar dinheiro à estatal. Pode ser, mas a Petrobrás acabou recorrendo a duas instituições controladas pelo Tesouro Nacional e, além disso, o CMN precisou mudar regras para permitir a movimentação da empresa no mercado bancário nacional.
Há fatos estranhos em número mais que suficiente para justificar a cobrança de explicações. A piora das condições no mercado internacional de capitais não é novidade e várias empresas brasileiras se voltaram para o mercado interno em busca de financiamento. Essa explicação faria sentido. Menos evidente é a alegação de que a empresa tenha sido surpreendida pelo pagamento de royalties. A valorização do dólar, que elevou o débito em reais, torna o assunto um pouco menos misterioso, mas não elimina dúvidas sobre a gestão de caixa da empresa.
Além do mais, o último balanço financeiro da empresa mostrou uma grande elevação de custos. Com o preço do petróleo em torno de US$ 50 por barril - cerca de um terço do que era há poucos meses - e a economia global em marcha lenta, o peso relativo desses custos muda consideravelmente. Depois, faltou esclarecer a destinação efetiva de grandes volumes de dinheiro, como despesas não especificadas, por exemplo, que passaram de R$ 956 milhões no segundo trimestre para R$ 2,38 bilhões no terceiro. Quanto mais pronto o esclarecimento dessa e de outras questões, menor o risco de uma indesejável e danosa exploração política das dificuldades, quase certamente passageiras, da Petrobrás.
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