Argentina Cristina Kirchner propõe um novo confisco
Política

Argentina Cristina Kirchner propõe um novo confisco


O "senyekismo" de Cristina

A Argentina, o "país onde nunca tantos fizeram
tão pouco com tanto", inventou o keynesianismo
ao contrário: lá é o mercado que salva o governo


Diogo Schelp

Marcos Brindicci
DE OLHO NO BOLSO ALHEIO
Cristina Kirchner: o novo manotazo do peronismo em direção para o abismo

Produto de uma era de hipocrisia moral e desonestidade intelectual, o economista inglês John Maynard Keynes (1883-1946) foi homossexual enrustido em uma sociedade conservadora sem a proteção da correção política, inexistente em seu tempo. Mesmo com o holocausto de Adolf Hitler, Keynes ainda achava a "eugenia a mais importante, significativa e a única genuí-na contribuição da sociologia". Nem é preciso dizer quanto o pobrezinho apanhou em vida e depois da morte. No entanto, ele nunca foi tão abusado quanto no atual momento da crise financeira mundial, em que os estados se lançam em operações de salvamento de bancos, instituições hipotecárias e até de empresas à beira da falência. Proponente da intervenção pontual do estado na economia nos momentos de crise para garantir o emprego dos trabalhadores, ele tem sido vendido aos incautos como o campeão da estatização e da presença permanente da burocracia nos processos de criação de riqueza dos países. Ninguém abusou tanto dele recentemente, porém, quanto Cristina Kirchner, presidente da Argentina. Em Buenos Aires, Keynes foi virado do avesso. Ele era defensor da tese de que o estado deve intervir e salvar o mercado em momentos difíceis. Na Argentina o que se viu foi a presidente obrigar o mercado a salvar o governo.

A presidente Kirchner anunciou na semana passada um projeto de lei que visa a transferir para o governo todo o caixa do sistema privado de aposentadorias, criado em 1994, no governo de Carlos Menem. O sistema argentino permite aos contribuintes optar entre fazer suas contribuições a instituições privadas e confiar na administração estatal. Quase 10 milhões de argentinos aderiram a ele nos últimos quinze anos. Se aprovada pelo Congresso, a medida proposta pela senhora K vai permitir ao governo usar as economias que essas pessoas fizeram para garantir um futuro tranqüilo em um país instável. Na prática, os trabalhadores vão perder, entre outras vantagens, a possibilidade de acompanhar o rendimento de suas aplicações e o direito de se aposentar antes de completar trinta anos de contribuição. Os maiores prejudicados serão aqueles que planejavam receber uma aposentadoria superior ao teto pago pela previdência pública – um dos atrativos do sistema privado alternativo. "Nos fundos de pensão privados, o trabalhador é dono do dinheiro aplicado ao longo dos anos e do seu rendimento", diz Mariano Lamothe, economista da consultoria abeceb.com, em Buenos Aires. "O direito de propriedade desaparece se a conta for absorvida pelo sistema público de previdência."

A justificativa da presidente é proteger o dinheiro dos argentinos da crise financeira, já que boa parte do patrimônio dos fundos privados de previdência está em ações, e a bolsa argentina já perdeu 55% de seu valor desde o início do ano. Mas até o mais desinformado argentino sabe que a manobra foi feita para obter recursos para tapar um rombo de 10 bilhões de dólares nos cofres do estado. É esse o valor a ser pago em 2009 para a rolagem da dívida pública. Sem o "senyekismo", o keynesianismo ao contrário, a presidente teria de abortar sua conduta de clientelismo político em pleno ano eleitoral. A manobra dela ganhou o apelido de cristinazo – uma variação do famigerado manotazo, o confisco estatal, instituição nacional que fez a Argentina ser conhecida, numa corruptela da famosa expressão de Winston Churchill sobre os heróicos pilotos da RAF na II Guerra Mundial, como o "país onde nunca tantos fizeram tão pouco com tanto".




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