Política
As bolsas no novo cenário da economia PAULO GUEDES
REVISTA ÉPOCA
Mais inflação e menos crescimento em todo o mundo: essa dura realidade, que havíamos repetidamente antecipado nesta coluna, está agora registrada nos indicadores nacionais de produção e preços. E, também como alertamos, os choques de custos transmitidos ao longo da cadeia produtiva vieram de fortes elevações dos preços de energia, alimentos e matérias-primas e depois foram repassados aos preços finais de serviços e bens de consumo.
Advertimos seguidamente para esse fenômeno do "cost-push", pressões de custos que comprimem as margens de lucro, empurram para cima os preços e derrubam as vendas. As bolsas levaram bom tempo para reagir a esse cenário. Os mercados acionários haviam não apenas interpretado a alta das taxas de inflação como transitória, mas também considerado temporária a desaceleração do crescimento. Após várias arremetidas na tentativa de atingir patamares mais elevados, houve finalmente a capitulação dos preços das ações quando se espalham os registros de compressão das margens e queda do ritmo de vendas.
As economias emergentes já ensaiavam políticas de contenção, e suas bolsas apresentavam pior desempenho do que a própria bolsa americana, epicentro da última e mais formidável crise da história econômica contemporânea. Os preços das ações finalmente cederam, com o rebaixamento das expectativas de crescimento da economia americana, a compressão dos lucros e o fim iminente da política de injeção de dinheiro na economia.
Há o receio de que a economia dos Estados Unidos desabe num segundo mergulho recessivo, arrastando consigo as bolsas. As taxas de juros de longo prazo também afundaram por semanas a fio, confirmando tal receio. Quando a taxa de juros de cinco anos cai para 1,5% ao ano, e a de dez anos vem a quase 2,5% ao ano, apesar do gigantesco deficit público, os sinais emitidos são que os americanos podem atolar na mesma armadilha em que caíram os japoneses e até hoje não escaparam. É verdade que essas taxas de juros foram artificialmente reduzidas pela ação de afrouxamento monetário do banco central americano, o Fed. Mas a interrupção anunciada dessa política já deveria ter provocado nos mercados uma antecipação de seus efeitos, atenuando a distorção. No entanto, o colapso das expectativas de crescimento econômico parece ter soterrado até o momento qualquer reação de alta esboçada pelos juros.
O movimento de alta parece ter acabado, mas o ritmo de investimento pode se manter – por enquanto
As bolsas brasileiras já mostravam desempenho sofrível nos últimos meses. Apesar do descaso de alguns analistas quanto à eficácia das medidas "macroprudenciais" do governo, o fato é que se verifica uma inequívoca desaceleração da oferta de crédito. Embora seja lento o ritmo de elevação das taxas de juros pelo Banco Central, a redução do ritmo de expansão do crédito é uma dentada na ampliação da demanda para conter a inflação ascendente.
Essa mordida na demanda é importante para bloquear o repasse integral das pressões de custos e também moderar os dissídios salariais em temporada de reajuste. As regras de indexação para preços administrados e para o salário mínimo são problemas já contratados à frente, tornando cada vez menos realista a expectativa do Banco Central de atingir o centro da meta inflacionária de 4,5% em 2012.
Mesmo antes da capitulação dos preços das ações nas bolsas americanas, especulações sobre a saúde da presidente Dilma Rousseff e a crise política que derrubou Antonio Palocci já causavam estragos por aqui. A tendência de alta das ações desde o fundo do poço em 2008-2009 parece interrompida. A nova configuração mais provável é a que os especialistas denominam "trading range", ou seja, uma ampla faixa de flutuação em vez do embalo altista que exibiram as bolsas até 2010. A boa notícia para a economia real é que o ritmo de investimento pode prosseguir enquanto os preços das ações listadas em bolsa, ou seja, o valor dos negócios já estabelecidos, permanecerem bem acima dos custos de montagem de novos empreendimentos.
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