Política
Celso Ming -Freio nos bônus indecentes
O Estado de S. Paulo - 03/02/2010
O Banco Central anunciou que prepara um conjunto de regras para a remuneração dos dirigentes dos bancos brasileiros a entrar em vigor em 2011. Nisso segue recomendação do Grupo dos 20 (G-20, do qual faz parte o Brasil), que sugere a adoção do procedimento em escala global.
Uma avaliação superficial pode dar a entender que o critério de remuneração de um diretor de banco privado é uma questão de âmbito privado, portanto assunto que deve se ater às relações entre dirigentes e acionistas de cada instituição.
No entanto, o que se viu nesta crise foi que as fantásticas comissões pagas por desempenho promovidas pelos grandes bancos em benefício dos seus executivos estão entre as causas da derrubada do sistema inteiro, na medida em que levaram esses dirigentes a assumir riscos desproporcionais à capacidade de alavancagem dos próprios bancos.
Como os bancos operam com cobertura oficial, no redesconto e nos financiamentos de última instância, essa remuneração extra não pode ser desvinculada dos recursos públicos.
Não há dúvida de que é preciso definir limites para essas práticas, que os políticos passaram a chamar de "bônus indecentes", a critério dos legisladores e das instituições encarregadas da supervisão bancária.
Mas não se pode perder de vista que o principal objetivo de todo o corpo de regulação que vem vindo aí é garantir o saudável funcionamento do sistema financeiro para que possa atuar como instrumento do bom andamento do sistema produtivo, e não apenas o de dar o troco nos banqueiros.
Ainda está sem solução o restabelecimento da responsabilidade dos executivos dos bancos nas tremendas falhas nas tomadas de riscos. Não dá para esquecer que foi também uma recomendação do Grupo dos 20 (em novembro de 2008) que bancos grandes demais para falir sejam automaticamente resgatados pelas autoridades.
Se esse princípio for rigidamente aplicado, fica prejudicada a administração de qualquer instituição financeira que tenha alguma capacidade de produzir crise sistêmica - e, para isso, não é preciso que seja nem grande demais nem mesmo apenas grande; basta que tenha muitas conexões.
Se pode sempre contar com o guarda-chuva oficial, por que um diretor de banco haverá de evitar expor-se a riscos excessivos ou, então, haverá de desdobrar-se em combater lambanças que, afinal, lhe proporcionam tanto retorno pessoal?
Em consequência dos graves desastres que, no Brasil, envolveram o patrimônio dos bancos nos anos 80 e 90, as regras brasileiras de funcionamento do sistema bancário são mais conservadoras e mais firmes e a supervisão, bem mais rígida do que as que prevalecem nos Estados Unidos e na Europa.
Hoje, os grandes executivos das instituições financeiras nos Estados Unidos (e também em certos países europeus) são vistos como irresponsáveis e como aqueles que se refestelam no dinheiro público enquanto o resto da economia está mergulhada na recessão, no desemprego e na falta de futuro. Por isso, qualquer decisão que soe como punição a esses profissionais que as pessoas simples veem como gente sem coração e sem escrúpulos é recebida com foguetório político.
E o grande risco é que fique tudo nessa vingança e que a regulação do sistema financeiro global, que é o que realmente importa, fique para quando der.
Confira
Disse o Senhor - O presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, fez ontem uma afirmação carregada de ambiguidade. Avisou que o crescimento econômico está ocorrendo acima da tendência de longo prazo do crédito, da massa salarial e do comércio.
Em seguida, deu a entender, como o Senhor Deus depois da Criação, que isso é bom: "O Brasil sai forte da crise."
A primeira parte da declaração é papo de falcão. Avisa que o ritmo está forte e que conviria dar uma brecada. Mas a segunda sugere que a economia está em condições de seguir nesse trem de corrida.
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