Política
Cenas da miséria americana Vinicius Torres Freire
FOLHA DE SP - 26/08
De cada sete americanos, um tem ajuda federal para comer; pedidos de auxílio cresceram 70% desde 2007
A MOÇA bonita anuncia na TV empréstimos de até US$ 10 mil, "sem burocracia". Tem uma trança única jogada sobre o peito. Pocahontas. De certo modo, é mesmo Pocahontas: a agência de empréstimos é a "primeira firma financeira 100% 'native-american'" (como se chamam os índios por aqui).
A bela Pocahontas chama a atenção na torrente de anúncios de negócios que veem oportunidade na miséria americana, quase todos iguais. Um comercial de TV atrás do outro oferece dinheiro fácil para remendar o orçamento das famílias.
Disputam lugar com os tradicionais anúncios de firmas de advogados que oferecem vitórias e dinheiro em casos de acidentes de trânsito, erros médicos, remédios podres e coisas assim.
Agora há uma série de empresas a oferecer empréstimos e/ou advogados a fim de evitar despejos, epidemia que explodiu com a bolha imobiliária.
Outras oferecem seguros para cobrir despesas que o seguro saúde não cobre (sim, é o seguro do seguro). Ou para cobrir despesas descobertas pela assistência estatal à saúde de velhos e crianças deficientes (o Medicare).
Mais ou menos um de cada sete americanos depende de assistência do governo federal para comer.
São cerca de 46,5 milhões de pessoas no programa "Food Stamps" (cupons de comida), uma espécie de Fome Zero criado pelo governo Roosevelt (Democrata) em 1939. O número de americanos no Fome Zero cresceu cerca de 70% desde 2007.
O Partido Republicano quer dar cabo do que puder em termos de assistência pública à saúde (Medicare, Medicaid) e do Food Stamps. Barack Obama, o fraco, aprovou um modesto plano de saúde oficial para os mais pobres. Mas quase metade dos americanos quer que os mais pobres se estrepem.
Parlamentares republicanos já pediram o corte de metade da despesa do programa de alimentação, que foi de US$ 76 bilhões no ano passado (custo de oito Bolsas Família).
Os republicanos querem menos impostos para ricos. Os anúncios eleitorais de Obama martelam o fato de que Mitt Romney, candidato dos republicanos, pagou apenas 14% em Imposto de Renda em 2010.
Os americanos comuns, classe média, pagam muito mais, para lá de 20%. Isso quando têm dinheiro: a TV também está cheia de anúncios de firmas que oferecem serviços de acertos de contas com IRS, a Receita Federal daqui.
A renda média das famílias que recebem Food Stamps é de (aqui) miseráveis US$ 783. A linha de pobreza oficial americana é US$ 1.542 por mês para uma família de três pessoas.
Uma empregada doméstica brasileira aqui na região de Boston consegue ganhar mais do que isso por mês -isto é, pode receber uns US$ 12 por hora. Um caixa do Walmart ganha, em média, US$ 8,50.
O salário médio americano no setor privado é de US$ 23,50 por hora. Está quase estagnado faz cinco anos. A desigualdade cresce faz mais de duas décadas.
Quase metade dos americanos acha que Obama, o fraco, é socialista, ou coisa pior. Logo ele, com seus economistas de Wall Street.
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