É SIMPLISMO explicar a crise no Senado pelo desvio de conduta de funcionários ou senadores. Só a desmontagem institucional pode ter gerado tal descontrole em nível operacional. O Senado representa a federação, e por isso cada Estado tem o mesmo número de senadores. A função legislativa do Senado deve focar o equilíbrio federativo de forma a que uma decisão da Câmara não afete as relações regionais ou não gere inaplicabilidade pela incapacidade fiscal e administrativa de Estados e municípios.
Há muitos anos o Senado deixou de ser o espaço público dos Estados e municípios. O presidente e o Ministério da Fazenda invadiram suas competências e passaram a decidir como se Senado fossem. Os governadores e prefeitos deixaram de ir ao Senado defender os interesses de suas unidades federadas. Dirigem-se ao Ministério da Fazenda.
Pelo artigo 52 da Constituição Federal, cabe privativamente ao Senado aprovar por voto secreto a nominação de magistrados, ministros do TCU, diretoria do Banco Central, procurador-geral da República e embaixadores. Poderes privativos que não são -de fato- exercidos. Os nomes submetidos pelo presidente ao Senado são apenas referendados. Quando o presidente escolhe um nome, a imprensa registra, como designado.
Cabe ao Senado, privativamente, autorizar as operações financeiras da União, dos Estados e dos municípios. Quando isso ocorreu? Os empréstimos da CEF e do BNDES a eles passam pelo Senado? Ao Senado cabe fixar os limites globais de endividamento da União, dos Estados e dos municípios. Aliás, até fixou (resolução 43), mas o Ministério da Fazenda ignora, define os critérios a seu arbítrio e autoriza ou não como entender.
Cabe ao Senado dispor sobre as garantias da União a operações de crédito. Quando isso ocorreu em relação ao BID ou Bird, bancos estatais ou privados? Nunca. Ao Senado cabe suspender a execução de leis declaradas inconstitucionais pelo STF. Isso tem ocorrido? Cabe também avaliar periodicamente a funcionalidade do sistema tributário nacional. Quando isso foi feito?
O Senado se tornou uma poderosa Câmara de Deputados. É este poder, com 16% dos deputados, que interessa ao Executivo. Mais fácil negociar.
É este poder autoatribuído por abandono da representação federativa, delegando-a ao Executivo ou não o exercendo, que reconstruiu a instituição, ampliando seu poder e produzindo a certeza de que nem a Constituição nem poder algum paira por cima dela. A partir daí, tudo seria possível. E foi. E terminou na situação atual, com os desvios, para gáudio do apetite hegemonista do Poder Executivo.