Política
Como reagir à crise? Política fiscal (*) Ilan Goldfajn
Na semana passada tivemos algumas notícias na área fiscal que retratam uma certa inconsistência. O governo anunciou um pacote de bondades para fazer frente à crise, reduzindo impostos e contribuições. A Receita Federal vai fiscalizar mais duramente as empresas para poder continuar atingindo suas metas de arrecadação. E foi divulgado que a arrecadação do governo no ano passado atingiu um recorde - 34,8% do novo produto interno bruto (PIB). Afinal, é para arrecadar mais ou menos? O governo está ciente de que haverá queda da arrecadação com a desaceleração da economia e que isso será um desafio para a política fiscal? Como manter simultaneamente superávit fiscal e os pacotes de bondades, com a perspectiva de queda da arrecadação? Afinal, como deveria reagir o Brasil à crise na área fiscal?
É importante ter em mente que a qualidade da reação brasileira à grave crise internacional vai determinar não só a extensão do impacto na economia brasileira nos próximos meses, mas também o seu futuro mais distante. Caso consiga atravessar a crise mostrando consistência, com reações que não destruam as bases para o crescimento sustentado, inevitavelmente conquistará espaço no cenário internacional.
Nesse sentido, é fundamental perceber que o regime macroeconômico vigente, baseado no tripé câmbio flutuante, responsabilidade fiscal e metas de inflação, é capaz de lidar com as conseqüências da crise para o País. Por exemplo, o Banco Central do Brasil (BC), seguindo o regime de metas de inflação, já se encontra avaliando a necessidade de reagir à crise reduzindo a taxa básica de juros. Mas, corretamente, ainda aguarda ter mais informações sobre a extensão da crise e a forma como ela irá impactar a economia brasileira (os juros futuros em queda já refletem essa posição do BC).
Sob a ótica da reação à crise no âmbito da política fiscal, é sedutor reagir à desaceleração doméstica do nível de atividade com uma política expansionista. Mas há que considerar também preservar a capacidade de crescimento futuro do Brasil. Um país que tem elevado de forma sistemática os gastos correntes do governo - financiados hoje com aumento da arrecadação, que atingiu quase 38% do PIB em 2007 (após esgotar o financiamento inflacionário e o da dívida crescente) - e comprimido o espaço dos gastos privados, oferecendo em troca à sociedade serviços ineficientes e investimentos públicos reduzidos, tende a limitar sua própria capacidade de crescimento. Exacerbar essa tendência pode mais do que compensar os ganhos de curto prazo.
Para a frente, infelizmente, devemos esperar uma queda da arrecadação tributária. No último ciclo de expansão, o crescimento da arrecadação foi muito dependente de fatores específicos, como o crescimento do crédito, dos lucros financeiros, da expansão do consumo (principalmente de bens duráveis) e do emprego. À medida que, no quadro que se avizinha, esses fatores não mais estejam presentes, a arrecadação tributária deve-se reduzir no biênio 2009-2010. Isso trará desafios inéditos para a administração da política fiscal e imporá limites à expansão de gastos.
Cabe perguntar se este seria o momento de iniciar uma política fiscal anticíclica. Normalmente, recomenda-se iniciar uma política anticíclica nos momentos de expansão econômica, para ajudar a criar credibilidade. Há sempre a desconfiança baseada no histórico brasileiro de o excesso de gastos no período de necessidade não ser acompanhado por sua redução nos períodos de bonança.
Dessa forma, uma política fiscal expansionista como reação à crise financeira internacional tem o seu limite imposto pelo seu impacto sobre o crescimento de longo prazo, assim como o risco de renascerem dúvidas quanto à sustentabilidade fiscal.
É relevante questionar: em que condições os benefícios de curto prazo de uma política fiscal expansionista no combate à desaceleração, no Brasil, mais do que compensariam as contra-indicações acima? E, nesse caso, qual é a forma adequada de gerir a política fiscal?
O ajuste na política fiscal deve depender da natureza e da intensidade dos choques que atingirão a economia brasileira. Num cenário de choque internacional moderado, caso a menor demanda agregada aumentasse o hiato do produto de forma a reduzir a inflação esperada, o ajuste de demanda poderia ser levado a cabo pela política monetária. Somente no cenário de uma depressão mundial é que seria recomendável uma política fiscal contracíclica, nesse caso concentrando o ajuste no investimento público em infra-estrutura e reduzindo os impostos das empresas.
Ipea - Certo ou errado?
A diretoria do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) acabou de realizar, no sábado, prova para aprovar 60 novos profissionais. Contribui, assim, para diminuir o "raquitismo" do Estado, no meio desta crise internacional. Os candidatos a pesquisadores tiveram de responder apenas "certo" ou "errado" a diversas questões. Abaixo, relaciono uma pequena amostra, na qual as primeiras duas questões eram baseadas na análise do sociólogo Francisco de Oliveira:
"66. Sem a conversão dos fundos públicos em pressuposto geral do capital, a economia produtiva capitalista é insustentável.
67. A especulação financeira vislumbra como luz no fim do túnel o brilho do tesouro nacional.
97. O termo neoliberalismo designa uma corrente de organização da atividade econômica que capciosamente ecoa um movimento histórico com o qual em realidade e na prática não partilha fundamentos e princípios."
(*) Este texto é baseado no artigo escrito em co-autoria com Beny Parnes para o livro virtual Como Reagir à Crise? Políticas Econômicas para o Brasil (www.iepecdg.com).
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Para nova crise, discurso novo. Alguma coisa o governo aprendeu com 2009. Já não fala em marolinha. A presidente Dilma Rousseff tem externado com franqueza sua apreensão com a deterioração do quadro externo....
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