Contágio português Miriam Leitão
Política

Contágio português Miriam Leitão



O GLOBO - 31/01/12



Agora é Portugal que está no olho do furacão. O país foi contaminado pela longa agonia grega. Os credores, que não conseguem chegar a um acordo com Atenas, olharam para o segundo da fila. Ontem, os juros cobrados de Portugal foram os mais altos desde que o país entrou no euro. Fracassa a tentativa da Zona do Euro de permitir o calote grego, desde que fosse um caso único.

Portugal tem uma dívida de 93% do PIB e o déficit público oscila entre 10% e 9%. Em 2012, tem que rolar C 25 bilhões. Enquanto a cúpula da Europa discutia parâmetros fiscais, a Grécia continuava sem ter um acordo com os bancos credores sobre o tamanho do calote e Portugal começava a sangrar.

A Zona do Euro pediu à Grécia o impensável. Que aceite a nomeação de um comissário para controlar as finanças do país. Ao contrário do que se pensa, não é o mesmo que o FMI pede a endividados. É muito pior. Quem diz é a economista Monica de Bolle, que trabalhou no FMI:

- O Fundo nunca pediu para aprovar orçamento de algum governo. Estabelece uma lista de obrigações. Nem a Lei de Responsabilidade Fiscal dá o direito à União de aprovar ou reprovar orçamentos estaduais. Apenas define metas.

O impasse grego está dificultando a vida de Portugal. A pergunta dos investidores é: se a Grécia vai dar o calote, ainda que organizado, o que impedirá os portugueses de seguirem o mesmo caminho?

Os juros pagos pelo governo português dispararam, e o temido contágio está acontecendo. Para títulos com vencimento de três anos, os juros chegaram a 23%, enquanto os com vencimento de dez anos pagaram 16,8%. Os investidores estão cobrando mais caro pela dívida de curto prazo porque consideram que a probabilidade de calote é maior. O seguro contra o risco de calote (Credit Default Swap) do governo português subiu muito desde o início do ano (vejam no gráfico).

A dívida portuguesa já é classificada como junk (lixo) pelas três agências de classificação de risco, Standard & Poor´s, Fitch e Moody´s. O economista Eduardo Oliveira, da equipe de cenários da Um Investimentos, disse que tanto a Grécia quanto Portugal são duas economias pequenas, com baixa capacidade de competição, estão muito endividadas e ligadas.

- A forma como será definido o calote da Grécia será crucial para Portugal. Se a perda para o mercado for muito grande, os juros de Portugal vão subir ainda mais. Mas se as condições forem boas para o mercado, então os títulos portugueses podem cair - disse.

O economista Antenor Gomes Fernandes, sócio-fundador da gestora STK Capital, registra que os juros portugueses estão subindo, mesmo com toda a liquidez que está sendo promovida pelo Banco Central Europeu (BCE). Desde a entrada de Mario Draghi, o BCE passou a financiar os bancos, para eles comprarem títulos dos países com problemas. Isso não está ajudando Portugal.

- O mercado se antecipa e já olha para o próximo problema. O CDS do governo grego está em 1400 pontos, subiu muito nas últimas semanas. Isso já é preço de calote. É receio do famoso "também quero". Se os gregos vão ter perdão da dívida, por que os portugueses não vão querer também? - questiona.

Os líderes europeus continuaram reunidos ontem à noite tentando acertar esse acordo que dê uma ordem fiscal para todo o bloco, noves fora o Reino Unido e dois outros países que o seguiram. A Grécia continuava com as negociações com a Troica (FMI, BCE e Comissão Europeia) e os bancos. Enquanto isso, os credores passaram a rodar o torniquete sobre Portugal.

Para a consultoria inglesa Capital Economics existe o cenário de que Portugal dê um calote e até o cenário extremo de que o país saia do bloco. Os jornais portugueses refletiam esse agravamento da crise. O pacote que tinha sido dado ao país foi arquitetado para refinanciá-lo até o fim do ano, mas como os juros cobrados do país subiram, Portugal pode precisar de mais ajuda. A alta dos juros cobrados de Portugal reflete, segundo a consultoria inglesa, "o aumento do ceticismo de que a participação do setor privado na reestruturação das dívidas da Zona do Euro ficará restrita à Grécia". Ou seja, os credores sabem que vão perder também em Portugal.



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