Política
O mercado não para de dar vexame Vinicius Torres Freire
FOLHA DE S. PAULO
Fumacê grego tumultuou o dia, mas mercado se enrola nos próprios erros e vexames e amplifica o pânico financeiro
A demência de ontem nos mercados ocorreu em meio ao fumacê da crise europeia. Mas ao que parece não se deveu diretamente à pindaíba grega.
O caldo da finança engrossa faz semanas, mas o pânico pode ter sido causado por barbeiragens de um operador de grandes investidores, amplificado por obtusidades de operações financeiras automatizadas.
"Máquinas" vendem e compram papéis em frações de segundo, de acordo com dados que recebem do mercado e segundo o modo como foram "programadas". Preços de ações boas caíram de modo estranho e violento, causando chiliques num mercado que já estava bichado.
De menos etéreo, o que pegou mal ontem foi o Banco Central Europeu ter dito que não compraria títulos da dívida de países como Grécia e cia.
Isto é, o BCE diz que não cogita de emprestar dinheiro diretamente a tais países. O BCE está aceitando títulos podres gregos como garantia para empréstimos de curto prazo para bancos gregos, pois de outro modo bancos e governo gregos quebram. Mas o mercado quer que o BCE financie de uma vez o governo grego, assim como o BC dos EUA, o Fed, financiou e sustentou o mercado depois da crise de 2008-09.
O governo grego pendurou-se numa espécie de dívida de cheque especial com juros crescentes e impagáveis. Faz duas semanas, desistiu de rolar o cheque especial e pediu dinheiro à União Europeia e ao FMI.
Agências que dão notas à credibilidade do credor, as agências de "rating", passaram a alertar para um calote da Grécia: a dizer que sua dívida era "podre", o que piorou a crise. Investidores institucionais não podem aplicar em papéis classificados como "podres". Em tese, nem o BCE.
Mesmo que o empréstimo de emergência para a Grécia saia logo, os donos do dinheiro grosso no mundo, "os mercados", acham que o país dificilmente escapa do calote.
Teme-se que Portugal seja o próximo da fila. O medo encarece os juros para negócios em euro, os de governos e empresas. O medo faz com que investidores fujam de euros e de ativos de risco no mundo inteiro.
Mais divertido é que a cúpula dos governos americano, alemão e francês detona as agências de "rating" (S&P, Moody"s, Fitch), que nunca preveem crises sérias e só pioram a situação quando o caldo entorna.
Essas agências foram cúmplices da criação dos instrumentos financeiros que deram na crise de 2008.
Trata-se de caso parecido, embora ainda não criminal, ao de auditorias como a falecida Arthur Andersen, cúmplices das fraudes que ajudaram a inflar a bolha dos anos 1990, que terminou em 2000-02 com quebras criminosas e espetaculares, como as da Enron e da WorldCom.
O mercado tem fraudado negócios em massa. Conspira com auditores.
Tem a cumplicidade de supervisores privados de "risco". Alocou capital de modo porco ao colocar dinheiro, real e de fantasia, em negócios que deram na crise imobiliária e, depois, geral de 2008.
Não sabe diluir risco, pois os instrumentos financeiros que inventaram para tanto quebraram o planeta quase inteiro. A conta acabou em governos, os quais o mercado ataca por causa de dívidas excessivas. Vexame supremo, quase quebram por um defeito num fusível da Bolsa da Nova York.
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