CRISE: A patética confissão de Bernard Madoff
Política

CRISE: A patética confissão de Bernard Madoff


A CONFISSÃO DO GOLPISTA

Bernard Madoff, o maior larápio da história de Wall Street, conta
como enganou os seus clientes usando a velha e boa lábia


Giuliano Guandalini

Shannon Stapleton/Reuters
A ÚLTIMA APOSTA
Madoff chega à audiência: "Estou dolorosamente ciente de que lesei muitas, muitas pessoas"

Três meses e um dia. É o tempo que se passou entre a prisão preventiva do maior larápio financeiro da história, o investidor Bernard Madoff, e sua confissão, na última quinta-feira, da prática de onze crimes cujas penas, somadas, poderão condená-lo a 150 anos de cadeia. Nos últimos vinte anos, 4 800 clientes – entre fundos de investimento, entidades de caridade, figurões de Hollywood e simples poupadores de classe média – nutriram a fantasia de ter 65 bilhões de dólares investidos nas empresas de Madoff, uma aplicação que reputavam sólida e rentável. Esse dinheiro simplesmente sumiu no ralo da maior pirâmide financeira da história. O investidor, uma verdadeira celebridade no mundo financeiro, ex-presidente da bolsa eletrônica Nasdaq, admitiu na semana passada que trapaceou com todos esses milhares de clientes. E que nunca investiu um único centavo a ele confiado.

"Durante muitos anos, até minha detenção, em 11 de dezembro de 2008, eu operei um esquema de pirâmide financeira", admitiu Madoff em uma confissão entregue ao juiz Denny Chin, do Tribunal Federal de Manhattan. Uma pirâmide consiste em remunerar os clientes mais antigos com o dinheiro dos novos investidores, sem produzir rendimentos reais. Depois da confissão, Madoff teve sua liberdade condicional revogada, foi algemado e colocado novamente atrás das grades. O investidor, de 70 anos, deixará para sempre a sua cobertura de 7 milhões de dólares e agora passará os próximos dias entre uma cela de 5 metros quadrados e o pátio onde poderá se exercitar, dia sim, dia não, no Metropolitan Correctional Center – o mesmo que já guardou gente como o mafioso John "Junior" Gotti e o terrorista Omar Abdel-Rahman. Ao menos formalmente, ele ficará preso até o anúncio de sua sentença, em 16 de junho. Com a provável condenação, Madoff deverá passar o resto de seus dias na cadeia.

A confissão faz parte de um acordo com os promotores por meio do qual Madoff reconhece a culpa em troca de benefícios ainda não divulgados. Entre esses benefícios está o de livrar-se de um longo e desgastante processo em que seria publicamente execrado. Até o momento, os promotores conseguiram localizar apenas 1 bilhão de dólares dos clientes. Isso significa que praticamente 99% do dinheiro evaporou. Em sua confissão, Madoff relata de forma objetiva e cândida como enganou milhares de investidores (veja as frases abaixo). Esse relato dissolve dois mitos:

1) Imaginava-se que, ao menos no início de sua carreira, Madoff tivesse operado em Wall Street como um investidor honesto. Ele deixou claro que era um criminoso desde então: "Minha fraude começou no início dos anos 90", disse ele. "O país estava em recessão e não era um bom momento para investir em títulos e ações. (Mesmo assim) recebi dinheiro de alguns investidores institucionais, e eles esperavam retornos maiores do que os disponíveis no mercado."

2) Imaginava-se que, para roubar seus clientes na era da informação, Madoff se servisse de mecanismos financeiros sofisticados. Balela. O investidor simplesmente tomava o dinheiro dos clientes e, de boca, prometia investi-lo usando uma estratégia financeira infalível desenvolvida por ele, apelidada de split strike conversion strategy (convém nem tentar traduzir). Um nome pomposo que não significa absolutamente nada. Nas palavras do próprio picareta, serviu apenas para "dar aos clientes a impressão de que eu alcançaria os resultados esperados". Para onde então ia o dinheiro? Era depositado em uma conta-corrente com baixa remuneração, em nome do próprio Madoff. Os clientes eram mantidos no escuro porque recebiam em casa extratos falsos. Imaginavam que seus lucros fossem exponenciais. Eram ludibriados.

Madoff tinha talento para atrair o dinheiro no mundo todo. No Rio de Janeiro, contava com um sócio que se especializou em buscar fundos oriundos de caixa dois. Os lesados agora não podem reclamar o prejuízo na Justiça americana sem se complicar com a Receita Federal brasileira. Em São Paulo, Madoff tinha um fundo associado ao Banco Safra, que, segundo o jornal Financial Times, está indenizando alguns clientes. Cerca de 100 vítimas de Madoff acompanharam a audiência em Manhattan. Não contiveram os aplausos quando souberam de sua prisão. "Quando colocaram as algemas nele, foi emocionante. Não sou uma pessoa vingativa, mas quando algo assim acontece você quer justiça", disse Burt Ross, consultor imobiliário que disse ter perdido 5 milhões de dólares. "Esse é o momento em que apreciamos o sistema judicial que temos. Em três meses, esse homem foi colocado atrás das grades, para que passe o resto de sua vida preso."

"Durante muitos anos, até minha detenção, em 11 de dezembro de 2008, eu operei um esquema de pirâmide financeira"

"A essência da minha fraude era prometer a clientes e a clientes potenciais que eu investiria o seu dinheiro em ações, opções e outros títulos de companhias tradicionais e que pagaria a eles os lucros e devolveria o valor do principal desses investimentos"

"Essas promessas eram falsas. Eu nunca investi o dinheiro como havia prometido. Em vez disso, esses fundos foram depositados em uma conta no banco Chase Manhattan"




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