A paga da praga
DORA KRAMER
O ESTADÃO - 20/07/11
O PT está com medo de que o julgamento do mensalão, se ocorrer mesmo
em 2012, prejudique o desempenho do partido nas eleições municipais e,
por extensão, atinja os candidatos nas eleições de 2014 para
presidente, governadores, senadores e deputados. Não é um temor
infundado, embora seja totalmente injustificado.
Certamente não poderá haver melhor cenário para a oposição.
Ao longo de semanas e até durante um mês ou mais, o Supremo Tribunal
vai revisitar episódios que por pouco não fizeram o então presidente
Lula renunciar à reeleição e resultaram na denúncia do Ministério
Público contra a "organização criminosa" montada pela cúpula do PT em
conluio com o lobista Marcos Valério de Souza. Não vai ser agradável a
olhos e ouvidos petistas ver e ouvir de novo o desfile de acusações
por corrupção (ativa e passiva), peculato, lavagem de dinheiro, evasão
de divisas, entre outros. Para o PT sem dúvida por ser eleitoralmente
mortal. Ou não.
Levando-se em conta a letargia que motivou o correspondente do "El
País" no Brasil, Juan Arias, a escrever artigo perguntando sobre as
razões pelas quais o brasileiro marcha em prol da liberdade dos
costumes, mas não se abala em sair de casa para protestar contra a
corrupção, tudo é possível. Mas o mais provável é que ocorra o que o
secretário de comunicação do PT, André Vargas, considera um risco
extremo. Diz ele, achando "muito estranha essa coincidência" de datas:
"O julgamento às vésperas da eleição dará a entender ao eleitor que o
PT está sendo julgado".
Óbvio que estará. Poderia até não estar se tivesse havido rigor na
punição àqueles que levaram o partido ao crime. Aceitando José Dirceu
na Executiva do partido, reincorporando Delúbio Soares e absolvendo os
demais mensaleiros, o PT aceitou pagar para ver o preço. Não pode
agora se fazer de desavisado. É enfrentar o rojão e assumir a paga da
praga que o partido se auto-rogou.
De fato e ficção
Alguém está faltando com a verdade no PMDB quando se trata da relação
do partido com o governo. Em público, José Sarney, Michel Temer e
Henrique Eduardo Alves, respectivamente presidente do Senado,
vice-presidente da República e líder do PMDB na Câmara, elogiam a
capacidade da presidente de fazer amigos, influenciar pessoas e
gerenciar crises na base aliada. No particular, o sentimento é muito
diferente. Todos se queixam do tratamento de segunda dados aos
ministros. Nelson Jobim e Moreira Franco, por causa do "esvaziamento"
de suas pastas.
Pedro Novais por ser ignorado pela presidente, que assiste calada à
disseminação de versões sobre sua iminente saída; Edison Lobão pelo
monitoramento estreito no setor de Minas e Energia, onde Dilma exerce
controle direto. Garibaldi Alves por ter sido orientado a não discutir
reforma da Previdência. Quanto a Michel Temer, a insatisfação decorre
do papel secundário que Dilma lhe reserva ao não fazer dele um
parceiro de fato no compartilhamento das decisões de governo.
Diante desse quadro e pela observação dos episódios que representaram
dificuldades para o governo nestes seis meses, a avaliação real não é
a de que Dilma sabe administrar crises, ao contrário: seu método (ou
falta de) favorece a acumulação de passivos. O resultado é a
contratação desde já de crises que podem explodir no futuro.
Caudatária
Não resta dúvida de que a intervenção da presidente no Ministério dos
Transportes significa um avanço em relação à rotina de impunidade do
governo anterior. Algo, contudo, segue fora do lugar. Não pelo fato de
a atual presidente ter sido nos últimos anos aquela que tudo sabia e
tudo controlava no governo. Muito mais pela sistemática da presidente
de só agir quando informada pelos jornais a respeito do que se passa
em seu governo. Ou estão falhando os controles internos para detectar
os malfeitos ou Dilma só se sensibiliza com eles quando são levados ao
conhecimento do público.