Dora Kramer Inversão de culpa
Política

Dora Kramer Inversão de culpa


O Estado de S. Paulo - 16/03/2011


O PT abriu o ano de 2011, para quando inicialmente estava previsto o
julgamento do processo do mensalão no Supremo Tribunal Federal (STF),
disposto a ajudar os réus - pelo menos os seus - a se livrar das
acusações de corrupção, peculato, lavagem de dinheiro, evasão de
divisas, entre outras.

Adepto das críticas à "judicialização da política", como se
convencionou qualificar genericamente decisões judiciais que
atrapalham interesses políticos, o PT patrocina a politização do
processo resultante de denúncia da Procuradoria-geral da República em
2007.

Esse movimento, obviamente com o objetivo de influir na decisão dos
ministros do STF mediante uma absolvição à moda da casa, é percebido
no tratamento dado aos principais (do ponto de vista
político-partidário) réus.

José Dirceu, o "chefe da quadrilha", nas palavras do autor da denúncia
e então procurador-geral Antônio Fernando de Souza, voltou a integrar
o diretório nacional do partido.

Com ele haviam sido afastados e também retornaram João Paulo Cunha e
José Genoino. Este último recentemente assumiu o posto de assessor
especial do Ministério da Defesa e Cunha, para espanto geral, foi
levado à presidência da Comissão, note-se, de Constituição e Justiça
da Câmara.

Um grupo expressivo, do qual faz parte o líder do governo na Câmara
dos Deputados, Cândido Vaccarezza, defende a volta do ex-tesoureiro e
figura símbolo do escândalo, Delúbio Soares, ao partido argumentando
que as penas não podem ser "eternas".

Argumento que convenientemente deixa de lado o fato de que a Justiça
ainda não se pronunciou. Para o PT o importante é que esse
pronunciamento ocorra em um ambiente já insensível aos acontecimentos
de 2005, permeado pela impressão geral de que já houve punição
suficiente e a conta foi devidamente paga.

Não bastasse, agora que o julgamento foi remarcado para 2012, o PT
começa a pôr sob suspeita a isenção do Supremo, difundindo a tese de
que julgamento em ano de eleições pressupõe inevitável parcialidade.

Um truque. Bem engendrado, mas insuficiente para convencer alguém de
que a culpa de eventual condenação terá sido dos juízes e não dos
réus.

Nuclear. O ex-deputado do PV Fábio Feldmann, hoje consultor para
assuntos de meio ambiente, compartilha da convicção dos que veem no
risco de desastre na usina de Fukushima o início do fim do uso de
energia nuclear.

"Se o Japão que é tido como o país mais eficiente na segurança e
prevenção está sob a ameaça de uma tragédia nuclear, o que dizer do
restante do mundo?", questiona Feldmann, para quem o que ocorre agora
no Japão confirma o que os ambientalistas dizem há anos sobre os
perigos dessa fonte de energia.

Espasmo. A proposta de criação de uma comissão no Congresso para
discutir o destino das usinas nucleares no Brasil pode até ser cheia
de boas intenções, mas é o tipo da falsa providência.

Sempre que há algum acontecimento de repercussão aparece a sugestão de
se criar um grupo de discussão no Parlamento. A comissão para debater
a última crise econômica mundial foi instalada com ares de grande
evento. A respeito da qual nunca mais se teve notícia.

O Legislativo brasileiro prestaria melhor serviço se, no lugar de
simular interesses grandiloquentes, se interessasse por solucionar
problemas mais urgentes. Como, por exemplo, a recuperação da
credibilidade do Poder.

À margem. O ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal,
está escandalizado com a atitude da Câmara dos Deputados que
simplesmente resolveu não cumprir decisão do STF que assegura a posse
dos suplentes de deputados conforme a ordem dos eleitos pelos partidos
e não pelas coligações.

"Se um Poder não cumpre uma determinação da Justiça, é de se imaginar
que o cidadão comum acredite que igualmente não seja preciso obedecer
ao que diz a lei e ao que decide o juiz", diz o ministro.




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