Prestes a ser votada na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, a emenda que põe fim à reeleição e institui mandato de cinco anos para presidente da República, governadores e prefeitos vai ganhando adeptos fora do Parlamento entre aqueles que até outro dia consideravam a proposta nada mais que um casuísmo.
O mais recente é o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, cuja convicção em favor da reeleição transformou-se na certeza oposta em menos de 50 dias. No dia 25 de outubro, véspera do segundo turno da eleição municipal, o prefeito reafirmava com toda firmeza o “absurdo” de uma mudança dessas, nessa altura.
Na sexta-feira passada, transcorridos 48 dias, informou ao mesmo interlocutor que mudara de posição. Junta-se, assim, ao contingente de personagens de destaque no cenário político nacional que se prepara para demonstrar por A mais B que a reeleição no Brasil “não deu certo”.
Depois da adaptação de Kassab à posição de seu partido, o DEM, restam pouquíssimos porta-vozes da defesa da preservação das regras tal como estão. No PMDB, o governador Sérgio Cabral vem resistindo praticamente solitário.
O presidente do partido, Michel Temer, é a favor de aprovar as mudanças em 2009 com data de entrada em vigor em 2014, os líderes mais importantes também, mas Cabral até a última consulta – dia 11 de novembro – ainda prometia brigar contra o “casuísmo” que, segundo ele, serve apenas para dar ao Brasil uma imagem de país institucionalmente instável.
É de se conferir se mais à frente flexibilizará essa certeza, como fez Kassab, se manterá a opinião e assistirá calado à ofensiva dos contrários ou se enfrentará, além do partido, as posições do presidente Luiz Inácio da Silva, dos governadores José Serra e Aécio Neves e do grosso do primeiro escalão do PT.
Faça o que fizer, não vai alterar a tendência majoritária dos personagens com poder de influência sobre o processo sucessório de trabalhar em prol da aprovação da emenda constitucional que chega à CCJ da Câmara dos Deputados pelas mãos do deputado, ex-presidente da Câmara e réu no processo do mensalão João Paulo Cunha (PT-SP), relator do projeto.
Os mais vistosos são o presidente Luiz Inácio da Silva e o governador de São Paulo, José Serra. Este trabalha de forma explícita, não se deixa abalar com as críticas ao casuísmo – invoca sua condição de adversário doutrinário da reeleição –, já se articulou com o presidente da República e, pelo visto, também com o PT.
Lula atua com absoluta discrição. Para o padrão de loquacidade presidencial, é algo inusitado existir um assunto sobre o qual não faz referência. Entre outros motivos para não dar margem à interpretação de que aproveitaria o ensejo para patrocinar alguma manobra que lhe permitisse concorrer em 2010.
Por ora, o que se enxerga é apenas seu interesse em reduzir o tempo de espera para tentar a volta sem enfrentar uma disputa com o sucessor no cargo. No caso de ser uma sucessora, Dilma Rousseff, não haveria esse problema.
O engajamento do presidente Lula no fim da reeleição dá a medida da confiança que ele tem na eleição da mãe do PAC, a sacerdotisa de José Sarney.
If...
Conhecido por seu arrojo verbal, o ministro da Integração Nacional, Geddel Vieira Lima, na entrevista das páginas amarelas da revista Veja desta semana preferiu a dubiedade à assertividade, quando apertado.
Indagado se Lula não ficará refém do PMDB no caso de o partido eleger os presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado, respondeu que isso só ocorreria “se os líderes do PMDB fossem canalhas e quisessem chantageá-lo”.
A revista ponderou que exigir a presidência de Furnas e a diretoria internacional da Petrobras para votar a CPMF parece chantagem.
“Se isso ocorreu, foi um erro.”
E o ministro José Gomes Temporão estaria certo ao dizer que a Funasa é corrupta?
“Se ele tem informações para dizer isso, conta com meu apoio.”
Se o ministro que tudo sabe e tudo vê no PMDB está em dúvida, o que dizer de quem assiste de longe e paga a conta sem direito a maiores detalhes?
Concentração
Última semana de trabalho no Congresso é também a semana do esforço concentrado. Há pendências da maior importância na Câmara e no Senado – rito das medidas provisórias, fundo soberano, registro das entidades filantrópicas, regulamentação da atividade de lobby etc. –, mas suas excelências devem se concentrar mesmo no Orçamento de 2009 e na criação dos 7.343 novos vereadores a tempo de as vagas serem preenchidas daqui a dois meses.
A aprovação do Orçamento antes do recesso é uma imposição legal. Já a aprovação das novas cadeiras nas câmaras municipais é um imperativo do interesse parlamentar, além, claro, de ser o desfecho adequado para mais um período legislativo dedicado ao exercício continuado do vexame explícito.