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DO PALÁCIO PARA O EXÍLIO Paulo Lacerda despachava havia três meses num porão do Palácio do Planalto: prêmio de consolação no exterior |
O delegado Paulo Lacerda é um tira muito resistente. Ex-diretor-geral da Polícia Federal, Lacerda caiu pela primeira vez, em outubro de 2007, quando foi transferido para a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) em circunstâncias nunca totalmente esclarecidas. Há quatro meses, depois de VEJA revelar que a Abin grampeou ilegalmente o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, o delegado caiu pela segunda vez. Lacerda foi afastado temporariamente do comando da agência oficial de espionagem, por ordem do presidente Lula, até que a PF elucidasse seu papel na trama. Na semana passada, antes mesmo de a investigação ser concluída, o delegado caiu pela terceira vez ao ser exonerado definitivamente da Abin. Mas, como sempre acontece quando Lacerda tropeça, ele não ficará ao relento. Por determinação do presidente, o ex-diretor da Abin será nomeado adido policial do Brasil em Portugal. Sua viagem, que inverte a rota dos degredados que aportaram no Brasil no período colonial, deve ocorrer já no próximo mês.
A demissão do delegado e a divulgação de seu novo emprego aconteceram simultaneamente – e não é, logicamente, obra do acaso. O presidente chegou a acreditar que Lacerda seria isentado de responsabilidade pelas ilegalidades da Abin e pretendia aguardar o fim da investigação para reconduzi-lo ao cargo. Mudou de ideia depois que Lacerda foi pilhado contando um festival de mentiras à CPI dos Grampos. Contrariando tudo o que o delegado disse aos parlamentares, já está provado que seus subordinados participaram clandestinamente da operação policial que prendeu o banqueiro Daniel Dantas e manusearam ilegalmente gravações telefônicas. Pelo menos um dos espiões, o agente Márcio Seltz, confessou ter entregado pessoalmente ao diretor da Abin arquivos de conversas telefônicas – episódio que o delegado continua negando. A coincidência entre a demissão e o rápido anúncio do novo cargo atende a um último pedido de Lacerda, que vinha pressionando o Palácio do Planalto a lhe dar uma saída honrosa. Mas por que Lula cedeu ao apelo do delegado, abrigando em um cargo público no exterior alguém que não tem condições de ocupar um cargo público no Brasil, é um mistério.
Existem várias teorias, nenhuma delas comprovada, sobre a origem do prestígio de Lacerda no governo. Afastado temporariamente do comando da Abin, o delegado vinha despachando num porão do Palácio do Planalto sem que se saiba o que fazia por lá. Agora, ao ser transferido para além-mar, Lacerda refaz uma rota muito conhecida por ex-autoridades incômodas. Portugal foi o destino do ex-porta-voz de Fernando Collor, Claudio Humberto, nomeado adido cultural em Lisboa quando o chefe caiu em desgraça. A embaixada brasileira em Lisboa também serviu para abrigar o ex-presidente do PMDB Paes de Andrade, que passou quase quatro anos como embaixador no país. Como adido policial em Lisboa, cargo criado especialmente para Lacerda, mas que não dá direito ao grampo a cobrar, ele receberá salário de 8 000 dólares, equivalentes a 19 000 reais. Na falta do que fazer, poderá passar seu tempo se deliciando com o bacalhau, o pastel de nata e o bom vinho da terrinha.