O Estado de S. Paulo - 02/10/2011 |
Parece cada vez mais remota a possibilidade de o Banco Central (BC), presidido por Alexandre Tombini, estar correto na sua estratégia de alcançar a convergência da inflação para a meta em 2012, de 4,5%. É um objetivo que se baseia em dois pressupostos duvidosos: (1) a crise global provocará forte desinflação e, por vários canais, será transmitida para a economia brasileira; e (2) o governo Dilma promoverá robusto ajuste nas contas públicas, de modo a não deixar a tarefa do combate à inflação apenas para a política de juros. Não há muito a discordar do agravamento do colapso externo e de alguns desdobramentos apontados pelo BC. As economias dos países ricos deverão, sim, enfrentar grande desaceleração. E os riscos de que mergulhem na recessão são ainda mais altos. Isso reduzirá o comércio mundial e a demanda por matérias-primas e energia. Mas daí a concluir que a consequência inevitável será a desinflação global e, mais do que isso, que ela será automaticamente transferida para o Brasil é um passo maior que as pernas. O aprofundamento do caos econômico e o provável efeito dominó dos calotes soberanos, que se seguirão à reestruturação da dívida da Grécia, tendem a provocar também a fuga global para o dólar. Caso isso aconteça, os preços dos produtos importados subirão por aqui e teremos mais inflação - e não o contrário, como aposta a equipe econômica do governo Dilma. É o que se viu em setembro (veja o gráfico no Confira). É verdade, o BC poderá vender dólares e neutralizar, ao menos em parte, eventual escalada de suas cotações. Mas essa política esbarraria em outro propósito perseguido: garantir mais competitividade ao produto industrial brasileiro. Também não é tão certo que os problemas econômicos internacionais derrubarão tão acentuadamente as cotações das commodities, especialmente as de alimentos e do petróleo. Os grandes compradores são os asiáticos, sobretudo a China, economia que pode crescer menos neste ano, mas, certamente, acima de 7%. Ou seja, a demanda por commodities agrícolas e por energia deve avançar. Além disso, se os grandes bancos centrais entenderem que necessitam emitir muito mais moeda para enfrentar seus obstáculos, a consequência inevitável desse aumento da liquidez mundial será a elevação dos preços das commodities, como o próprio BC reconheceu no último Relatório de Inflação. Também não dá para jogar cacife tão alto nas promessas, feitas pelo governo Dilma, de reforço da disciplina fiscal. Em anos de eleições, como 2012, os governos têm mais dificuldades de resistir a pletoras por gastança. Fora isso, o próximo ano começa com um reajuste já contratado do salário mínimo, de nada menos que 14%. São mais despesas, pelo menos, com funcionários públicos e Previdência Social. No mais, o próprio BC reconheceu no Relatório de Inflação os graves riscos inflacionários da indexação (correção automática de contratos e tarifas) e da larga expansão dos serviços. O BC, que acaba de admitir uma derrubada mais moderada dos juros, pode, a qualquer momento, interromper esse movimento. E, até por questões eleitorais, o governo Dilma talvez entenda que o combate à inflação deva voltar a merecer a prioridade que deixou de ter há algumas semanas. Mas isso exigiria a revisão da atual estratégia do BC. |