Política
Federação de nações - MÍRIAM LEITÃO
O GLOBO - 13/09
A decisão da Corte Constitucional da Alemanha mostra que a Federação Alemã como um todo - com todos os seus poderes e forças políticas - está apoiando a moeda comum. Até a oposição comemorou. Foi mais do que um sinal do Judiciário, foi uma demonstração do país todo. O mesmo sinal foi dado na França, com o programa de austeridade do presidente François Hollande.
A crise está sendo longa e dolorosa, mas a cada momento de dificuldade mais aguda a Europa se une em torno do projeto de ter uma moeda comum. Ontem, dia 12, foi um desses momentos de reafirmação da vontade coletiva sobre as dificuldades e limitações. No final do dia, o presidente da Comissão Europeia, José Manuel Durão Barroso, disse que a Europa precisa evoluir para uma federação de nações.
Todos reclamam: os alemães acham que pagam uma parte grande demais da conta; os países em crise acusam a Alemanha de ser inflexível; a França dizia ter um outro caminho, mas adotou um plano de austeridade; Portugal pediu mais prazo e conseguiu, mas veio junto um outro pote de sal. Mesmo assim, todos querem continuar e dobrar a aposta na moeda comum.
Um dos caminhos é o que vem sendo formatado por Durão Barroso. O Banco Central Europeu será uma espécie de super banco central, com poderes de supervisionar todo o sistema bancário no continente da moeda única.
O problema continua. Como lembrou a revista "Economist", mesmo a França do socialista François Hollande, que dizia que o real inimigo era o sistema bancário, resgatou uma centenária instituição de financiamento imobiliário, o Crédit Immobilier de France, garantindo os bilhões de euros da sua dívida.
A Comissão Europeia está apresentando seu plano para a construção da autoridade bancária única na região. Quando isso estiver em funcionamento, o BCE poderá financiar diretamente os bancos evitando que o problema numa instituição vire crise nacional. E isso poderá ser o caminho para a união fiscal que deveria ter sido a primeira pedra do edifício.
A Alemanha queria outra ordem para os fatores. Primeiro, a união fiscal, depois, a bancária. Portanto, a decisão da Corte Constitucional mostra que o país tem sabido absorver os choques de ter suas ideias derrotadas pela maioria. A Alemanha diz, e não sem razão, que o BCE não consegue supervisionar tantos bancos. Em alguns países o mercado é pulverizado. Na Espanha a crise começou pelas caixas imobiliárias das regiões autônomas.
Se o BCE conseguir controlar os 200 maiores bancos, no entanto, estará com o controle de 90% da indústria bancária da região. Ainda se discute o escopo, a forma de atuação, os poderes do novo BCE.
O que aconteceu ontem é maior do que parece. Não é apenas a aprovação pela Justiça do Mecanismo de Estabilidade Financeira e do fundo de resgate. É um reforço na ideia da moeda comum. A mesma reafirmação foi feita dias atrás pelo presidente francês. Hollande anunciou um aumento de 20 bilhões de euros em impostos e cortes de gastos de 10 bilhões de euros. O oposto do que disse que faria. É a tentativa de levar o déficit dos 5,2% do PIB para a meta europeia de 3% . Não parece um déficit tão grande, mas a dívida já está em 89% do PIB e a economia francesa está com crescimento zero a três trimestres e com uma taxa de desemprego que já de 11,3%.
A Alemanha, ao exibir unidade do executivo, legislativo e judiciário em torno dos mecanismos financeiros de saída da crise, e a França, alterando o programa com o qual Hollande se elegeu, estão dobrando a aposta no euro. Os europeus continuam querendo ser uma federação de nações.
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