Política
Luta política Merval Pereira
O GLOBO
A proposta do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso de um governo de união nacional para enfrentar a crise econômica teve uma resposta forte da ministra Dilma Rousseff, para quem a ideia partia de quem "não segurou o tranco" e teve apagão, referindo-se ao episódio de 2001, em que o governo tucano teve que implantar um racionamento de energia para evitar uma pane do sistema elétrico. Tudo indica que a proposta do presidente de honra do PSDB não tinha mesmo outra intenção que não fosse fustigar o governo, insinuando que ele não está preparado para enfrentar adversidade de tamanho calibre.
Foi, aliás, por desconfiar dessa intenção política que o próprio presidente Lula rejeitou, logo no início de seu primeiro mandato, chamar o PSDB para o governo, embora Fernando Henrique tenha revelado em suas memórias que, depois da transição pacífica de poder, o partido tucano esperava que o PT se dispusesse a montar uma coalizão.
Já Lula comentou que o que o PSDB queria é que o governo petista admitisse que não tinha condições de governar sozinho. O fato é que PSDB e PT se aproximam e se afastam num jogo político que varia de acordo com os interesses momentâneos de cada um.
Na votação que deu fim à CPMF, o PSDB acabou jogando junto com os Democratas contra o governo, apesar da pressão que foi feita pelos governadores, especialmente Serra e Aécio. Recentemente, o PSDB foi o grande apoio petista nas disputas com o PMDB no Senado, tanto na briga pela presidência da Casa, quando optou pelo senador Tião Viana, quanto na Comissão de Infraestrutura, ocasião em que ficou com a candidatura da senadora Ideli Salvatti contra Collor.
O senador Aloizio Mercadante, ao classificar de "espúria" a aliança do PMDB com o PTB, disse que naquela votação ficaram patentes as afinidades do PT com o PSDB, que só não se concretizavam em uma aliança política pela disputa de poder entre os dois, especialmente em São Paulo.
Mas também em Minas, onde o governador Aécio Neves montou um acordo político altamente positivo para o estado com o ex-prefeito de Belo Horizonte Fernando Pimentel, do PT, setores petistas bombardearam a união, sob a alegação de que Aécio poderia vir a ser o candidato tucano à sucessão de Lula, e o PT perderia a condição de se contrapor a ele.
A união entre os dois partidos teve um momento simbólico forte no enterro de Ruth Cardoso, ano passado, quando o próprio presidente Lula comentou que as ligações entre o PT e o PSDB eram tantas que o Aerolula quase não fora suficiente para levar tanta gente de Brasília a São Paulo.
Em diversos outros momentos nestes últimos anos, o presidente Lula se manifestou, em público ou em conversas reservadas, a favor de uma maior aproximação com os tucanos, e também o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso já revelou seu desapontamento pelo fato de Lula não ter procurado o PSDB para um acordo político.
Mas tantas outras vezes os dois, e seus respectivos companheiros, envolveram-se em disputas e em acusações que inviabilizam qualquer acordo político.
Uma das mais graves acusações contra o governo de Fernando Henrique Cardoso teve um desfecho favorável aos tucanos dez anos depois, quando o juiz da 17ª Vara Federal de Brasília, Moacir Ferreira Ramos, absolveu na semana passada seus integrantes de terem privilegiado o Banco Opportunity e outras empresas no leilão da venda da Telebrás, que ocorreu em 1998.
O processo fora movido pelo Ministério Público a pedido, entre outros, do mesmo senador Aluizio Mercadante e do presidente do PT, Ricardo Berzoini,
O próprio juiz pergunta em sua sentença por que o PT, tendo chegado ao poder, não tratou de investigar e punir os eventuais culpados, sugerindo que as denúncias que ele desqualificou eram apenas manobras políticas sem consistência.
Lembrei-me de uma conversa que tive com a ministra Dilma Rousseff tempos atrás, relatada aqui na coluna, quando ela admitia que o PT na oposição fora radical e levara em conta mais seus interesses políticos, mas reclamava que a oposição está repetindo esse comportamento, o que considerava inexplicável no PSDB.
Segundo ela, o PT não tinha experiência de governo e, depois de Lula, nunca mais os petistas fariam uma oposição naqueles moldes. Dilma cobrava é que um partido que já esteve à frente do governo federal, como o PSDB, não poderia se comportar com o radicalismo do "antigo PT", porque de outro modo "isso não terá fim, e é ruim para o país".
Ela dizia ter esperança de que, superada a campanha eleitoral sem radicalizações, PT e PSDB possam encontrar alguns pontos comuns num futuro programa de governo.
No recente encontro em que se pronunciaram sobre a crise econômica, tanto a ministra Dilma Rousseff, hoje já identificada como a candidata em potencial do PT à sucessão de Lula, e o governador de São Paulo, José Serra, o favorito nas pesquisas eleitorais e provável candidato à Presidência da República pelo PSDB defenderam posições semelhantes para a superação da crise econômica: menos juros e mais investimentos.
Trataram-se cordialmente, num prenúncio do que poderá vir a ser o debate eleitoral em 2010.
Para chegar até lá, porém, os dois terão que superar obstáculos internos, e nesse aspecto a ministra Dilma está mais tranquila que o governador José Serra.
Na definição do presidente Lula, Dilma é a melhor candidata, para ganhar ou para perder, definição maravilhosamente cínica de sua própria escolha: se ganhar, ganhou Lula. Se perder, perdeu a Dilma.
Mas ela ainda pode ser atropelada dentro do PT se não se mostrar viável eleitoralmente. Já Serra tem pela frente uma disputa nada fácil com o governador de Minas, Aécio Neves.
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