O GLOBO - 28/01/12
O Fórum Econômico Mundial chega ao fim aqui em Davos com um saldo bastante favorável. Pela primeira vez nos últimos anos, desde que a crise econômica se acentuou no final de 2008, não se viam debates tão objetivos e resultados tão eloquentes quanto os desta edição.
O pessimismo com que está sendo visto o futuro da Europa se transformou em esperança de que passos concretos serão dados nos próximos dias e meses, como a assinatura do acordo de convergência fiscal que deve ser assinado no final do mês.
O presidente do Banco Central Europeu, Mario Draghi, classificou esse acordo como fundamental para restaurar a credibilidade da União Europeia, e acentuou que até meses atrás nenhum país se dispunha a abrir mão de sua soberania para aceitar regras fiscais comuns.
O acordo a ser assinado seria o primeiro passo para um programa fiscal único na União Europeia, com uma supervisão acima dos estados nacionais.
O presidente do BCE fez esse diagnóstico momentos depois de uma sessão que reuniu ministros da área econômica da zona do euro, que também passaram uma mensagem esperançosa com o futuro que está sendo negociado.
O acordo de convergência fiscal foi considerado por eles como um passo essencial para restaurar a confiança em suas economias em apuros.
"Estamos reconstruindo a estrutura econômica da Europa", comemorou o Comissário Europeu para Assuntos Econômicos e Monetários, Olli Rehn, acrescentando que para tal há a necessidade de um acordo fiscal comum.
Já o ministro dos Negócios Econômicos e Competitividade da Espanha, Luis de Guindos Jurado, ressaltou que a palavra chave a esta altura é "prevenção", e todos estão empenhados em prevenir uma crise fiscal e desequilíbrios externos que aconteceram no passado, com um tremendo custo humano, salientou, referindo-se ao desemprego em taxas alarmantes, especialmente entre os jovens, e sobretudo na Espanha.
Para o ministro espanhol, o passo vital para restituir a confiança na Europa é o quadro institucional que vier a ser adotado, e o compromisso dos países de cumpri-lo.
O ministro Guindos Jurado garantiu que já há um consenso na Europa de que é preciso evitar os erros cometidos no passado.
Mas ficou claro durante o debate que ainda existem muitas divergências em medidas importantes que teriam que ser tomadas, como, por exemplo, a adoção da proteção (firewall) para países como Itália e Espanha, para prevenir a disseminação do pânico no caso de uma situação sair do controle.
Com relação ao lançamento de Eurobonds, a dificuldade é que a Europa precisa criar primeiro uma estrutura fiscal comum, como salientou o ministro das Finanças da Alemanha, Wolfgang Schäuble.
Os ministros econômicos concordaram que a reestruturação da dívida da Grécia, o grande problema atual, está bem encaminhada, e todos se manifestaram otimistas quanto a um resultado positivo.
Schäuble chegou mesmo a dizer que não acreditava que a Grécia pudesse quebrar, sendo apoiado pelo Comissário Rehn, que concordou que o acordo grego com seus credores está perto de ser fechado.
François Baroin, ministro da Economia, Finanças e Indústria da França, ressaltou que a decisão do Banco Central Europeu de garantir fundos ilimitados para os empréstimos foi um esforço muito bem-vindo para ajudar a combater a crise.
Como o BCE é percebido como um órgão independente, ressaltou Baroin, a garantia por três anos reduziu consideravelmente as tensões no sistema bancário europeu, e ajudará na recuperação da confiança.
Já tratando o assunto como resolvido, o ministro francês disse que agora a Europa tem que pensar em como voltar a crescer. O ministro espanhol Guindos concordou, lembrando que a liquidez não é a cura final dos problemas, mas apenas uma ajuda importante.
A cura final virá com crescimento e mais empregos, ressaltou, refletindo a preocupação com a taxa altíssima de desemprego em seu país.
Vários painéis foram realizados para discutir o futuro da Europa, tanto do lado prático quanto do lado psicológico.
A necessidade de um forte corte nos gastos é ponto pacífico entre os debatedores, mas também há o consenso sobre o papel desse aperto fiscal: ele não ajudará os países da zona do euro a crescer.
Uma proposta surgida num dos painéis foi a de diminuir o tamanho do Estado, que pode chegar em alguns países a 50% do PIB.
Um corte em subsídios, especialmente na agricultura, poderia fornecer dinheiro para investimentos na infraestrutura, que além de modernizar os países geraria empregos imediatos.
Outra preocupação é com a inclusão da juventude no mercado de trabalho, e a educação técnica na França, ligada a grandes projetos, é um exemplo a ser seguido.
Mesmo com todas as dificuldades, não há consenso sobre a necessidade de reduzir o estado de bem-estar social.
É majoritária a ideia de que tudo pode continuar como está, com pequenos ajustes, inclusive porque as reformas do mercado de trabalho, ou ajustes no sistema de previdência, são temas politicamente delicados que devem ser tratados como metas de longo prazo.
No painel onde os aspectos subjetivos da crise europeia foram discutidos, houve um acordo sobre as consequências na identidade da região, questionando-se especialmente até que ponto sua história comum, valores compartilhados e conquistas recentes serão suficientes para manter a unidade do grupo.
Apesar de existir o receio de que a crise possa favorecer o surgimento de populismos divisionistas, o anseio maior é de que a Europa continue sendo um exemplo de democracia, capaz de oferecer um modelo social alternativo.