Foram muitas mudanças ao mesmo tempo nesta eleição histórica, além do fato de que um negro estar a ponto de se tornar presidente dos Estados Unidos apenas 44 anos depois que a legislação dos direitos civis iguais permitiu aos negros votar. O presidente Lindon Johnson assinou em 1964 a lei dos direitos civis iguais na votação, na educação, nas acomodações públicas, na associação a sindicatos e no acesso a programas federais de assistência social, que tem repercussões até hoje nos estados do Sul do país, com apoio maciço aos republicanos, uma rejeição aos democratas que começou a mudar nesta eleição.
A começar pelo comparecimento maciço do eleitorado, passando pela previsão de que haveria a manutenção da maioria democrata no Congresso, fato que daria ao candidato Barack Obama uma extraordinária vantagem neste momento de crise econômica.
Mesmo que o candidato republicano John McCain tenha se esforçado em denunciar os supostos perigos de dar o poder total ao mesmo partido - que elegeria o presidente e teria a maioria ampla da Câmara e do Senado -, tudo indica que esse será o quadro final.
O comparecimento, num país em que a votação não é obrigatória, dá a medida do interesse despertado pela presença de Barack Obama na disputa, que entusiasmou jovens e minorias, que historicamente comparecem pouco para votar.
A previsão é de que haverá um comparecimento de 64% do eleitorado, o que equivaleria a um total de 136 milhões de eleitores, 13 milhões a mais do que a eleição de 2004, que reelegeu George W. Bush. Só uma eleição teve maior comparecimento: a de 1908, que elegeu o republicano William Taft, quando o comparecimento foi de 65,7%.
Outra eleição muito concorrida foi a de 1960, em que John Kennedy derrotou Richard Nixon, quando 63,8% dos eleitores registrados exerceram o direito ao voto. Segundo o International Institute for Democracy and Electoral Assistance, nas oito eleições presidenciais dos Estados Unidos, entre 1972 e 2000, o comparecimento médio ficou entre 50% e 55%.
Os institutos de pesquisa de opinião este ano utilizaram uma média de comparecimento de 60%, no pressuposto de que haveria maior interesse, mas nenhum considerou a possibilidade de um comparecimento próximo de 65%.
O movimento para alistamento de eleitores, que mobilizou milhares de voluntários da campanha de Obama durante quase um ano, fez também com que alguns estados mudassem de tendência política, juntamente com uma evolução natural do desenvolvimento de algumas regiões.Virgínia, por exemplo, deixou de ser um estado rural para se urbanizar.
Quanto à política de pesos e contrapesos, uma característica dos Estados Unidos, a crise econômica parece ter dado aos democratas um vigor a mais, além da tendência natural que já se manifestara desde as eleições de 2006.
Desde então os democratas tomaram conta da maioria do Congresso com uma política eleitoral populista que privilegiou a classe média. Com o país claramente dividido, o atual presidente George W. Bush foi eleito pela primeira vez em 2000 com um resultado polêmico na Flórida, e o Congresso ficou também dividido, com uma pequena margem a favor dos republicanos na Câmara: 220 a 211.
Com os ataques terroristas de 2001, o governo Bush conseguiu uma maioria confortável na eleição parlamentar de 2002 e na reeleição de 2004, mas dois anos depois, com a deterioração não apenas da economia, mas também com o desgaste político da guerra do Iraque, os republicanos perderam a maioria do Congresso que mantinham há 12 anos, desde 1994 no governo Clinton.
Foi a pior eleição para a Câmara dos republicanos desde 1982: os democratas ficaram com uma bancada de 235 deputados contra 199 republicanos. No Senado, a diferença foi menor: 51 senadores democratas contra 49 republicanos, sendo que dois dos democratas tornaram-se independentes, mas dão freqüentemente a maioria aos democratas.
Com a renovação de um terço do Senado e a totalidade da Câmara na eleição de ontem, a perspectiva era de que os democratas ampliassem sua vantagem a ponto de atingir no Senado o número mágico de 60 cadeiras, o que possibilita ao partido impedir as obstruções da oposição.
A importância de deter a maioria, com o controle das comissões, ficou clara quando a crise financeira estourou, em meados de setembro, e o presidente Bush precisou aprovar medidas que dependiam do Congresso. O secretário do Tesouro, Henry Paulson, e Ben Bernanke, o presidente do Fed, tiveram que negociar especialmente com os democratas, e foi devido ao apoio deles que o projeto da Casa Branca, depois de muito modificado, foi aprovado.