O GLOBO
O mercado americano, em crise, tem o tamanho de 12 milhões de carros. É isto que anima a Fiat, que, por causa da crise, virou acionista da Chrysler e entrou nos Estados Unidos. Se der certo, ela terá 51% da Chrysler. O presidente da Fiat no Brasil, Cledorvino Belini, diz que, aqui, o mercado voltou a acelerar e fecha o primeiro quadrimestre com o mesmo número de carros vendidos que no mesmo período de 2008.
Belini contou que o acordo com a Chrysler permitirá à Fiat entrar no mercado americano com uma plataforma de produtos compactos, com motores econômicos e flex. Ao mesmo tempo, a italiana poderá voltar ao mercado com o Alfa Romeo.
A Chrysler entrou em concordata com grande chance de recuperação, porque já negociou previamente com os grandes credores e com os trabalhadores. Agora, negociará judicialmente com os pequenos credores. O novo conselho da empresa terá três representantes da Fiat, um do governo canadense, um dos trabalhadores e quatro do governo americano. Ou seja, mais governo que setor privado. A Fiat, quando completar a transferência de tecnologia, aumentará sua participação para 35% da Chrysler e poderá, entre 2012 e 2016, comprar os outros 16% e chegar a 51% do capital. Belini admite que o mercado americano é um dos que mais sofre neste momento, mas diz que a empresa está animada de entrar nos EUA. “Mesmo rodando menos, é um grande mercado. Era um mercado de 15 milhões de carros e, agora, é de 12 milhões, mas ainda são 12 milhões!”
O mercado americano, viciado em SUVs e trucks, vai se acostumar com carros pequenos? Ele acha que sim. “É uma mudança de comportamento. Aquele tempo dos carros grandes passou. O mundo vive agora uma nova realidade.”
Na entrevista que me concedeu na Globonews, o presidente brasileiro da Fiat disse que a redução do IPI, decidida pelo governo, foi fundamental para que o setor se recuperasse por aqui. “O Brasil tinha uma média diária de vendas de 11,5 mil veículos em setembro, caiu em novembro para 8,5 mil, queda de 36%, e agora em março fechou em 11,8 mil. Vamos fechar o quadrimestre com o mesmo número de carros vendidos que no mesmo período do ano passado”, diz Belini.
Ele acha que há uma chance de 2009 terminar também com empate. Em 2008 foram 2,754 milhões de automóveis e comerciais leves vendidos no Brasil, e este ano pode terminar entre 2,5 milhões e 2,7 milhões. Mas, ele repete: isso “se o IPI continuar reduzido”.
Belini contesta a afirmação de que a renúncia fiscal é privilégio dado a um setor apenas. Ele empilha os números que a indústria automobilística apresenta como sendo o seu peso na economia. Diz que representa 22% do PIB industrial. Nessa conta entra todo o aço produzido para o setor automobilístico, todos os outros fornecedores, toda a rede de revendedores. Tudo o que a indústria gira. “O setor, visto assim de forma integrada, emprega 1,3 milhão de pessoas, fatura R$ 150 bilhões e recolhe R$ 33 milhões de impostos. Por isso é que teve a prioridade do governo, mas não temos privilégios. Outros setores estão tendo também queda de impostos.”
Ele argumenta que o governo recolheu mais do que deixou de receber. O aumento das vendas elevou a arrecadação do PIS/ Cofins, ICMS e IPVA.
Belini conta que o mercado americano deve terminar o ano com queda 40%; a Europa também. Os governos europeus estão dando subsídios diretos de até 4 mil euros para a compra do carro novo dentro do programa de renovação de frota. E isso está reanimando o setor. Nos outros países, a Índia não vai muito bem, a Rússia está péssima, outros países da América Latina estão com quedas de 20%, e no México vai piorar. O Brasil está caminhando para a estabilização e a China vai muito bem. “No mês passado, a China vendeu 1,08 milhão de carros. Em parte pelo incentivo do governo, que deu uma redução do imposto deles. Inicialmente para carro 1.0 e depois para carro até 1.6.”
O executivo disse que isso não o surpreende, porque está dentro das previsões de que a China e o Brasil se recuperariam mais rapidamente que os mercados americano e europeu, que sentem a crise de forma mais forte. “No conjunto, o mundo ainda está mal, mas alguns países saíram na frente.”
No médio prazo, a expectativa dele é de aumento do mercado brasileiro. “O Brasil ainda tem pouco carro em termos de densidade por habitante. Para chegar ao nível que está a Argentina hoje, o Brasil teria que ter 8 milhões de veículos a mais. Por isso nós não mudamos nosso plano de investir US$ 5 bilhões no Brasil até o fim de 2010”, diz Belini.
A estrada treme para a indústria automobilística do mundo, particularmente nos EUA e na Europa. Ainda não se sabe como a GM sairá da crise, a Chrysler entrou em concordata, a Ford tenta manter a decisão de não precisar de dinheiro do governo. As japonesas, como a gigante Toyota, têm dado prejuízo. Esta crise tem dois epicentros: o mercado bancário e a indústria automobilística. Da perspectiva da Fiat, pode ser uma chance de entrar no mercado americano. Tudo depende de como o acordo anunciado na quinta-feira vai evoluir.