Política
MIRIAM LEITÃO Mudar os juros
O Banco Central deveria mudar sua política de juros, interrompendo o ciclo de alta, diante do agravamento da crise. Ontem, ao fim de mais um dia tenso, o clima começou a melhorar. O BC vendeu dólar físico e liberou mais compulsório. Além disso, algumas exportadoras começaram a negociar com bancos a liquidação das opções de câmbio. Lá fora, a ação conjunta dos BCs começa a surtir efeito.
As empresas exportadoras encalacradas com futuro de câmbio começaram a negociar com os bancos para fazer uma liquidação compulsória. A dívida delas com o derivativo começou a ficar tão alta que algumas empresas procuraram escritório de advocacia para contestar judicialmente os contratos. “Algumas cláusulas são leoninas”, disse um exportador. Quanto mais o dólar subia, mais as empresas tinham que depositar margem, mais compravam dólar, mais faziam a moeda subir e maior era o prejuízo. Os bancos que operam com esse ativo poderiam simplesmente ficar sem receber e, além disso, enfrentar uma contestação judicial. Um banqueiro me confirmou a negociação.
— Cada banco cuida do seu cliente, mesmo porque não tem outra alternativa. O risco era não receber.
As duas partes estariam começando a negociar. Nos casos em que estas opções foram vendidas a terceiros, os bancos estão financiando as empresas. De qualquer maneira, essa operação está bastante disseminada.
Não será tão simples acabar com o problema.
Outro banqueiro me informou que as empresas brasileiras aumentaram muito a exposição ao dólar nos últimos cinco anos, e não apenas as exportadoras, mas também as que têm qualquer atividade no exterior e as que têm competidores estrangeiros. Há rumores em relação às grandes empresas mineradoras e às da área siderúrgica. A Vale negou que tivesse problemas nessa área. A Votorantim informou que fez operações de opção de dólar nos últimos meses, mas garantiu que “a exposição, após um conjunto de operações programadas, foi totalmente eliminada na data de hoje” (ontem).
O Banco Central mudou de atitude novamente e passou a vender dólar físico, ajudando a acalmar o mercado de câmbio. Ele tem mostrado agilidade nos últimos dias, depois de ter ficado algum tempo prisioneiro daquela análise equivocada feita no governo brasileiro, de que a crise não chegaria aqui. Chegou, tem um capítulo só nosso nessa confusão cambial e exigia atitude do BC. Mas ainda que ele esteja mais ativo, um problema continua grave: a falta absoluta de linhas para o fechamento de contratos de câmbio.
Outro problema que começa a ser resolvido é das dificuldades dos bancos pequenos por não estarem tendo acesso ao interbancário.
O presidente do Banco do Brasil, Antonio Francisco de Lima Neto, negou que tivesse comprado ontem carteira de consignado por imposição do governo.
— Fazemos porque é uma oportunidade. Nós temos liderança em crédito consignado, nossa participação no mercado é de 19%, com R$ 11 bilhões, e compramos mais R$ 900 milhões. É um produto padronizado, com baixo risco, e nós do Banco do Brasil queremos crescer em crédito à pessoa física urbana.
Mesmo que se resolvam estes problemas, o dinheiro continua sem circular. O problema é comum ao Brasil e ao mundo: mesmo quando o Banco Central injeta dinheiro, ele fica nos bancos.
O crédito não circula.
A economia continua a funcionar por crédito liberado antes. Eu conversei com pessoas ligadas a três grandes empresas de varejo. Em uma delas, as vendas continuam, mas é um grupo com vendas diversificadas, inclusive muito eletroeletrônico; em outra, especializada em ramo mole, as vendas estão piores do que no ano passado e, na terceira, estão em queda. A economia real começa a sentir o tranco da liquidez. Os juros estão crescendo fortemente.
Os últimos dados já superados — porque eles têm subido diariamente — são de taxas de 137% ao ano para empréstimos à pessoa física e 66% no crédito às pessoas jurídicas.
No mercado financeiro, a volatilidade intensa mostra que ainda se está longe da normalidade. O dólar chega a variar, entre quedas e altas, dez por cento; ontem a Bovespa oscilou 3.000 pontos entre quedas e altas.
Vários economistas com quem a coluna entrou em contato acham que o mercado continuará ao sabor das notícias de cada dia.
O BC enfrentará agora o dilema da sua política de juros.
No mundo, os juros estão em queda e ontem o corte coordenado dos maiores países do mundo confirma que essa é a tendência. Mas o BC brasileiro está no meio de um “ciclo de aperto de política monetária”. Ele continuará subindo os juros, mesmo com a queda das taxas no mundo, com a inflação cedendo no Brasil e com a economia reduzindo o ritmo? Mas há também impacto inflacionário da alta do câmbio.
O Bradesco acha que o BC deveria apenas aumentar mais 0,25 ponto percentual e encerrar a elevação. Nílson Teixeira, do CSFB, acha que os juros deveriam parar de subir já na próxima reunião, mesmo que venham a subir depois, caso haja elevação da inflação. Thomas Málaga, do BBA, acha que os juros deveriam parar de subir, ou até cair um pouco diante do novo quadro econômico brasileiro, de restrição de crédito, e novo quadro internacional, de forte desaceleração.
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