Política
Miriam Leitão Alavanca ou peso
O GLOBOO mundo vive um dilema, segundo o Nobel de economia Joseph Stiglitz: para que os países voltem a crescer, eles dependem bastante da ajuda dos consumidores norte-americanos. Para que o planeta sobreviva, ele não pode mais comportar consumidores vorazes. “Sabemos que, em algum momento, sairemos da crise; mas não é fácil reverter as consequências do aquecimento global”, diz Stiglitz.
O ex-economista-chefe e ex-vice-presidente do Banco Mundial esteve no Rio para uma palestra na Conferência da Latin American Studies Association (LASA). O encontro foi na PUC. Durante quatro dias, pesquisadores das mais variadas áreas — da literatura à ciência política, passando por antropologia, saúde, economia, violência, migração — discutiram temas ligados à região. O assunto central deste ano: as desigualdades. A constatação é que a atual turbulência econômica internacional piora o problema porque também distribui desigualmente os ônus da crise.
Foi sobre a crise que Stiglitz veio falar. Antes da palestra, ele conversou com Débora Thomé, do blog Notícias das Américas, do site do GLOBO, e Mariana Borges Martins da Silva, jovem cientista política, que escreveu esses dias para o blog.
Elas relatam aqui, algumas partes dessa conversa.
O economista tem a seu favor o fato de que não está fazendo engenharia de obra pronta, ele sempre alertou que era preciso construir regulação eficiente para que a globalização financeira não fosse um processo caótico.
Hoje, depois que o colapso de fato aconteceu, ele avalia que os remédios que estão sendo usados para resolver a crise são insuficientes. Ele acredita que as medidas que estão sendo tomadas são como band-aids, têm superficial efeito curativo e não vão ao cerne do problema. Mais que isso: algumas delas aumentam os riscos. A concentração bancária, por exemplo, pode levar a mais distorções. Segundo Stiglitz se bancos são “grandes demais para quebrar”, como se diz, “também são grandes demais para serem gerenciados ou salvos”.
— A visão de muitos é de que essa crise foi um acidente, de que o sistema funciona bem; não acreditam que haja problemas na forma como o sistema funciona.
Aliás, diversas pessoas que estão tentando resolver o problema são as mesmas que fizeram um sistema tão desregulamentado. Eles minimizam a magnitude da crise — critica.
Stiglitz faz parte do grupo de economistas que tem se esforçado cada vez mais para incluir a variável climática nas equações econômicas. O caso mais importante dessa transição foi o economista, já entrevistado neste espaço, sir Nicholas Stern. Stiglitz acha que a falha dos atuais pacotes de estímulo à economia, em vários países, é que não levam em conta a questão climática. Os que levam, não o fazem de maneira suficiente. Ele é a favor de se aumentar o custo da emissão de carbono.
O economista não acredita que isso prejudicaria países como o Brasil — que tem reagido à adoção de metas de redução de emissão de carbono. Acha que é preciso desenhar um programa eficiente e que premie a preservação de florestas. Também se poderia estabelecer a transferência de tecnologia energética para países em desenvolvimento: — Nos últimos anos, o desmatamento no Brasil e na Indonésia anulou todo o esforço que a Europa fez para reduzir as emissões de carbono. É preciso fazer algo.
Em um acordo ambiental mais justo, o Brasil, por exemplo, poderia receber compensações por proteger suas florestas.
Este será um ano importante na discussão, por causa da reunião de Copenhague, no final do ano, que deve ser um passo adiante na busca de um acordo do clima. O ponto levantado por Stiglitz sobre o desmatamento é crucial para entender a posição do Brasil, cujo governo prefere continuar repetindo a conversa de que os outros desmataram primeiro.
O dilema a que ele se refere sobre o consumo americano é central nesta confluência entre crise econômica e aquecimento global.
Do ponto de vista econômico, todos torcem para que os americanos aumentem o consumo. Do ponto de vista ambiental, é mais sensato que eles mudem o padrão de gastos. O ideal é mesmo o caminho de mudar a forma de produção nos Estados Unidos e no mundo para a redução das emissões do processo produtivo.
Outro ponto levantado por Stiglitz é uma de suas obsessões: a democratização das instituições multilaterais econômicas. Na opinião dele, FMI e Bird poderiam ser mais democráticos, aumentando a relevância e o poder decisório de países em desenvolvimento.
Neste momento, por exemplo, os emergentes poderiam ter um papel mais importante no que diz respeito à coordenação monetária.
As reformas que estão sendo feitas são lentas demais diante das urgências da crise, disse ele. Stiglitz lembrou que um grande avanço ocorreu já no último encontro do G-20, no qual se estabeleceu que o critério para a nomeação dos presidentes do Banco Mundial e FMI será a qualificação para o cargo.
Até agora, a escolha dos ocupantes sempre foi um jogo de carga marcada: um americano e um europeu. Ele até conta quem que gostaria que o tivesse substituído no banco quando saiu: o brasileiro Armínio Fraga.
Com Alvaro Gribel
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