O ataque às agências Celso Ming
Política

O ataque às agências Celso Ming


O Estado de S. Paulo - 07/07/2011
 


As autoridades da área do euro abriram fogo ontem contra as agências de classificação de risco depois que a Moody"s, a mais importante delas, rebaixou em quatro níveis os títulos de dívida de Portugal, para a área de lixo (junk bonds) ou de grau especulativo.

A Moody"s adverte os credores de que, a despeito do forte plano de austeridade que vem sendo colocado em prática, a ameaça de um calote do tesouro de Portugal aumentou. E o resultado pode ser a autorrealização do veredicto, ainda que possa estar errado. Nas últimas três semanas, a Standard & Poor"s e a Fitch também rebaixaram a dívida da Grécia.

O presidente da Comissão Europeia, o português José Manuel Durão Barroso, criticou duramente a Moody"s por "criar especulação em vez de clarificar o mercado" e chegou a insinuar que, americanas, as agências jogam contra a Europa. O ministro das Finanças da Alemanha, Wolfgang Schäuble, acrescentou que a influência das agências de classificação de risco precisa ser limitada. E o ministro das Relações Exteriores da Grécia, Stavros Lambrinidis, lembrou que, "ao longo da crise, as agências vêm tomando decisões malucas".

Não dá para negar. Essas agências vêm apresentando comportamento desastroso. Não foram capazes de prever a crise da Enron, em 2001. E atribuíram nota máxima a armações financeiras dos bancos dos Estados Unidos que, ao longo do estouro do subprime, em 2007 e 2008, foram considerados "lixo tóxico". O mesmo feito com títulos a prazo do Lehman Brothers, pouco antes de ele afundar.

Essas e outras lambanças rebaixaram o respeito que o mercado financeiro tinha pela atuação dessas agências e levantaram, nos quatro pontos cardeais, graves questionamentos sobre a que interesses, afinal, vêm servindo.

A Europa se parece hoje com o Titanic navegando a toda velocidade em direção de imenso iceberg. Vamos lá: 99% dos analistas sérios vêm advertindo que não há como armar a equação das dívidas da Grécia - e, talvez também de Portugal. Não há receitas à frente capazes de garantir o resgate desse passivo. Foi essa, por exemplo, a conclusão que o mais respeitado analista econômico da Europa, Martim Wolf, repetiu ontem no Financial Times, de Londres. Isso significa que um grande pedaço dessas dívidas tende, quase inexoravelmente, a ser caloteado e está a exigir um programa de reestruturação (corte da dívida) que inspire um mínimo de credibilidade.

Enquanto isso, as autoridades da Europa se dedicam a um enorme jogo de faz de conta ou, como diz o economista Nouriel Roubini, "estão chutando lata ladeira abaixo". Trabalham como se os títulos de dívida de Grécia e Portugal tivessem a mesma credibilidade dos bônus da Alemanha. E, para ganhar tempo - sabe-se lá até quando -, fingem que estão armando um esquema de resgate, em que ninguém acredita.

Nessas condições, as agências ou apontam o que todos estão vendo ou serão, mais uma vez, acusadas de não terem cumprido seu dever de acusar a verdadeira qualidade dos títulos.

Enfim, se não forem elas (Moody"s, Standard & Poor"s e Fitch), alguém terá de se encarregar de fazer esse trabalho. Exigir que as agências façam o jogo dos dirigentes, quando eles estão sendo fortemente questionados, é outro equívoco, provavelmente maior do que aquele que os políticos estão denunciando.

CONFIRA

A decisão da Moody"s produziu certo efeito contágio. Derrubou o valor das dívidas de Espanha, Grécia e Irlanda. A seguir, mais críticas disparadas ontem contra as agências de rating:

Cartel
"As agências constituem um cartel opaco e sumamente poderoso" - Claudi Pérez, comentarista do El País, diário de Madri.

Questionamento
"Este é um episódio lamentável e levanta a questão da propriedade do comportamento dessas agências" - Amadeu Altafaj, porta-voz da Comissão Europeia.

Classificação imoral
"A alteração da Moody"s é imoral e insultuosa" - Fernando Faria de Oliveira, presidente da Caixa Geral de Depósitos de Portugal.

Atingiu
"Foi o mais certeiro tiro no navio Portugal da frota europeia, em meio à guerra entre o dólar e o euro" - Ricardo Salgado, presidente do Banco Espírito Santo.




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