Até mesmo na área do governo o debate até há pouco intensamente estimulado pelas autoridades sobre as vantagens da exploração do petróleo da camada de pré-sal começa a ser pautado pela realidade. Ainda há poucos dias, membros do governo prenunciavam para o futuro próximo a transformação do Brasil num dos maiores produtores de petróleo do mundo e falavam com entusiasmo sobre a destinação que dariam ao dinheiro que seria obtido com a exploração do petróleo do pré-sal. Lenta e relutantemente, o governo vai tendo uma noção mais precisa da amplitude da crise global e dos seus efeitos sobre os grandiosos projetos oficiais. A Petrobrás, que adiara o anúncio, de setembro para dezembro, de seu plano de investimentos para o período de 2009 a 2013 - a empresa atualiza anualmente o seu orçamento qüinqüenal -, já admite que terá de diluir seus gastos num prazo mais longo, talvez até 2020.
O plano deve incluir os investimentos nas áreas de pré-sal. São muitas as dificuldades que precisam ser enfrentadas para colocar em operação comercialmente viável as reservas localizadas sob a camada de sal, que se encontra vários quilômetros abaixo do nível do mar. Complexos são também os cálculos dos custos financeiros da inédita exploração do petróleo nessas condições.
A crise global dificultou ainda mais o que já era difícil, pois reduziu a disponibilidade de capitais no mundo e provocou grandes oscilações no preço do petróleo. O plano da Petrobrás em vigor prevê investimentos de US$ 112 bilhões entre 2008 e 2012, dos quais US$ 104 bilhões com recursos próprios. Os novos projetos de refinarias e de exploração do Campo de Tupi elevam os investimentos desse período para US$ 163 bilhões. A inclusão das aplicações necessárias para o desenvolvimento das reservas do pré-sal onerará ainda mais a nova versão do plano de investimentos.
Nos últimos anos, as empresas petrolíferas tiveram de aumentar muito os investimentos em pesquisa e exploração, porque os novos campos estão em áreas mais difíceis de ser exploradas e os custos de aluguel e compra de equipamentos de perfuração subiram. Em julho, o presidente da Petrobrás, José Sérgio Gabrielli, disse que os custos de exploração dificilmente cairiam no futuro, razão pela qual o mundo deveria se acostumar a conviver com os preços altos do petróleo.
Mas, além de ter dificultado enormemente a captação de recursos no exterior - em sua última captação, a Petrobrás pagou 5,875% ao ano; atualmente, não se capta por custo inferior a 10% ao ano, e os valores oferecidos são bem menores -, com a crise o preço do barril de petróleo despencou. Em julho, chegou a ser negociado a US$ 147; nessa semana, chegou a US$ 63.
Governos cujos orçamentos dependem do petróleo - como o de Hugo Chávez, da Venezuela, onde o petróleo responde por mais de 90% das receitas com exportações e por cerca de metade da arrecadação tributária - começam a enfrentar sérias dificuldades por causa da queda do preço do produto. Empresas que programaram investimentos e projetaram seus rendimentos com base em cotações altas estão refazendo seus planos.
Na semana passada, Gabrielli admitiu que, com o petróleo a US$ 70 o barril, os produtores considerados marginais, que entraram no mercado atraídos por preços muito altos, começam a se afastar. Não é esse, garantiu, o caso da Petrobrás, que não teria seus planos prejudicados com a cotação do óleo nesse nível. O plano de investimentos, de acordo com a direção da empresa, é balizado pela cotação a US$ 35 o barril - preço de produção, incluídos custos de financiamento, não de venda.
Esse pode ser um valor que viabiliza os planos da empresa para sua operação nas condições já conhecidas. Mas qual é a cotação mínima que permite à Petrobrás explorar, em condições econômicas e financeiras viáveis para seus acionistas e para o País, a camada de pré-sal, cujas dificuldades e custos são desconhecidos? Os estudos sobre custos e viabilidade da exploração da camada de pré-sal feitos até agora por empresas privadas partem do valor mínimo de US$ 70 o barril.
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