A economia dá sinais de reagir aos primeiros estímulos tributários do governo, que já aceita um superávit primário menor. Vai poupar menos e investir mais, transferindo receita para o setor privado que ainda vacila. O PIB no segundo trimestre de 0,4% foi maior que o anterior, de apenas 0,1%, e pode continuar crescendo nos próximos meses porque o governo decidiu poupar menos em época de crise e investir mais.
É sem dúvida um início da recuperação após dois trimestres perdidos. Não se escapa de um crescimento menor que 2% este ano, mas se o governo e o BC intensificarem as medidas anticíclicas, há condições para que o PIB cresça até mais de 3% em 2013.
Vai dar? Sim. O governo dá sinais cada vez mais claros de ter renunciado ao superávit primário de 3%. O BC aponta para mais um corte de 0,25 ponto porcentual este ano na Selic e há financiamentos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) a juros reais negativos. Nos próximos dias, virá mais uma série benefícios fiscais e tributários beneficiando praticamente todos os setores, mesmo os já atendidos, além da dedução dos impostos altíssimos sobre energia elétrica. Deve vir também mais desonerações da folha de pagamento para quase todos o setores industriais e se anuncia ainda isenção do PIS e do Cofins para os produtos da cesta básica.
E isso apesar de as desonerações já concedidas este ano terem representado uma renúncia de receita de R$ 40 bilhões, de acordo com o Ministério da Fazenda. Não é pouco. São quase 29% do superávit primário previsto para este ano.
Os limites do governo. Mas até onde o governo pode intensificar essa política sem pôr em risco o equilíbrio das contas publicas? A pedido da coluna, o economista Felipe Queiroz, da Austin Rating, fez uma avaliação cuidadosa dos vários cenários e conclui, com base em dados atuais e do passado, que há espaço, sim, para reduzir o superávit primário e intensificar os estímulos tributários.
O que diz a Austin."Acredito que, no atual contexto econômico o não cumprimento da meta de superávit primário não prejudica a evolução das finanças públicas. Sempre que há crise há deterioração tanto da atividade econômica como das expectativas dos agentes. Isso foi observado nitidamente no final de 2008, e houve enxugamento do crédito (bancos privados), os investimentos travaram e a demanda agregada encolheu. Para se evitar um ciclo vicioso ao longo de 2009, o governo reduziu o IPI, ampliou (com recursos próprios) o crédito via bancos públicos, investimentos, medidas que refletiram no resultado primário."
Foi tão ruim? Não porque saímos da recessão e a economia voltou a crescer. "Em 2009, o PIB caiu 0,3%, e o resultado primário foi de apenas 2,0%, o menor da série histórica. Mas, nos dois anos seguintes, a economia cresceu 7,5% e 2,7%, respectivamente com superávit primário de 2,7% (2010) e 3,1% (2011)", lembra o economista da Austin Rating.
E agora? Neste ano, o cenário é semelhante ao de 2009. Será muito difícil para o setor público cumprir integralmente a meta de superávit primário. "Nós, na Austin Rating, acreditamos que a economia vai crescer apenas 1,7% e o resultado primário será de 2,3% do PIB. O governo vem adotando diversas medidas para conter os efeitos da crise na zona do euro, o que tem afetado diretamente a sua receita. No entanto, mesmo que a meta fiscal não seja cumprida integralmente neste ano, isso não compromete a evolução das contas públicas, pois, a exemplo do passado, o País deve voltar a crescer em taxas maiores a partir de 2013 e, assim, retornar ao equilíbrio no resultado primário."
É ir em frente. O Brasil criou condições especiais para pode agir em meio à crise. Espaço fiscal, juros ainda elevados, inflação sob controle, desemprego recorde, um mercado interno vigoroso e uma equipe econômica consciente dos desafios. É ir em frente e enterrar no passado o 1,7% deste ano.