Uma coisa parece certa: no dia em que a família de Passos Coelho fizer a tal festa para comemorar o facto do seu rapaz se ter visto livre disto, não estará com certeza sozinha. É muito provável que o país inteiro se junte à comemoração. Não porque alguém possa gostar do cenário de um país sem Governo numa altura destas, mas porque é hoje indiscutível que o presente Executivo falhou em todas as frentes. O país está mais pobre, com mais desempregados, com menos Estado Social, com uma economia despedaçada e com cada vez menor capacidade de saldar a dívida. Resta-nos a reputação internacional de cócoras, que continua a animar Vitor Gaspar e provavelmente os dois ou três seguidores que lhe restam.
De qualquer modo, apesar de ser evidente para todos que a receita não está a resultar, o que leva uma ainda tão grande fatia do eleitorado a não pedir eleições antecipadas? O que está a faltar? Simplificando ao extremo, neste quadrante teremos com certeza aqueles que acham que temos de intensificar a receita ainda mais (com certeza em clara minoria). Temos também aqueles que deixaram de acreditar em qualquer solução, sendo portanto facilmente permeáveis ao discurso da “culpa é dos políticos”. E temos aqueles que não acreditam no caminho seguido, mas que têm manifestas dúvidas sobre a existência de uma alternativa (a maioria). E é naturalmente esta última fatia que tem de ser conquistada por todos os que advogam a queda deste Governo.
Antes de mais, com o argumento básico de que “pior é difícil”. Ou seja, podemos não gostar da queda de um Governo após dois anos de mandato, podemos também não gostar do país partir para eleições no momento atual, mas é hoje claro de que a primeira prioridade deve ser parar a atual política. Podemos continuar a acelerar alegremente para a parede, ou podemos desde já parar o rumo seguido, sob pena da situação continuar a agravar-se cada vez mais. Por outro lado, uma vez que o argumento acima por si só continuará a não convencer os mais descrentes, importa continuar a demonstrar que a alternativa económica existe. Que existe vida para além da abordagem austeritária, que outras políticas podem e devem ser prosseguidas para salvar economicamente o país.
No entanto, é a solução governativa que se espera que suceda a este Executivo que maiores dúvidas gera nesta camada de indecisos. Para quê mudar se o que se segue - um Governo PS - seguirá uma abordagem igual ou muito semelhante? Para quê o sobressalto da mudança se não existir mudança de todo? Para isso, pensam eles, mais vale continuar o caminho seguido. Eis o grande dilema que, por mais que evitemos falar nele, a esquerda tem de procurar resolver. E todos os esforços neste sentido devem continuar e intensificar-se até.
Queremos a festa do pai de Passos Coelho? Claro que queremos! Vamos a isso. Mas dificilmente valerá a pena se se virar o disco e tocar o mesmo. Disso podemos ter a certeza.
Artigo publicado sexta-feira na Esquerda