19/07/2012 |
Enquanto a Espanha estiver na zona de risco, o rompimento da união monetária europeia continuará sendo uma possibilidade tangível. Os títulos soberanos do país continuam pagando taxas insustentáveis a longo prazo, mesmo após sucessivas decisões dos líderes da zona do euro para atenuá-las. O agravamento da crise pode ter acelerado o calendário de reuniões de cúpula, mas não as soluções para enfrentá-la. Em junho, os líderes europeus pareciam ter dado um passo efetivo para combater a crise na Espanha e a de outros países em situação crítica, como a Itália, ao concordarem em princípio com o uso do Mecanismo de Estabilização Financeira para capitalizar diretamente os bancos espanhóis e com a compra de títulos soberanos por parte do Banco Central Europeu (BCE). O que foi visto como significativa concessão da Alemanha não passou até agora de uma miragem. A capitalização aprovada de € 100 bilhões aos bancos espanhóis ainda irá demorar. Ela está condicionada à criação de instituições que darão forma à união bancária aprovada em tese pelos líderes, com boa parte da supervisão a cargo do BCE. Dificilmente isso ocorrerá antes do início de 2013 e até lá muita coisa de ruim pode acontecer. As declarações da premiê Angela Merkel após o encontro deixaram claro que a Alemanha, Finlândia e outros países do norte da Europa relutam em aceitar um sistema de garantias e resgate comuns, pelos mesmos motivos que não aceitam endossar a criação dos eurobônus. Correntistas dos bancos alemães, que estão em melhor situação financeira que os espanhóis, por exemplo, teriam de vir em socorro de bancos mal administrados de outros países. Da mesma forma, os alemães não aceitam ter de pagar parte da conta da irresponsabilidade do governo grego. O apoio da população alemã ao euro, segundo pesquisas, é baixo e a ideia de evitar a qualquer custo o colapso da união monetária é impopular. Além da tergiversação política dos líderes da zona do euro, um sinal de divergências profundas, a uniformidade das receitas até agora usadas para debelar a crise cobra um preço alto da Espanha. Ao contrário de outros países que adotam o euro, sua dívida pública antes da atual crise não era alta, sequer atingia o limite de 60% do PIB estabelecido pela união monetária. Ainda agora, está ao redor dos 70% e é inferior à da Alemanha. Mas sua dívida privada é a maior da zona do euro, com exceção da Irlanda. Boa parte dela é decorrência da bolha imobiliária que minou a saúde financeira da maior parte dos bancos espanhóis. Segundo cálculos do FMI, o setor da construção deve algo como 10% do PIB às instituições financeiras, e o setor imobiliário, a fábula de 30% do PIB. Ambos os setores operaram muito alavancados. Do lado das famílias, a dívida média consome 104% da renda. Com isso, os remédios para a Espanha indicados pelos líderes europeus têm tudo para dar errado. Diante da forte desalavancagem do setor privado, o governo teria de gastar mais para sustentar a economia. Mas não é isso que está sendo exigido dele. O governo conservador de Mariano Rajoy se comprometeu, após a indicação de ajuda aos bancos espanhóis, com um pacote de economia de € 65 bilhões que agravará ainda mais a recessão espanhola. O pacote inclui aumento de 18% para 21% do imposto sobre consumo (IVA), corte de 50% no seguro para desempregados e redução em toda linha de gastos sociais e dos salários do funcionalismo. A demanda doméstica cairá em 2012 algo como 4% do PIB. O desemprego está em 24% e pode crescer com o aprofundamento da recessão e do saneamento do setor imobiliário e bancário, que não terminou. Pelos cálculos do FMI, para que a Espanha volte a ter em 2016 o nível de desemprego pré-crise, precisaria crescer 4,5% ao ano. A previsão do Fundo é de que avance apenas 0,5% ao ano até lá. Houve um alívio nas metas fiscais do país. A Espanha não precisará atingir déficit de 3% do PIB em 2013, e sim em 2014. O déficit de 8,5% do PIB em 2011 cairá a 6,3% neste ano, quando o alvo acordado era de 5,3%. O prazo precisaria ser bem maior para um esforço de cortes e aumento de receita de 5,5% do PIB e a política precisaria ser contracíclica, com aumento de gastos públicos para relançar a economia. A Espanha caminha para longa estagnação, com crise política à vista. Se quebrar, não haverá dinheiro suficiente para resgatá-la. Pouca coisa mudou para o país até agora e os juros cobrados de seus títulos se apoiam nessa constatação prática. |