RIO - Técnicos em engenharia elétrica e especialistas não acreditaram nas explicações do governo federal, de que o mau tempo teria provocado o blecaute que ocorreu na noite da última terça-feira atingindo 18 estados , entre os quais São Paulo e Rio de Janeiro. Técnicos ouvidos pelo GLOBO não descartaram a possibilidade ter ocorrido uma falha humana na operação do sistema.
O professor de Engenharia Elétrica da Coppe/UFRJ Carlos Manuel Portela, considerado um dos maiores especialistas em linhas de transmissão no Brasil, acha difícil um número grande de descargas elétricas ter se concentrado em um período pequeno em uma região, atingindo as três linhas de transmissão de Itaipu. Portela disse ter estudado com profundidade blecautes de grande porte ocorridos em outros países, que sempre registraram como um dos motivos a falha humana.
- Não pode ter sido um raio que derrubou as três linhas quase que ao mesmo tempo. Em todos os blecautes importantes ocorridos no mundo, houve bobagem humana - afirmou Portela.
Diretor do CBIE defende tecnologias mais inteligentesPara o professor, o sistema elétrico brasileiro é moderno e usa as tecnologias mais modernas do mundo. Segundo Portela, por mais avançados e automáticos que sejam os equipamentos, por mais inteligentes, sempre é fundamental a participação do ser humano.
O diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), Adriano Pires Rodrigues, também não acredita nas explicações oficiais. Ele afirmou que é preciso investir em novas tecnologias, mais inteligentes, para aumentar a segurança do sistema. Por outro lado, segundo Adriano Pires, houve uma falha na gestão do sistema elétrico. Isso porque, explicou, a operação do sistema deve levar em conta a confiabilidade do sistema e a modicidade tarifária. Ele disse ainda que o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), ao planejar a operação, parece estar preocupado somente com os menores custos.
- Por que concentrar uma geração tão elevada apenas em Itaipu? Por que não se acionou em escala menor alguma termelétrica? Porque eles estão levando em conta apenas custos menores de operação - destacou Pires.
Segundo o executivo do CBIE, um sistema de energia como o do Brasil não pode cair por causa de um fenômeno atmosférico. Se a causa for essa, é fundamental o país investir mais em novas tecnologias mais inteligentes. Adriano Pires citou o caso da Smart Grid, que já está sendo usada em alguns países. Esse é um sistema de geração inteligente quase individual. Com ele, um consumidor pode ter sua geração própria de energia, que automaticamente pode entrar na rede ou não, dependendo das oscilações dos custos de energia.
- Hoje o autoprodutor gera energia mas joga na rede interligada, o que o deixa vulnerável em caso de blecaute no sistema. O Smart Grid é uma geração individual de energia - explicou Adriano Pires.
'Não acredito que foi um raio', diz engenheiro
O engenheiro elétrico Clayton Vabo também não acredita que problemas atmosféricos tenham provocado o blecaute. Ele não descarta a possibilidade de alguma falha humana na operação do sistema.
- Não dá para entender o que aconteceu. Todos nós estamos muito apreensivos. Se houve falha nos equipamentos, deveria ter ocorrido uma recuperação mais rápida - disse Vabo.
Para o engenheiro, se for comprovado que houve falhas, será necessário o setor desenvolver e adotar novos sistemas de redundância para evitar um novo blecaute dessas proporções:
- Tem um mistério muito grande. Não acredito que foi um raio. Pode ter sido uma manobra errada, uma falha humana.
Na quarta-feira, em entrevista ao GLOBO, o diretor da Coppe/UFRJ, Luiz Pinguelli Rosa, levantou a hipótese de um erro de computador ou de decisão humana.