O Estado de S. Paulo - 06/10/2011 |
Os europeus estão reclamando. O Brasil começa a adotar um política comercial protecionista! Foi uma espécie de resposta às criticas da presidente às políticas fiscais restritivas que estão levando a União Europeia à beira da recessão; um risco crescente que agora até mesmo o FMI admite como o mais provável. Não deixa de ser estranha a reação europeia porque nos primeiros oito meses do ano as exportações da União Europeia para o Brasil aumentaram 28,2% sobre igual período do ano anterior. Foram US$ 30,2 bilhões, o que representa 21,2% de que tudo o que o Brasil importou. O bloco da União Europeia suplantou os Estados Unidos e é o nosso segundo mais exportador. Perde apenas para a Ásia, leia-se China e os países pelos quais passam suas vendas para o Brasil. Mas tem superávit! É esse o argumento. Nos oito primeiros meses do ano, o Brasil registra um superávit de US$ 5,15 bilhões, quase o dobro de igual período do ano passado, quando o saldo foi de US$2,28 bilhões. Apesar da desaceleração econômica, o Brasil exportou mais para a Europa do que importou. Por isso não tem nada que falar em "proteger" sua indústria. Uma análise dos números do comércio bilateral, divulgados esta semana pelo Ministério do Desenvolvimento, mostra que não é bem isso. A realidade é outra. A Europa ainda está importando muito, sim, mas commodities que incluem semimanufaturados e que representam 66,6% das exportações totais para o bloco. Enquanto isso, 99,7% - sim quase 100%! - do que importou da União Europeia foi de produtos industrializados. Eles estão errados ao importar matérias-primas e exportar produtos acabados para o Brasil? Não. Quem está errado somos nós, que estamos primarizando a pauta das exportações. As matérias-primas representaram nada menos que 63,6% das exportações brasileiras. Mas saímos da crise! Isso permitiu aumentar a receita das exportações porque os preços das commodities permanecem elevados. Mas é temerário continuar se acomodando e acreditando nesse cenário porque as cotações das commodities ainda estão em alta, mas recuaram em setembro. O acompanhamento que a equipe do Economist Inteligente Unit realiza semanalmente confirma essa tendência. Os preços das commodities agrícolas, por exemplo, ainda registram aumento de 11,4%, mas em setembro registraram uma queda significativa de 10,7%. Industriais, que incluem nafta, metais, 11,2%. As empresas de análise desse mercado são unanimes ao prever que essa tendência de baixa deve continuar ainda no próximo ano. É hora de mudar. Como? A impressão atual é que o governo tem apenas uma decisão, defender o mercado. A presidente já optou por medidas programáticas no comércio exterior, que deem resultado a curto prazo, acordos bilaterais, mas tudo parece ainda meio vago, com o Ministério da Fazenda acertando nas suas sugestões mais ousadas, mas encontrando obstáculos no governo para concretizá-las. A impressão dominante é que o resultado das exportações das commodities vem tirando o sentido de urgência para dar incentivos à industria nacional, que estagna, quando não recua. O correspondente do Estado em Genebra, Jamil Chade, informa que o governo estuda uma nova estratégia para as exportações, deixando de lado Doha, que já morreu há muito tempo e só o Brasil, ingênuo e teimoso, acreditava nela. A sonhada liberalização comercial defendida pela OMC morreu antes de nascer. O governo está certo ao defender regras próprias de comércio, mas isso é um passo apenas inicial e isolado de um projeto de comércio exterior que ainda não existe e se anuncia agora. A economia mundial está em crise e ninguém acredita mais na liberalização comercial. O Brasil deu os primeiros passos para se enquadrar nesse novo cenário. Todos estão se defendendo. Obama criou uma "força-tarefa" para proteger o mercado americano e aumentar as exportações, o que já está dando algum resultado. Mas vai ser mais agressivo, pois o déficit comercial dos Estados Unidos ainda é de US$ 706 bilhões. |