Já são três os milionários que se suicidaram
Política

Já são três os milionários que se suicidaram


O suicida bilionário

Desde os anos 30, acadêmicos estudam a conexão
entre crises financeiras e suicídios. A morte de
Adolf Merckle, o 94º homem mais rico do mundo,
só aprofunda o desafio


Benedito Sverberi

Fotos Reuters e Daniel Maurer/AP


FIM DA LINHA
Merckle e o trem em Ulm, no sul da Alemanha: dívidas de 20 bilhões de dólares

Relatos coloridos da "quinta-feira negra", como ficou conhecido o crash da bolsa em 24 de outubro de 1929, deram início à fábula segundo a qual investidores falidos saltavam às dezenas de arranha-céus. O próprio Winston Churchill contribuiu para o mito. O então futuro primeiro-ministro britânico, que se encontrava em Nova York no momento da quebradeira geral, disse no Daily Telegraph, em dezembro de 1929, que viu um homem se jogar do 15º andar. "O pobre coitado se espatifou em pedacinhos", relatou. Na verdade, apesar da miríade de relatos impressionistas, somente dois investidores se mataram em Wall Street nos últimos meses de 1929. Os estudiosos identificaram apenas uma leve alta no número de suicídios entre 1930 e 1931. Apesar da falta de corroboração estatística, uma possível conexão entre crise econômica e suicídio sempre vem à baila quando as bolsas despencam. E ganha força quando acompanhada de suicídios de investidores notórios.

Na terça-feira passada, o empresário alemão Adolf Merckle, de 74 anos, dono de um conglomerado com faturamento anual de 40 bilhões de dólares, foi encontrado morto ao lado de uma linha de trem na cidade de Ulm, no sul da Alemanha. Ele era o 94º homem mais rico do mundo, segundo o ranking da revista Forbes. Em um breve comunicado divulgado à imprensa, a família informou tratar-se de um suicídio motivado por dificuldades financeiras. Merckle teria se jogado na frente do trem. Nos últimos meses de 2008, o alemão tentou obter um empréstimo emergencial de 540 milhões de dólares para cobrir as perdas milionárias causadas por operações malfeitas no mercado de capitais. O grupo que ele presidia, que reúne fábricas de cimento e remédios, apostara na queda das ações da Volkswagen. Mas os papéis da montadora alemã dispararam mais de 200% no fim de outubro. Ironicamente, dois dias após o falecimento de Merckle, a transação com os bancos foi aprovada, pavimentando a re-estruturação de suas empresas.

O suicídio de Merckle foi o segundo a ser diretamente relacionado à crise econômica desde a quebra do banco de investimentos americano Lehman Brothers, em setembro. No dia 23 de dezembro, o investidor francês Thierry Magon de la Villehuchet, de 65 anos, foi encontrado morto em Nova York, com os pulsos cortados e comprimidos a seu lado. La Villehuchet administrava o fundo Access International Advisors, que havia perdido 1,5 bilhão de dólares na pirâmide financeira construída pelo financista Bernard L. Madoff. Diante do agravamento da crise, a diretora-geral da Organização Mundial de Saúde (OMS), Margaret Chan, alertou para o impacto psicológico do problema. "Existem evidências claras de que o suicídio está relacionado a desastres financeiros", afirmou. O professor da Faculdade de Psicologia da PUC-SP Ari Rehfeld explica que o tipo de transtorno sentido por quem já tem muito dinheiro e influência possui um diferencial. Segundo ele, os prejuízos financeiros em si não são a causa preponderante dos suicídios nesse caso. O problema maior seriam a perda de status e a rejeição dos pares. "Os investidores ficam presos no passado, e, se não elaboram a perda, torna-se difícil encarar os desafios que vêm pela frente."




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