Política
Meta estourada - CELSO MING
O Estado de S.Paulo - 07/05/11
Embora tenha vindo algo mais suave do que esperavam os mais pessimistas, já em abril a inflação medida em 12 meses pelo IPCA estourou a meta expandida (4,5% de meta central mais os 2 pontos porcentuais de tolerância).
É a principal consequência, a um só tempo, da disparada das despesas públicas e da criação artificial de renda no último ano da era Lula; e da enorme tolerância à alta de preços manifestada neste início de governo Dilma e pela atual administração do Banco Central.
As consequências estão aí: aumento das incertezas em relação ao comportamento futuro da economia; elevação de custos que se segue ao desarranjo dos preços re3lativos; perda de patrimônio e de renda pela classe média e pelas classes mais baixas; e forte movimento de reindexação da economia.
Mas as principais consequências serão políticas. As perdas de poder aquisitivo começarão a ser percebidas pela população. A oposição, que permanecia atarantada e sem discurso, agora, graças à falta de pulso do governo em relação à inflação, começa a ser ouvida e volta a ter condições de reorganizar seu jogo.
O governo dá mostras de vacilação. O discurso oficial se resumia a dar "toda prioridade ao contra-ataque à inflação, mas sem matar a galinha dos ovos de ouro". Ou seja, até agora o governo fingia que pretendia enfrentar a alta de preços, mas, na prática, queria mesmo manter o crescimento econômico, mesmo numa situação de forte escassez de mão de obra.
As últimas manifestações das autoridades da área econômica mostraram paralisia e apelos voluntaristas, típicos dos velhos tempos. O ministro Guido Mantega, durante reunião do Grupo de Avanço da Competitividade na quarta-feira, pediu para que os empresários evitassem repassar a alta dos custos para os preços. Só faltou acrescentar: "Não remarquem os preços pelo amor de Deus". No dia seguinte, perante a Comissão Mista do Orçamento, no Congresso, o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, fez um apelo de conteúdo equivalente: "Se [O BRASILEIRO][O BRASILEIRO][O BRASILEIRO](o brasileiro) quiser adiar o consumo presente para consumir mais à frente, este é o momento de fazê-lo".
Mês passado, o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, reclamava, em tom de denúncia, que o Banco Central estava abandonando seu empenho a reverter a valorização do real para adotar uma espécie de âncora cambial, que aceita a derrubada da cotação do dólar para conter a inflação.
São manifestações que refletem insegurança em relação à estratégia adotada. A proposta de abandonar o combate à inflação no curto prazo e concentrar os esforços para que a convergência ao centro da meta só aconteça ao final de 2012 baseia-se em pressupostos de alto risco: (1) o de que a alta das commodities se reverterá espontaneamente e, também espontaneamente, controlará a inflação; (2) que o enfoque gradualista é mais eficiente para estancar a disparada dos preços do que ações cirúrgicas, feitas de uma vez; e (3) que a enorme batalha sindical que se concentra agora no período de inflação mais alta não exercerá nenhum impacto relevante na inflação ao longo dos próximos meses. (Este será o tema da Coluna de amanhã.)
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