Giuliano Guandalini
Fotos Sergio Neves/AE, Nilton Fukuda/AE e Lailson Santos |
2010 ENTRA NO RADAR Meirelles, que deverá deixar o BC para ser candidato, e os presidenciáveis Dilma e Serra: disputa eleitoral insufla especulações no mercado financeiro |
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• Quadro: O mercado contra o mercado |
O próximo presidente brasileiro só será conhecido daqui a quinze meses, mas o calor da disputa eleitoral já é detectado pelos radares do mercado financeiro. As dúvidas quanto à política econômica que será seguida pelo próximo governo passaram a fazer parte dos fatores que são levados em conta no momento em que os investidores tomam suas decisões. Esse efeito pode ser notado, particularmente, no mercado de juros futuros. Nas últimas semanas, esses contratos financeiros, um tipo de derivativo financeiro negociado na Bolsa de Mercadorias e Futuros (BM&F), começaram a refletir a perspectiva de uma acentuada elevação dos juros a partir de meados de 2010. Entre os motivos apontados para explicar a aposta na alta está o risco de que o novo governo seja mais tolerante com a inflação. Ainda que ninguém espere uma ruptura profunda da política macroeconômica, a sucessão presidencial trouxe já um grau de incerteza sobre a linha a ser seguida pelo próximo governo.
Os dois presidenciáveis com mais chance de ganhar a eleição neste momento – o tucano José Serra, governador de São Paulo, e a petista Dilma Rousseff, ministra da Casa Civil – são críticos do que consideram excesso de rigor do Banco Central. Eles ainda não expressaram que política de juros seguiriam caso se elegessem. Outro fator que tem sido ponderado pelos agentes do mercado é a quase certa saída do presidente do BC, Henrique Meirelles. Ele deverá deixar o cargo em março para disputar algum cargo eletivo – o Senado ou o governo de Goiás, provavelmente, ou até mesmo a Presidência da República, opção que ele insiste em não descartar. Como a credibilidade da condução da economia brasileira se escora hoje, em grande medida, na elogiada atuação de Meirelles, sua substituição produz interrogações. Teme-se, por exemplo, que seu sucessor trabalhe para eleger o candidato do governo, em vez de exercer o mandato de maneira independente. Afirma Sérgio Vale, economista-chefe da consultoria MB Associados: "Não sabemos o que fará o próximo presidente, nem quem substituirá Meirelles. Tudo isso é uma incógnita que impede que se consiga estimar com tanta clareza qual será a taxa de juros no fim do ano que vem". Incerteza, em economia, representa risco – e risco maior significa juros mais elevados lá na frente.
O movimento de alta nos juros futuros vem ocorrendo em contraposição ao que ocorre com as taxas no presente. Na semana passada, o Banco Central fez um novo corte na taxa básica, a Selic, reduzindo-a para 8,75% ao ano. Mesmo com a economia do país já dando sinais de retomada, a autoridade monetária optou pela diminuição da taxa porque considera que ainda existe ociosidade nas indústrias e, por isso, não vê riscos de que a inflação fique acima da meta nem neste ano nem em 2010. A taxa chamada de "real" (isto é, descontada a inflação esperada) é hoje de 4,4% ao ano – a mais baixa de que se tem registro. De acordo com os analistas econômicos, há possibilidade de que os juros permaneçam nos atuais patamares por um bom tempo. É essa a avaliação expressa pela última edição do Boletim Focus, uma compilação semanal feita pelo BC a partir das estimativas de 100 instituições financeiras e consultorias que atuam no mercado financeiro. De acordo com essa pesquisa, a Selic ficaria inalterada até julho de 2010 e só então ocorreria um ligeiro aumento. Esse levantamento, curiosamente, é incongruente com a perspectiva expressa pelos juros futuros (veja quadro), que projetam uma elevação expressiva da Selic. Ou seja, o mercado está fazendo apostas em dois cenários opostos: o da estabilidade e o da flexibilização da política econômica no futuro acima da margem de segurança. Para os apostadores do primeiro grupo, o ciclo de descompressão de juros iniciado pelo BC em janeiro chegou ao fim e a Selic voltará a subir em 2010. Para os do segundo grupo, a valorização do real, o aumento sustentado do grau de otimismo dos consumidores e as expectativas de queda da inflação podem permitir cortes da taxa. Quem está certo, o mercado ou o mercado? A resposta será conhecida apenas no próximo ano. Mas a disputa eleitoral – com justiça ou por mera especulação – já começou no mercado financeiro.