O risco da explosão dos gastos públicos
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O risco da explosão dos gastos públicos





O GLOBO

O risco da explosão dos gastos públicos

Próximo presidente, seja quem for, terá herança preocupante devido à elevação de despesas


Regina Alvarez
BRASÍLIA

O próximo presidente da República tem motivos para se preocupar, seja qual for a sua filiação partidária. Na visão de economistas ouvidos pelo GLOBO, a expansão dos gastos correntes no segundo mandato do governo Lula, combinada com a retração da economia pós-crise global, deixará como herança para o próximo governo um quadro fiscal muito difícil, com Orçamento engessado por compromissos assumidos pelo governo atual, sem espaço para ampliar os investimentos em infraestrutura e com risco real de desordenamento das contas públicas.

O economista Geraldo Biasoto Jr, professor da Unicamp e diretor-executivo da Fundação do Desenvolvimento Administrativo (Fundap), ligada ao governo de São Paulo, contabilizou, em estudo recente, as despesas já contratadas pelo atual governo que terão impacto no Orçamento de 2010, chegando a um resultado surpreendente.

Por esses cálculos, o superávit fiscal de R$ 71,4 bilhões nas contas públicas do governo federal em 2008 evoluirá para um déficit de R$ 2,1 bilhões no ano que vem.

Esse cálculo inclui os reajustes concedidos ao funcionalismo no ano passado — que terão impacto no Orçamento até 2012 — mais o custo fiscal de decisões do governo na área social, como a expansão do programa Bolsa Família; na área de educação; e a política adotada para o reajuste do salário mínimo, com ganhos reais cumulativos até 2023.

Em 2010, o Bolsa Família atenderá 13 milhões de famílias; hoje são pouco mais de 11 milhões. Além de ampliar o número de beneficiados, o governo aumentou o valor pago e também a renda per capita daqueles que poderão ser atendidos pelo programa.

Na área social, mais R$ 20 bilhões

Só o impacto das decisões na área social resultará num acréscimo de R$ 20,2 bilhões ao custeio da máquina governamental em 2010, estima o economista, sem considerar os gastos com pessoal. Nesse caso, o crescimento líquido das despesas é de R$ 31,1 bilhões, na comparação de 2008 com 2010, já descontada a contribuição previdenciária dos servidores, que não tem impacto sobre o déficit público.

“Os dois movimentos — aumento dos gastos com pessoal e na área social — apontam para a fixação do gasto corrente do governo em um patamar muito superior ao vigente durante a década. Essa ampliação do gasto federal vinha sendo facilitada pelo comportamento das receitas de tributos e contribuições (...)”, diz o estudo.

— A partir da crise, as condições de sustentação das novas obrigações federais podem significar danos de grande monta à sustentabilidade da política fiscal — prevê Biasoto.

Essa opinião é compartilhada pelo economista Alexandre Marinis, sócio da consultoria Mosaico Economia Política, que acompanha as contas públicas. Ele alerta para as armadilhas que a atual política fiscal representa para o próximo governo.

— Tenho pena do próximo presidente que administrará as contas públicas.

Seja quem for, terá de desarmar várias bombas-relógio montadas pelo governo atual — afirma. — Não há como sustentar o aumento dos gastos com a economia desacelerada. A dificuldade de gestão de caixa será substancial, e a rigidez do Orçamento muito maior para gerar investimentos.

A professora Margarida Gutierrez, do Instituto Coppead de Administração da UFRJ, considera que a grande herança ruim que será deixada para o próximo governo é um orçamento muito mais rígido, sem espaço para a ampliação dos investimentos, já que muitas das despesas apresentadas pelo governo como anticíclicas para combater a crise são permanentes, como os gastos com pessoal.

— Política anticíclica não se faz com gasto obrigatório. O próximo presidente vai ter um problema bem grande para resolver. O Orçamento dos próximos anos está engessado com gastos obrigatórios. Muito melhor seria se tivéssemos aumentado os investimentos. Haveria repercussão na cadeia de produção e não apenas num setor. Os efeitos são muito maiores, o estímulo muito maior — afirma Margarida.

Na visão da economista, o padrão de gasto do governo é muito ruim e piorou mais este ano.

— O governo concentrou a política fiscal anticíclica em aumentos de salários e benefícios. A sociedade paga impostos, e o governo gasta com pessoal. Isso é muito diferente do que seria a função do governo de provedor de serviços de uso coletivo, como saúde, educação, investimentos em infraestrutura.

O economista Raul Velloso, especialista em contas públicas, também está pessimista em relação ao futuro da política fiscal. Ele prevê um aumento da dívida em relação ao PIB, que se manteria no próximo mandato, a despeito da queda dos juros. E também critica a política anticíclica baseada em gastos de pessoal e custeio.

— É a irresponsabilidade fiscal sob o manto da política anticíclica.

A conta maior será transferida para o próximo governante, seja ele quem for — afirma Velloso.

“Tenho pena do próximo presidente que administrará as contas públicas. Seja quem for, terá de desarmar várias bombas-relógio montadas pelo governo atual Alexandre Marinis, economista

Em todos os cenários, a dívida volta a cair

Secretário de Política Econômica nega risco fiscal e aposta em recuperação da economia


BRASÍLIA. A equipe econômica não assina embaixo das previsões pessimistas para a área fiscal em 2010 e tem argumentos para justificar a atual política de elevação dos gastos públicos. O secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa, afirma que a herança que este governo deixará para o próximo é uma queda de dez pontos percentuais na dívida em relação ao Produto Interno Bruto (PIB), queda na taxa real de juros, no déficit nominal e uma rede de proteção social, além de uma agenda de investimentos. O governo trabalha com uma previsão de recuperação da economia em 2010 e crescimento entre 4% e 4,5%.


— Na opinião dos mercados, não há risco fiscal no curto prazo. Em todos os cenários, a dívida volta a cair em 2010, e o resultado nominal também será menor — afirma.


Barbosa rebate as críticas de que faltam investimentos e os gastos estão concentrados na área de custeio.


— Há um papel maior do Estado na promoção do investimento e como agente de bem estar social. Este governo deixa para o sucessor uma agenda de investimentos. Podem criticar o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) pelo ritmo das obras, mas não há dúvida de que o governo resgatou a política de investimentos como prioridade da política fiscal. Um longo levantamento foi feito para identificar uma carteira de projetos que poderão ser realizados pelo próximo governo.


Na visão do secretário, também são equivocadas as críticas ao aumento da carga tributária, quando não se menciona que essa carga retorna para a sociedade em forma de transferência de renda.


— Fala-se muito da carga tributária bruta, mas o que volta para a sociedade é ignorado pela maior parte dos analistas, e isso é crucial para analisar a política fiscal em qualquer momento — afirma Barbosa.


O secretário compara a evolução das receitas e despesas do governo, destacando que as transferências de renda — benefícios previdenciários, abono e seguro desemprego, benefícios assistenciais e Bolsa Família — aumentaram dois pontos percentuais entre 2002 e 2009, passando de 6,89% para 8,9%. E destaca que o aumento da receita primária também cresceu dois pontos no período: de 17,86% do PIB para 18,89%.


— Em estados democráticos é normal o papel do Estado como redistribuidor de renda para reduzir a desigualdade — pondera.


Barbosa reconhece, por outro lado, que ainda persistem problemas na área fiscal que não foram resolvidos e podem ser transferidos ao próximo governo. Ele cita o déficit da Previdência e a falta de uma política de médio e longo prazo para os gastos com pessoal.


— Essa questão da Previdência e um aperfeiçoamento da política de gerenciamento da folha de pagamentos são pontos não resolvidos e representam 76% do gasto do governo.


Mas já há um encaminhamento deste governo para equacionar esses dois problemas. Os projetos estão no Congresso — afirma.






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