Anos e anos de trocas mútuas de favores entre governo e setor
produtivo esconderam dos brasileiros a dura verdade de que a indústria
brasileira não é competitiva.
No passado, sempre que foi preciso dar um empurrão, o governo tratou
de fornecer "mais câmbio" (aumentava as cotações do dólar), para que o
produto nacional ficasse mais barato em dólares. E, ao longo dos anos,
inúmeros casos de perda de força foram tratados com medidas
protecionistas convenientemente rotuladas de "política industrial". E
isso foi tudo ou quase tudo.
A queda acentuada na participação da indústria no PIB (de 30%, em
1980; para perto de 17%, em 2011); a derrubada das exportações de
manufaturados (de 57%, em 1998; para 36%, em 2011); mais do que isso,
a redução de volume (quantum) de manufaturados exportados e a perda de
espaço nesse quesito em âmbito mundial (veja no gráfico); e a forte
entrada de produtos industrializados - demonstram sobejamente que a
indústria brasileira não é competitiva.
O governo Dilma ainda reage ao que entende como processo de
desindustrialização com medidas cosméticas. Dá certa isenção
tributária a alguns setores (como está fazendo agora com a linha
branca); reforça o protecionismo na indústria de veículos, no setor
têxtil e nos brinquedos; providencia alguma reserva de mercado, como
também acontece com o setor automotivo; engana com tentativas de
acirramento da defesa comercial; e, naturalmente, tenta provocar
desvalorização cambial, nem sempre com sucesso.
Medidas protecionistas e mobilizações de defesa comercial, mesmo
quando competentemente conduzidas, podem, no máximo, elevar em alguma
coisa as vendas internas, mas não revertem a situação perdedora no
mercado externo.
Ainda se veem reações irrealistas no governo e em dirigentes da
indústria. São segmentos que ainda adotam o diagnóstico equivocado de
que a "má fase" ou mesmo a "perda de competitividade" se devem
unicamente à forte valorização do real, que encarece também
excessivamente o produto brasileiro em dólares. Essa gente ainda
insiste em remédios que atacam os sintomas, não as causas do problema.
Primeiramente, é preciso reconhecer com todas as letras que, com raras
exceções, a indústria brasileira não tem competitividade. Ou, nos
termos do Ipea, "enfrenta sérios problemas sistêmicos de
competitividade". Insistir em jogar a culpa no jogo desleal dos
chineses, na guerra cambial provocada pelos países ricos ou nas
políticas protecionistas de algumas dezenas de países é tapar o sol
com a peneira e ignorar a natureza estrutural dessa encrenca.
O problema tampouco se encontra na má qualidade do gerenciamento nem
no câmbio insuficiente - embora sejam fatores que também concorrem
para isso em alguma proporção. As razões da baixa competitividade da
indústria se concentram no altíssimo custo Brasil. E isso - nunca é
demais repetir - tem a ver com impostos demais; juros extorsivos;
infraestrutura cara e ruim; altíssima tarifa de energia elétrica (a
quarta mais alta do mundo); custo de mão de obra elevado demais em
consequência do excesso de encargos; Justiça lenta e ineficiente;
excesso de burocracia...
Uma das instituições que lideram a Indústria, que vem dando o nome
certo à doença e que defende a terapia adequada é a Confederação
Nacional da Indústria (CNI). Infelizmente, essa recomendação
(necessidade de atacar corajosamente o custo Brasil) parece ter sido
prejudicada depois que se soube que atuais dirigentes da CNI pagaram
consultorias esquisitas ao atual ministro do Desenvolvimento, Fernando
Pimentel, antes que ele fizesse parte do governo Dilma.
Durante mais algum tempo, o governo federal vai tentar cuidar do
problema com remédios caseiros de sempre, especialmente com
distribuição de um chamego aqui, um "cala-boca" ali e novas exigências
de conteúdo local acolá. Difícil saber até quando será possível
prosseguir com esse jogo.
Como na história infantil, a ração vai diminuindo e, em vez de se
acostumar com redução da comida, o burro vai morrendo de fome.