PDilemas de Brasil e China - ALBERTO TAMER
Política

PDilemas de Brasil e China - ALBERTO TAMER



O Estado de S.Paulo - 12/08


E é a China, de novo, preocupando o mundo. E aqui, o dilema quase existencial da equipe econômica entre investir mais e economizar menos, superávit primário de 3,1% ou 2,8%.

Na China, a inflação que em junho estava em 2,2% recuou para 1,8% no último mês e a economia apresenta mais sinais de desaceleração. Inflação em queda é bom sinal, mas um recuo brusco de 5% para menos de 2% aponta para o caminho da deflação. Isso mostra que o mercado interno não está reagindo aos estímulos do governo. Os chineses não estão consumindo mais. Isso é agravado pelo forte recuo nas exportações - apenas mais 1% em julho, em grande contraste com 11% em igual mês do ano passado. A segunda maior economia mundial está importando, exportando menos e crescendo menos em um clima de inflação declinante apesar do aumento das commodities.

Vem reação. Tudo indica que o governo chinês vai reagir. Já cortou os juros em junho e julho, reduziu o compulsório dos bancos, tentando injetar liquidez no sistema com ajuda de inflação menor. Mas há ceticismo no mercado. Já fez isso antes, os bancos não ofereceram mais crédito porque não havia procura na bolha do mercado imobiliário. Resultado: a demanda interna aumentou apenas 4,7%, revelando um consumidor cauteloso.

Brasil e China. Os desafios que a China enfrenta hoje são semelhantes aos do Brasil: precisa estimular a demanda interna, cortar impostos, reduzir juros, oferecer mais crédito, estimular a produção via investimentos e consumo. Nos dois casos, não há riscos mais sérios de inflação, estável no Brasil em torno de 5%, e 1,8% na China, declinante. A diferença está nas dimensões dos mercados internos. Na China, representa entre 30% e 35% do PIB; aqui, 60%. Lá, são nada menos que 690 milhões de habitantes que vivem nos campos ainda por conquistar; aqui, grande parte dos 50 milhões das classes de menor poder aquisitivo já estão entrando no mercado. Eles vão demorar ainda para criar um mercado interno, que já está ocupado no Brasil.

Ser ou não ser... O dilema brasileiro é outro. O que o governo chinês tem de mais e nós de menos é o espaço fiscal. Eles possuem recursos quase infindáveis, reservas de US$ 3 trilhões e renda gerada pelas estatais que dominam a economia e dependem menos da receita interna para financiar investimentos. No Brasil, o governo vive no momento o drama shakespeariano de "ser ou não ser", economizar menos e investir mais para evitar a recessão que apontou no último trimestre, e manter o nível de emprego. Uma dúvida quase acadêmica que ganhou espaço na mídia esta semana.

Mais um ato. Por enquanto, parece que o dilema continua em Brasília. Após anunciar para o último dia 7 um pacote de grande estímulo para o setor privado, o governo o adiou por uma semana, mas ainda não é certo. A equipe econômica, preocupada, refaz as contas que não fecham com um superávit de 3,1%, a receita continua recuando devido ao menor lucro das empresas e as desonerações, o que deve se acentuar ainda mais nos próximos meses. Ao mesmo tempo, os últimos incentivos à indústria e a redução acentuada dos juros desde agosto do ano passado, com na China, não se refletiram sobre a atividade econômica. O PIB aponta menos de 2% e o emprego vacila.

O governo ainda hesita em reduzir impostos - algo em torno de R$ 30 bilhões, no mínimo - para estimular investimentos privados. Sabe que, sem isso, a economia cai para menos de 2% este ano - muitos analistas preveem 1,5% - mas sente que só tem espaço se reduzir o superávit primário, mesmo favorecido agora pelo juro menor.

Decisão discreta. Para os analistas de mercado, a impressão é que o governo já estaria seguindo a política de superávit primário menor, sem falar muito nisso. Por que? É, dizem eles, o que indicam os números oficiais divulgados em Brasília. Até junho, foram cumpridas apenas 47% da meta programada para este ano, em contraste com 61% em igual período do ano passado. A tendência se acentuou nos últimos dois meses.

Assim, dizem eles, ninguém acredita muito na meta do superávit primário de 3,1% este ano, mesmo porque há desonerações já anunciadas para a energia elétrica para outros setores industriais, além da folha de pagamento. A questão é a dosagem. Para a maioria, o superávit ficaria em 2,8% mesmo. Isso porque a receita do IPI que incide sobre automóveis recuou 73% com as exonerações feitas pelo governo, sem contar a reação à extensão de benefícios a outros setores.

E, assim, saem machucados, mas ninguém morre no fim da peça...



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