Suspense grego Editorial Estadão
Política

Suspense grego Editorial Estadão


26 de junho de 2011 | 0h 00


- O Estado de S.Paulo
A Grécia mantém o mundo em suspense, enquanto seu governo, enfrentando
protestos de rua e forte oposição política, tenta obter a aprovação de
novas medidas de aperto fiscal, em mais um esforço para evitar o
calote. Se o plano for aprovado no Parlamento, poderá ser liberada
mais uma fatia de 12 bilhões do pacote de auxílio de 110 bilhões
montado há pouco mais de um ano pela União Europeia e pelo Fundo
Monetário Internacional (FMI). Sem esse dinheiro o Tesouro grego será
incapaz de pagar as dívidas com vencimento em julho. O primeiro passo
para a adoção das novas medidas foi dado na terça-feira, quando o
primeiro-ministro, George Papandreou, obteve do Parlamento um voto de
confiança. Foram 155 votos favoráveis, 143 contrários e 2 abstenções.
Na quinta-feira foram acertados com o FMI e a União Europeia os
detalhes do plano. Faltaria ao governo conseguir o apoio político para
iniciar a nova fase do ajuste.

Se o esforço der certo, mais uma parcela da ajuda será liberada em
julho. Além disso, novo empréstimo, estimado em 120 bilhões, está em
discussão. O governo grego tem ao mesmo tempo negociado com a chamada
troica - FMI, União Europeia e Banco Central Europeu (BCE) - e
enfrentado a resistência da oposição e dos grupos mobilizados contra
os cortes do gasto e o aumento de impostos.

Para tornar o remédio menos amargo, o governo se dispôs a abandonar
certas medidas mais dolorosas, como o aumento da carga tributária
lançado sobre trabalhadores de baixa renda. A mudança desagradou aos
técnicos da troica. Mas o acordo alcançado na quinta-feira inclui
maiores impostos e maior contenção de despesas. O ajuste deve ser
suficiente para uma economia de 6,4 bilhões neste ano. Além disso,
está previsto um avanço nas privatizações.

O quadro seria muito mais simples, neste momento, se o grande problema
fosse a liquidação das contas com vencimento nos próximos meses, mas a
situação é muito mais grave. Mesmo com um grande aperto fiscal e com
todo o sacrifício imposto à população - o desemprego passou de 11,6%,
em março do ano passado, para 16,2%, neste ano -, será muito difícil o
governo grego pagar as dívidas sem uma reestruturação. Algum tipo de
calote ainda é altamente provável.

Essa opinião é obviamente partilhada pelo governo da maior economia
europeia, a Alemanha, embora nenhuma autoridade europeia admita
abertamente o risco. A primeira-ministra Angela Merkel tem liderado um
esforço político para envolver os bancos no socorro à Grécia. A
participação seria voluntária. Os banqueiros aceitariam rolar a dívida
e facilitar seu pagamento, talvez incorrendo em alguma perda. Nesse
caso, talvez o acerto seja visto, tecnicamente, como algo diferente de
um calote. O detalhe é importante, porque os próprios bancos são
sujeitos à avaliação de risco.

Um calote atabalhoado, argumentam os defensores de uma reestruturação
"voluntária", seria desastroso para o sistema financeiro e para os
demais países com dívida pública elevada. Portugal e Irlanda, já
envolvidos em programas financiados pela União Europeia e pelo FMI,
poderiam enfrentar novos problemas.

Nem a maior potência econômica ficaria ilesa, no caso de um calote
grego. Quem o afirma é Ben Bernanke, presidente do Federal Reserve
(Fed, o banco central americano). "O impacto nos Estados Unidos",
segundo ele, "seria significativo." O choque seria indireto, porque os
bancos americanos têm negócios importantes com bancos europeus
diretamente expostos ao risco da dívida grega. Mas poderia, segundo
Bernanke, tornar ainda mais lenta a recuperação do país.

O FMI e o BCE têm rejeitado toda insinuação a respeito de uma
reestruturação da dívida grega. O BCE tem um motivo especialmente
forte, porque detém uma carteira de títulos de alto risco, acumulados
durante operações de ajuda a governos. Um calote afetaria o valor
desses papéis.

A dívida pública da Grécia está estimada em 157,1% do PIB neste ano e
deve subir para 159,3% em 2012, segundo instituições multilaterais.
Mas todos os governos do mundo rico estão superendividados. A média
estimada para os países da Organização para Cooperação e
Desenvolvimento Econômico (OCDE) é de 102% em 2011 e de 105% em 2012.
Todos têm motivo para seguir com muito nervosismo a evolução do drama
grego.




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